Textos e Fotos

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O TIGRE QUE LARISSA MATOU

Por A. Capibaribe Neto

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Com a devida licença deste espaço, sempre tão dedicado às acontecências festivas, ousamos dividir com o inteligente público O tema do documentário “Matar Um Tigre”, exibido pela Netflix, baseado em fatos reais, acontecido do outro lado do mundo, mas que também acontece por aqui: a violência contra a mulher e, neste caso do documentário, contra uma crianças de 13 anos. 


Existe um lugar do outro lado do mundo, na Índia, antes chamado de Kukara e que, a partir de 1765, quando passou ao controle do Império Britânico, passou a ser conhecido por Jharkhand ¬– a terra das florestas e arbustos. É nesse lugar que uma jovem de 13 anos, Kiran (pseudônimo para proteger o verdadeiro nome da vítima, embora seja ela que apareça no documentário). Dirigido por Nisha Pahuja, Matar Um Tigre foi indicado ao Oscar 2024 de Melhor Documentário, narra a luta de um pai por justiça após sua filha estuprada por três homens de sua vila durante uma festa de casamento, Kiran é estuprada e torturada por três homens — todos conhecidos seus e de seus pais.

 

Contrariando o costume local, a família denuncia a situação à polícia e leva os condenados a julgamento; assim, enfrentam a resistência e oposição da comunidade a qual residem. Ressalte-se que na Índia, as vitimas desse crime são consideradas culpadas e geralmente abandonadas pela própria família, com a desculpa de que desonraram seu nome. Enfrentando um cenário desfavorável, sendo inclusive ameaçado de morte e de ter sua casa  incendiada e seus filhos mortos, o modesto agricultor Ranjit, recusa-se a desistir de sua busca por justiça. Firme em sua luta, ele rejeita as tentativas dos vilarejos de chegar a um acordo e casar sua filha com um dos agressores.

 

Vale salientar que, ainda nos dias atuais uma média de 20 mulheres são estrupadas na Índia e é muito comum a vítima ser abandonada pela família e considerada culpada pelo crime cometido contra ela. De forma geral, “To Kill a Tiger” é uma história dolorosa com imagens poeticamente interessantes. 


Um olhar mais aprofundado, no entanto, mostra que se trata do relato de busca de justiça e amor de um pai para com uma filha, vítima de estupro coletivo na Índia. Guardada as devidas proporções do que aconteceu com Kiran, um outro crime, tipificado como assédio sexual, foi noticia aqui, onde felizmente contou com a solidariedade dos habitantes da nossa aldeia, Fortaleza. A vítima, Larissa Duarte, nutricionista, foi agredida (molestada fisicamente – assediada sexualmente), ao entrar em um elevador, pelo empresário Israel Leal Bandeira Neto, já denunciado, agente autônmo da empresa M7 Investimentos, constando que já foi demitido da empresa. 


Enquanto na Índia os criminosos estão atrás das grades (pelo que se sabe até aqui), embora que se tenha proposto que Kiran aceitasse como esposo um dos estupradores, o que foi recusado peremptoriamente por seu pai, Israel apenas pediu desculpas e alegou que confundiu Larissa com outra pessoa com quem tinha intimidade. Intimidade é bem diferente de cavalheirismo, discrição e respeito, mesmo quando se tem essa alegada intimidade.

 

O comportamento do empresário está mais para canalhice e falta de investimento em princípios, mas não deixa de ser um tigre, um predador. Quanto à vitima, Larissa, ao se expor de cabeça erguida e mesmo correndo os risco de ataques machistas que minimizem seu desconforto, Larissa Duarte conseguiu matar seu tigre ou, no mínimo, deixa-lo gravemente ferido.
Namastê, Larissa!

Coragem para enfrentar a dura realidade da solidão

Por A. Capibaribe Neto

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A música pode ser um transporte que facilita as viagens do espirito ferido, da alma magoada, do corpo exaurido pela busca vã por respostas até que simples, mas… É esse “mas” que fere fundo e forte como o lanho de uma surpresa afiada; uma surpresa que não devia ter sido. E muitas vezes, justo quando buscamos por uma nesga paz na dança das nuvens ou na festa das estrelas em uma noite de insistente insônia, enquanto saltamos de uma para outra, advém a vertigem das ausências.

 

Não é que falte coragem para enfrentar a dura realidade da solidão, mas sim uma revolta que carecemos controlar para não comprometer a dignidade da sobrevivência dentro do saldo de tempo impossível de prever. As músicas, mesmo aquelas sem a poesia com rima e métrica, remetem a reflexões, como se fosse possível compor de improviso com as emoções do sentimentos comprometidos.

 

Só a tristeza que habita no lado negro desses tempos, nosso vizinho, nos faz ver e sentir o peso de precisar de alguém para segurar a nossa mão sem dizer nada, feito uma transfusão de solidariedade única e momentânea desse tipo de fragilidade do ser.

 

O pior é o orgulho que se impõe à fragilidade inda que passageira e impede a explosão de um desabafo sufocante. Eu tinha um anjo da guarda, que cuidava das minhas confissões, mas parece que cansou e desistiu de mim ao debochar dos meus reclamos impossíveis de disfarçar. Aí, desisti, mergulhei nos vazios cúmplices do meu espaço e enchi-o de músicas que se fizeram cúmplices nas rimas gêmeas dos meus sentimentos ou me embalavam, pacientemente, até vir o sono para mascarar a realidade da solidão.

Para melhor fazer sentido, esta crônica tem trilha sonora… (Tell Me Why - Moreza; Past Past - Sub Sub; The First Time I Ever Saw Your Face - Roberta Flack e Parle Moi - Isabelle Boulay) - écoutez moi.

PONTO DE EQUILÍBRIO 

Por A. Capibaribe Neto

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De saudades sem cura e lembranças, boas ou ruins — aquelas que nos remetem a reflexões que viram caraminholas — são impossíveis de fugir delas; o tempo que vai passando no seu ritmo até que ajuda e acalenta o espírito ferido e depois, deixa que mansamente venham e se transformem em cicatrizes. Apagar o que já passou é impossível, mas, possível de disfarçar ou forçar um adormecer, mergulhar sonhos comuns numa taça de vinho e fingir que esqueceu. Nossas forças possuem um limite determinado pelas sementes que plantamos e germinaram ao longo da nossa existência. Somos nossos melhores amigos, embora sejamos nossos piores inimigos em diversas aquarelas.

 

Nas festas entre amigos às vezes perdemos a linha dependendo dos bons goles sorvidos e nem nos damos conta da repetição das piadas, das historias compridas e da ausência de bom senso para deixar o palco para o resto da corriola. De alguns desses micos queremos esquecer e até nos prometemos “parar com isso”. Já nas festas privadas dos sentimentos, essas envolvem olhares injetados, insinuações cúmplices, aquela coisa toda que geralmente ou comumente pega fogo difícil de apagar.

 

Naquela festa entre amigos, depois da ressaca sobrevém apenas os comentários jocosos e as críticas igualmente repetitivas. Na outra festa, em volta da mesa de dois lugares para impressionar no cenário da conquista, se acaba ali, tudo bem, mas se a esticada vai para debaixo dos lençóis, existem as cobranças e as consequências que acompanham os arrependimentos.

 

Ah, esses arrependimentos! Lutar contra eles exige esforço para conquistar o perdão e quando se exaurem as forças para o convencimento da insensatez, chegamos ao limite do nosso possível, deparamo-nos com o impossível  e a partir daí não nos pertence a esperança do retrocesso aos trilhos.

 

Encontrar o equilíbrio comportamental nas confissões e demonstrações de sentimentos, carece de sensatez e discreta paciência para contar até dez; no mínimo, até três, porque depois das palavras ditas não existe um retorno confiável. O ser humano depende de um equilíbrio emocional e sentimental para não precisar fugir para a complexidade do Ioga avançado ou Kama Sutra se acalmar ou disfarçar as mágoas.

A inevitável hora da despedida

Por A. Capibaribe Neto

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Os chegares e partires acontecem a todo momento. Quem chega para a vida não carece de licença. O nascer de cada um é imposto por quem concebeu a vida; com a cumplicidade, o descuido ou a irresponsabilidade de um dos dois ou de um só, o que, para a justiça, não faz a menor diferença, mas isso é assunto para uma enciclopédia.

 

Só para não deixar passar em branco, alguns partires prematuros, vejam só o nível crescente e continuado do empoderamento das mulheres: Cristina Fibe, colunista de Universa, escancarou na edição de sexta e com um gancho pelo Dia das Mulheres: “não quero flores, QUERO ABORTO LEGAL, menos feminicídio e Robinho na cadeia…”; concordo com a recusa das flores, principalmente porque estão caras, a delicadeza, atenção, cavalheirismo estão fora de moda e infelizmente, com a agonia do romantismo, em pré-coma irreversível, os homens ficaram arredios e temerosos porque essa atitude singela pode tipificar assédio – tempos estranhos! Mal se chega, já se parte; ou porque não convenceu para ficar e ser acolhido nas intimidades fáceis ou porque foi apenas fogo de palha de um momento frugal.

 

Nesses casos, o partir é passageiro e deixa pouca lembrança ou nenhuma. Cada um pagou a metade da despesa e vão-se embora de Uber. Bem assim. Tempos modernos ou aviso do fim do mundo. As explosões solares estão acontecendo, meteoro fez a festa nos céus da Lagoa dos Patos, por quatro segundos brilhando mais que a Lua cheia. Tempos esquisitos! O pior é que ninguém consegue fugir do passar do tempo e não muda o tempo que já passou nem é dono do tempo que vai chegar.

 

O tempo é linear, segue em frente e é nessa caminhada onde acontecem os chegares constantes e os partires que acontecem. Uma hora o chegar que já foi festa e muitos sorrisos, dá um stop com razão ou sem razão e para aquele que ficou, se for frágil ou fraco que se aguente, vá arrastar sua asa ou roer a corda, como se diz na literatura de cordel. Cada um de nós é a soma de todos os seus chegares e partires e consequências do estares e ficares passageiros. Nem dá tempo para fazer as contas dom e do ruim, é só passar a régua e “tiau”, como diz Gerôncia, que vocês não conhecem.

 

Pela idade acumulada, tenho, confesso, um monte desses tempos, tudo ali, na contabilidade explícita desse viver de poucos e raros créditos e débitos com custos difíceis de saldar a juros que são altíssimos. Não adianta chorar pelo leite derramado nas cumplicidades que aparentavam promissoras ou transformar essas histórias em rima pobre de cantigas de sofrência. 
 

Enfim, repito e sem fazer drama, acho que está na hora de fazer as malas, preparar uma saída à francesa e encontrar o melhor momento para dar um abraço nos que sobraram e encarar com naturalidade o inevitável momento da despedida.

Previsão do tempo

Por A. Capibaribe Neto

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Conforme a previsão do tempo anunciada, a chuva chegou na boquinha da noite; primeiro, tímida, mas mais afoita com o passar das horas. Não teve a escandaleira dos trovões que se seguem aos lampejos, de barulho mesmo, só o chiar da água caindo agora farta sobre as telhas de zinco e dos pneus sobre o espelho d’água a desfilar sobre o asfalto.

 

O “meninos da vó” haviam suspendido seus espetáculos irresponsavelmente chatos de empinar suas “monocicletas” e dado uma pausa nos seus desrespeitos às escâncaras – afinal, mesmo imbecilizados, suas ousadias conhecem restos de medo de quedas. Até pareceu que com a chuva mais agressiva e farta, a gangue dos barulhentos e ridiculos escapamentos também se recolheu.

 

O espetáculo era mesmo só da chuva noite adentro. Dentro de casa, o silêncio incômodo de todas as ausências evidenciou uma dor de cabeça teimosa. Faz tempo que ela me acompanha e até tentei acostumar-me a ela, mas nessa noite específica, ela me atentou para além do suportável. Catei uma Aspirina. Nada! Tampouco um Advil. Pedir um dos dois ou o dois pelo “delivery” seria maldade.

 

Pensar em descer, ligar o carro e sair para comprar, mesmo tendo uma farmácia do outro lado da avenida, a menos de cinquenta metros de casa era meio muito. Como medida extremada para não sentir-me tão ridículo, saindo de casa para comprar uma aspirina, vali-me da desculpa de sair para fotografar na chuva.

 

E fui. E até esqueci dos comprimidos por conta das luzes das imagens molhadas. Passei duas horas provocando um resfriado com a roupa molhada e sandálias encharcadas, mas feliz da vida. A dor de cabeça teimosa não foi páreo para esse quase “singing in the rain”. E por conta dessa “medida extrema” não precisei comprar os comprimidos…

Vã filosofia para refletir sobre búfalos, elefantes e andrômeda

por A. Capibaribe Neto  

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Existe uma grande diferença entre o que eu disse e foi mal interpretado e o que foi entendido, mas não foi o que realmente eu quis dizer, resultou como consequência que muito amor foi perdido e muitas amizades e convivências foram comprometidas…

 

NADA do que eu diga hoje vai desfazer aquelas interpretações e eu bem avisei que era muito bom com as palavras, mesmo aquelas propositadamente rebuscadas, mas sempre escorreitas, em nome do apuro gramatical e elegância no verbalizar. Palavras sempre serão mágicas e o espetáculo da boa interpretação de seu contexto merece respeito e paciência no buscar de seu sentido pleno, intrínseco. Desmotivo-me no perseguir a amizade que me quase impõe deitar fora precioso tempo explicando o óbvio no significado de um despretensioso “bom-dia, como vai?”.


E aí, enquanto uma manada de apressados búfalos albinos atravessa o elegante salão cheio de perfumado glamour, elefantes sonolentos se esfregam nos pés de Amarula, em plena Africa… Não entendeu? Depois eu explico, no momento perscruto perplexo o silêncio incomensurável  que nos separa de Andrômeda, lá pras bandas dos confins do Universo, pertinho do começo da eternidade.

Resposta numa folha de papel trazida pelo vento

por A. Capibaribe Neto  

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Desculpem leitores românticos, pessoas queridas e suaves que outrora (e nem tanto tempo faz), se enlevavam com as noites de lua cheia e podiam curtir, com alguma paz e tranquilidade, o luar e as estrelas. Hoje não podem mais. Não por falta da Lua ou das estrelas, elas estão lá, piscando, mas dessa vez incrédulas, cercando lua grande atônita, e mais, impávida, não por indiferença. Queria voltar a ter no rosto o riso solitário, sorrindo por dentro, pensando na felicidade daquele encontro, o primeiro, que perseguia a ansiedade do primeiro beijo e depois esqueci porque foram tantos e perderam a graça.

 

De repente o mundo agora é outro, as expectativas são outras, as pessoas são outras, e as diferenças  também são outras e muito mais, e muito piores nas disputas desnecessárias. “Não é necessário mostrar beleza aos cegos, nem dizer verdade aos surdos. Mas não minta para quem te escuta e nem decepcione os olhos de quem te admira…” E completo, a coisa ficou feia, quase horrível, não dá mais gosto de se ver, participar, discutir, é tudo disputa feia, cheira a sangue, vontade de matar, destruir… todo dia é o que se vê. Nem parece escrita bonita, como nas declarações de amor, de juras, beijos antigos, amassos, gemidos, gritos de prazer, de que é bom e depois “foi gostoso, de vamos de novo, nem que seja nadar, passear passeio simples, moleque, divertido. Misturaram as cores, as vontades, o modo de falar.

 

Agora, não é mais pedir, é exigir, impor, mandar, dar ordem, obedecer ou reagir, desobedecer, enfrentar pra ver no que dá. A proliferação do radicalismo que empurra os limites da violência, aos trancos e barrancos a intransigência, acirrando homofobia inexplicável, estarreceu, ainda que temporariamente, a notícia de um crime envolvendo uma adolescente de 14 anos, contra uma criança de apenas 5. Motivo? A criança ter chamado a menina de “sapatão”. Fosse essa situação ocorrida entre adultos mal educados e que desrespeitam as preferências alheias, desenhando dentro de suas cabeças limitadas e pobres, guetos onde pretendem segregar seres humanos com quem não se identificam, com insultos, agressões verbais, intolerância torpe, existem leis e punições, mas em um quadro como esse, o que fazer?

 

A criança que perdeu a vida talvez não tenha sido educada sobre os direitos de escolha e preferência dos seus semelhantes. Para ele, o adjetivo pejorativo tenha sido apenas um insulto ou provocação, mas para a menina, independente da sua preferência ou escolha, tenha sido a centelha em um momento onde a manifestação de intolerância, mesmo vinda de uma criança, que fez explodir seu limite de intolerância.

 

A adolescente estará marcada pelo resto da vida, não resta dúvida e o acirramento dessa disputa pela inclusão, pelo direito das escolhas e preferências de cada um sobe mais um degrau. A criança, esse menino de cinco anos, perdeu a vida sem saber, talvez, a razão dessa reação definitiva, pois duas vidas foram interrompidas. E eu me pergunto: o que é a vida? A resposta talvez esteja no pedaço de papel que estava misturado a confetes e serpentinas trazidos pelos ventos do carnaval: “A vida é o que viemos fazer aqui…” — será?

O pássaro madrugador chegou…

por A. Capibaribe Neto  

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A IMPORTÂNCIA DO ZERO ABSOLUTO

 

O zero absoluto é um numero estranho que merece uma reflexão. O zero absoluto é o limite inferior de temperatura. Nessa temperatura, os átomos e demais partículas encontram-se perfeitamente estáticos, sem qualquer energia. Para que se entenda melhor neste introito, definamos o calor; o calor é a energia transmitida espontaneamente entre corpos que se encontram em diferentes temperaturas. Por tratar-se de uma forma de energia. Em outras palavras, o calor é a vibração de moléculas. Assim, no zero absoluto, todas as moléculas estão paradas. Aprofundando, o zero absoluto é a menor temperatura teórica à qual um corpo pode chegar. Trata-se do limite inferior da agitação térmica e correspondente a um estado físico em que toda a energia cinética e potencial de um sistema é igual a zero.

 

De acordo com a terceira lei da Termodinâmica, se algum sistema atinge a temperatura do zero absoluto, sua entropia torna-se nula. Apesar de existir teoricamente, o zero absoluto não pode ser atingido na prática, ou seja, não existe qualquer porção de matéria em todo o Universo nessa temperatura, e isso só pode ser afirmado graças à 3ª Lei da Termodinâmica. Tal lei indica que o zero absoluto é inatingível.

 

O zero absoluto é o limite inferior de temperatura na natureza, que corresponde à menor temperatura possível a ser atingida e equivale a - 273,15 °C ou O K. Deve-se lembrar que não há um limite superior de temperatura, e a existência de temperaturas de valores extremamente elevados é totalmente possível. Vai daí, mesmo que uma mulher se considere indiferente, fria e seus sentimentos por qualquer homem sejam ZERO, se ela se encontra ou vê esse tal homem e há um mínimo de vibração, por mais imperceptível que sejs nas células de seu coração, ele pode ter esperança, porque ela é a última que morre.

 

Quem ama de verdade, não com esse amor de sofrença, mal cantado e repetitivo, apega-se a essa minima vibração da emoção e vem o apego a essa possibilidade ainda que ínfima. Tanto rodeio para chegar ao que seria um imaginável e definitivo zero absoluto não deixa de ser uma esperança mesmo extremamente remota de acreditar no milagre de uma reconciliação beirando o impossível, que é diferente do impossível absoluto.

 

Quem ama mesmo, deve apegar-se a essa possibilidade do zero absoluto, que é quando a mulher, no caso essa tal, supostamente congelada, não está nem aí para qualquer pobre coitado, portanto dê-sé importância a qualquer número acima do zero absoluto nas recisões sentimentais. Vai que pega embalo nesse tranco…!

LEMBRETES NA INTERNET

por A. Capibaribe Neto  

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“Da próxima vez que você me ver, não estarei apaixonado por você. Não vou mais lutar por você, estou levantando minha bandeira branca, essa batalha entre nós acabou. Não vale mais a pena. Eu me cansei, estou exausto, então esta é a minha rendição. Você venceu, vou deixar você ir embora, mas nunca diga que não lutei por você. "
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“Você continua sendo minha saudades de todos os dias.....Ahhh que vontade de ir até onde você está e te dar um abraço...”
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“Se um dia você se lembrar de mim, e sentir minha falta, se lembre que não fui eu quem desistiu de você. Foi você, quem me deixou ir... o que faltou foi, senta aqui vamos conversar…”
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“Aumente as suas palavras, não a sua voz. É a chuva que faz crescer as flores, não o trovão…”
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“Quando te sentires frágil, olhe para trás apenas para ver o quanto superou…”
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“Eu não estou morto, mas também não estou vivo; agora eu sou apenas um fantasma com um coração batendo…”
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Se um dia eu parar de falar com você não pense que parei de gostar de ti, acontece que na minha cabeça eu estou te ecomodando...”

“Eu não quero te desconhecer. Não quero apagar da minha mente as memórias que me fizeram gostar tanto de voce. Eu só não quero que a gente volte a ser dois desconhecidos…”
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“É provavel que eu tenha deixado de ser uma pessoa importante na sua vida, mas espero que um dia, quando você escutar meu nome, você sorria e diga: — ele é meu amigo…!”

“Triste é quando você percebe que não é tão importante para alguém como você pensou que era…”

“Eu não desisti de você, só te deixei em paz porque essa era sua vontade…”

“Espero, honestamente, que a minha ausência te dê a paz que a minha companhia deixou de dar depois de todos esses anos…”

 

“Tudo muda com o passar do tempo, embora nada consiga preencher certas ausências na vida de uma pessoa…”

Assim, a leitura desses retalhos soltos e que passeia pela internet chegam ao mesmo imaginário de muitas pessoas que foram fisgadas pelas ansiedades e tristezas comuns que advêm de surpresas pesadas para carregar, remetem a reflexões que fazem pensar que são como recados para o processo de superação. Por isso, quando lhe aconselharam a parar de olhar para trás; “você ja sabe onde esteve, agora precisa saber para onde vai…”, dê como resposta — eu sei, mas é que ainda não consegui me livrar das cobranças das certezas de que onde estive era bom, apesar do medo de confessar que era feliz. Quanto a pensar para onde deva ir, não esqueça das dificuldades para preencher de cores as paisagens que viraram preto e branco, mesmo com a força imaginação. É verdade que tudo muda com o passar do tempo, mas quanto tempo é esse?Existe um tempo que se estica e tem o gosto ruim das lembranças e que depois desce queimando cada célula do corpo, chegando até a alma. Parece um tempo longo demais que impacienta e maltrata como um castigo quase mortal…

Mário Pagneretti uma sadia saudade

oito anos depois

por A. Capibaribe Neto  

Esta crônica não esta sendo escrita por acaso. Também não é do tipo que gostaria de escrever para reverenciar a lembrança de um amigo-irmão querido, mas agora, nesse dia 27, oito anos depois, quando ele pegou seu vasto círculo de amizade com a ingrata surpresa  de um segundo breve que o transformou e transformou tudo em péssima notícia, infelizmente, impossivel de adiar, segundo a vontade suprema do Criador que não dá satisfações ou explica suas decisões.


Nesse dia, o homem que escreveu a sua história cheia de boas passagens inteligentes, de carisma contagiante, fácil de conquistar, seleto na escolha de conquistar amigos. Nesse 27, deitado ao lado da companheira de várias décadas,  bastou um segundo para Mario Pagneretti despedir-se dessa experiência única que é viver. Desfiar aqui seu rosário de invejável currículo seria irrelevante porque seus feitos eram de continuada alegria contagiante em volta de mesas seletas e amizades que se deliciavam com os vinhos que escolhia e pratos que oferecia a esses amigos que disputavam a sua presença.

 

Homenageio Mário Pagneretti nessa data de sadia saudade que nunca perdeu a profundidade das lembranças. Mario é um síntese que exprime uma lágrima quase diária que se impõe no olhos de sua “Selminha” – como costumava chamar sua maior conquista que carregou pelo mundo e foram morar quase às margens do Arno que corta Florença, ali pertinho da Ponti Vecchio, na fantástica Florença e a dois passos da Ponte da Santa Trinidade.

 

Tive o privilégio de ter convivido com Mario, que me chamava Fratello. Um dia eu disse a ele, parodiando uma frase que guardo com carinho e respeito: “amicizia vuol dire chiamarsi fratello” - amizade significa chamar um ao outro de irmão”. Nesse dia 27, há oito anos, Selma perdeu seu marido, seus amigos muitos, daqui de Fortaleza e espalhados pelo mundo, perderam uma companhia agradável e eu perdi um irmão. Reverencio as boas lembranças da convivência com ele e a consolidação de uma saudade sadia, impossível de deixar de sentir.

DÚVIDAS E CERTEZAS

por A. Capibaribe Neto  

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Semana passada, foi tempo investido ao acaso em uma nesga de deboche, de gozação, para passar ao largo dos perigos das areias movediças dos radicalismos. Definitivamente, somos um país dividido. Duas torcidas mal humoradas que hoje se digladiam dentro de uma arena aparentemente calma, como aquela do olho de um furacão. Na realidade, gozação é o que fazem os pelotões sem comando sério do soldado de chumbo que só pode tomar posse na posse do amarelo go maluco da Corrientes, 348 de Gardel. Gozação, mesmo, é o que fazem os que só ganharam, mas não estão levando todas aquelas vantagens alardeadas em velhas promessas.

 

Gozação é o que faz uma ministra de estado especialmente feia e antipática, cobrando de um inquisidor que se contenha e não chame de “caixa preta” – a exemplo daquela de um avião, que se busca para averiguar as causas de um desastre. Gozação é o que fez a sua colega, na mesma linha de idiotice continuada, reclamando da utilização do termo científico “black hole” – buraco negro, alegando que é ofensivo e preconceituoso.

 

Ora, com milhões de demônios! Um buraco negro é uma especie de abismo cósmico que suga para si tudo o que se aproxima - a uma determinada distância - dele. Nem mesmo a luz escapa de ser atraída por esses objetos. Por isso que os buracos negros são, de fato, negros. E isso acontece porque a atração gravitacional desses corpos é extremamente forte.

 

Ainda hoje, essa ministra, por sinal bonitinha, repaginada com pitadas de elegância imposta pela desculpa do cargo, desconhece os limites das raias do ridículo apadrinhado e faz coro com a sua colega desbonita e golfa tamanho diatribe sem cerimônia. De toda a gozação a que me permiti, com a pressuposição de avocar alguma liberdade de expressão com a cumplicidade da Inteligência Artificial, ainda assim, fui agraciado com a sutileza de uma crítica discreta: “a picanha prometida não chegou, mas ficou barata”.

 

Enfim, de uma coisa podemos ter certeza: as dúvidas existem às escâncaras, mas as cortinas pesadas que se impõem na proteção da performance duvidosa dos atores de plantão do atual espetáculo bufo, permitem a continuidade pirotecnia momentânea. As dúvidas, ao contrário, são as melhores certeza para o apaziguamento dos que perderam e se contentam com vídeos sugerindo suspeição/culpa nas tintas do levante que foi abortado. Que entrem as carpideiras!

Que elas chorem pelos que perderam e não aceitam e pelos que ganharam e não estão vendo muita vantagem…

Encontro Fantástico de Grandes Compositores

por A. Capibaribe Neto  

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Graças à Inteligência Artificial, foi possível reunir grandes compositores de todos os tempos, em volta de enorme mesa preparada em uma barraca da Praia do Futuro. Por incrível e mais absurdo que possa parecer, ali estavam: Tchaikovsky, Beethoven, Chopin, Haydn, Vicente Celestino, Wando, Brahms, Bach, Mozart, Debussy, Stravinsky, Verdi, Wagner, Bartok, Manoel Gomes (Caneta Azul), Simone, Amado Batista, Aretha Franklin, Whitney Houston, Billie Holiday, Mariah Carey, Ray Charles, Stevie Wonder, Beyoncé.

 

Chico Buarque e Caetano Veloso não compareceram porque estavam comprometidos com com o Mega Show da Democracia, que reuniu Cuba, Venezuela e Bolivia. A resenha era para resolver o impasse e divergências resultantes da linguagem neutra, radicalismos, intolerância contra identidade de gênero e novas denominações que pleiteavam incluir no já consolidado LGBTQIA+, tinha um grupo mais radical que exigia colocar um x no lugar do +. E tome cerveja, tome caranguejo, os quatro tenores abriram os trabalhos oficiais. 

 

Depois dos desfiles de biquini, Luciano Pavarotti pegou o microfone, pigarreou e com voz tonitruante falou: “bem-vindos todos, todas, todes, toddys, nescau e ovomaltine, o objetivo dessa reunião galática é acabar com o elitismo das barreiras impostas pelos segmentos beneficiados pela Lei Rouanet. Vamos encontrar um nível de aceitação que não discrimine ninguém… E antes de passar a palavra para João Gilberto, vamos escutar uma música surpresa que está mexendo com o imaginário de gregos, troianos, russos, judeus, ucranianos, coreanos do norte, enfim…

 

Fez-se um inimaginável silencio sepulcral e alguém tascou no mega sistema de som através de vinte Paredões espalhados por toda a Praia do Futuro:
“I'm the Scatman
I'm the Scatman
Pi-po-po-po-ro-po
Pi-po-po-po-ro-po
Pa-ra-ra-ra-ra-ra
Pi-po-po-po-ro-po
Po-po-po-ro-po
Pi-po-po-po-ro-po
Pi-po-po-po-ro-po…” Foi um sucesso!

A FORÇA DO HÁBITO NO COMEÇO DO ANO

por A. Capibaribe Neto  

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Descuidei no cochilo com o cansaço de reprogramar os espaços onde vivo. Dei atenção à Rosa do Deserto que ainda não deu nenhuma flor; falei com ela parecendo um maluco, mas dizem que as plantas gostam disso. Não me pareceu, porque já faz tempo que a trouxe para dentro do pequeno jardim e nada. Cuidei dos livros, das anotações que rabisco, aqui e ali como guias guiar os lampejos de inspiração que ainda motivam o DNA do romantismo capenga e depois de quase refazer todo o checklist das pendências, abri uma lata de cerveja bem gelada e refestelei-me na poltrona herdada que consertei como item do combo de coisas para arrumar.

Sempre tem dentro de uma casa; essas coisas que deixamos para depois e elas se acumulam como por magia do cotidiano. Esqueci de almoçar. O café eu preparei farto, mas havia uma fome à espreita e cumulativa com o continuar de cada coisa que fazia. Diagnostiquei-me com TOC saudável confirmado na única sessão com a simpática psicóloga.

 

Confesso que me divertia arrumar uma coisa e emendar em outra só porque estava no campo de visão do entorno e não vi o tempo passar. Era o dia 31, logo seria o Ano Novo, como sempre acontece nos mexesse dezembro. Pois bem… Faltava coisa pouca para dizer “até que finalmente…” e desfrutar da paz aparente que existe no olho do furacão no mundo do lado de fora. Havia um arremedo de calma emocional naquele cansaço gostoso de fazer coisas, consertar coisas, organizar coisas e reinventar coisas para adotar rotinas.

 

Era fim de ano, muita gente faz isso e faz festa nesse reboliço para a festa da passagem de ano, como se o espírito adotasse uma leveza com o advento da troca de data e todo mundo acreditasse que Ano Novo é sinônimo de vida nova, novos caminhos, perspectivas, ganhar na mega sena da virada e inclusive não dizer pra ninguém por um tempo. Escondido, contrito, controlado, pagar boletos, todos, comprar um monte de supérfluos, imitar o dono da empresas para a qual trabalhei, colecionar carros, relógios, sapatos, perfumes, calças, camisas, esnobar até cansar, tudo o que fosse fútil, inclusive tudo. Imaginar besteiras é um direito como o tem que escolheu ser radical.

 

Mega-sena! Duzentos milhões sonhando a mesma coisa: ficar exageradamente milionário. Um banho rápido, a cerveja gelada, a poltrona convidativa diante da moldura italiana na janela o de inventei um quadro vivo. Cochilaria um pouco, logo iria à casa lotérica e arriscaria algumas dezenas. O pressentimento de que seria rico pela manhã foi uma canção de ninar. Que cerveja forte! Que susto! Nem escutei os fogos, nem vi as luzes, os gritos do felizes abraçados, nem vi o “corrochiodo” enganoso dos ficantes de ocasião. Nada.

 

Eram 3 e quarenta e cinco da madrugada. Já era o bendito Ano Novo. Levantei da poltrona e fiz o longo caminho da sala até à cama, mas o sono ficou lá na sala. Acho que foi o levantar para ir ver se as janelas estavam fechadas, a geladeira fechada, as torneiras fechadas, a porta fechada e dar-me conta que não fizera a minha fezinha.

 

De pouco adiantou abraçar-me ao travesseiro, catar sono. Vi o sol nascer pensando em cada coisa que aconteceu no ano que agora era passado. Força de hábito, como na letra da música de Charlie Cunningham, Force of Habit: “If they pull you under, you're buried alive… Don't wait for an answer ‘cause no one survived, if you now that it's force of habit. Take something from it, you called, it came, It's here to stay, these wounds don't heal…”

FELIZ ANO NOVO DEVE SER MAIS QUE UMA FRASE

por A. Capibaribe Neto  

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Felicidade é o estado de quem é feliz, uma sensação de bem estar e contentamento, que pode ocorrer por diversos motivos. A felicidade é um momento de satisfação que deveria ser durável, onde o indivíduo se sentisse plenamente feliz e realizado, um momento onde não há nenhum tipo de sofrimento.


“FELIZ ANO NOVO” deveria ser bem mais que uma frase nessa formalidade expressada antes do dia 31 de dezembro de cada ano mundo afora. A frase é rápida se falada e muito curta para se ler em uma mensagem eletrônica. Este não é o momento para discursar, explicar, complicar ou tergiversar sobre FELIZ ANO NOVO. A frase, em si, assim, curta e grossa — digamos, dispensa o floreio, tipo “minha querida (o) Fulano, Fulana ou Fulane, desejo-lhe toda felicidade do mundo nesse próximo ano…!” Pode soar falso, mas não deveria ser assim. E não sibra felicidade para os outros? A pergunta é boba, falta de criatividade, como em “… nesta data querida…”  e nos outros dias? A felicidade é relativa, convenhamos.

 

No dia 31 de dezembro do ano passado, a metade do Brasil vibrava com a perspectiva de beber um cervejinha gelada, mesmo em um bar na periferia gira em terno de $4,00 e comer uma picanha era sinônimo de felicidade. A outra metade resmungava: “quero ver” ou “duvido!” Não queremos azedar o leite de ninguém, longe disso! A verdade é que mais de cinquenta por cento das pessoas viciadas em promessas e mais que isso; viciadas em acreditar nessas promessas, além dessa fantasiosa perspectiva de sentir o gostinho da carne e o sabor de uma geladinha, é o que se pode chamar de felicidade.

 

Daqui a pouco, mais uma vez, um ano de REALIDADES chega ao fim capengando e estaremos diante dos ponteiros aproximando-se da contagem regressiva dos últimos segundos dos últimos minutos, da última hora do ano. “2023 já vai tarde!”dirão os que não foram alcançados pela felicidade ao fim e ao cabo do ano passado. Feliz Ano Novo! Feliz 2024! Que seja um ano de coisas boas para o Lula, a Janja, para o Bolsonaro e a Michele e as suas devidas corriolas.

 

Desejar FELIZ ANO NOVO não custa nada, é só uma frase, é rápido, não dói, depois a pessoa pode fechar a cara e desmanchar o sorriso de selfie. Vamos lá…
10, 9, 8… 3, 2, 1… FELIZ ANO NOVO, inclusive para o Milei e os nossos hermanos argentinos, que pelo menos foram campeões do mundo. Vamos lá, gente, FELIZ ANO NOVO, desejar não custa nada!

A coragem de reinventar-se 

lutando contra Nefilins

por A. Capibaribe Neto  

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No livro de Enoque, ele diz que os Nefilins eram como os anjos chamados Sentinelas, que tomaram mulheres por esposas e geraram esses gigantes, híbridos de humano e anjo. Esses gigantes são descritos como guerreiros corajosos, mas cruéis, que se voltaram contra os próprios seres humanos. A Bíblia  diz que os Nefilins eram gigantes, com mais 5 metros de altura.

 

Inspirado nessas criaturas horrendas e dada a necessidade imperiosa e urgente de reinventar-me, lutando contra os nossos demônios, mas também por uma questão de sobrevivência física e emocional, passei a considerar esses supostos sentinelas que transcendem a imaginação, como meus inimigos formidáveis a serem vencidos pacientemente, um por um. Separei-os pela necessidade do emprego das primeiras forças a serem usadas na primeira batalha. Esqueci-me, por um momento, dos ensinamentos da Arte da Guerra, de Sun Tzu e descuidei do flanco esquerdo, deixando à mostra minha parte mais fraca, o coração, estojado nas almofadas das emoções pueris, tardiamente assumidas. 

 

Para dar partida nessa decisão de reinventar-me, careci perdoar-me, estancar incontinente o esbanjar de pedir desculpas, repeti-las à esfalfa até torna-las incômodas e sem efeito. Havia uma lição que apregoava: “peça desculpas só uma vez”, mas esqueci-me e pedi desculpas mil vezes, falhei repetidamente. Basta! Quem não tiver cometido um erro que atire a primeira pedra.

Chegou a hora de reagir; pegar a mesma pedra e arremessa-la de volta aos que se pressupõem donos da ilibação. Que me valha isso agora, de que serve o passado? Não já passou? É de pouca valia ou nenhuma, remoer histórias que há muito perderam a importância; pra falar a verdade, não tiveram importância alguma eu é que fui tolo sendo gentil, cavalheiro. Hoje, reconheço, dei-me conta de que sempre fui muito maior que qualquer desses Nefilins e expus as minhas entranhas de benquerenças a eles. Nefilins não passam de fantasmas feiosos que só aterrorizariam crianças, incautos, bobos e ignorantes. Acho que fui tudo isso. 

 

Quero hoje, agora, antes do Natal, como um presente meu para mim mesmo, todas as caixas das minhas boas intenções, sinceridade, amor, atenção e rimas apaixonadas desfiadas em mensagens piegas. Devolvam! Gritar assim, mas sem muito alarde, está a me mostrar — e a sensação é muito boa — que essa faxina espiritual é por demais oportuna. Quero de volta as confissões de culpa, cada um dos pedidos de perdão e boa parte da polidez através dos quais dei pouco valor à minha parte boa. Existem outros Nefilins que ainda incomodam, mas eles que me aguardem!

Feliz Natal, ou deixa pra lá, eu ainda tenho forças e uma reserva de orgulho para me bastar. 

Nota do autor: baseado em uma festa de Nefilins…

Um banho só na imaginação

por A. Capibaribe Neto  

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O ser humano é o único animal que tem consciência de que vai morrer e faz planos para um futuro que não lhe pertence. Digo futuro distante, mas distante pode ser longe e segundo um livro de Richard Bach, “Longe É Um Lugar Que Não Existe” — “quando eu era apenas um efebo, fuçando nas coisas da minha tia achei um pequeno livro de capa laranja, cheirando a mofo e já com  as ,páginas amareladas. Na época, já havia ouvido falar e lido o livro Fernão Capelo gaivota, do escritor Richard Bach e, apesar da pouca idade e de não entender muito bem as profundas mensagens que o livro quis passar, achei muito bonito. Então, ao ver que o livro que havia encontrado era do mesmo autor, comecei a ler.

 

O título do livro de é “LONGE É UM LUGAR QUE NÃO EXISTE” e trata-se de uma curta fábula a respeito de uma menina de cinco anos chamada Rae, que convida Richard Bach para o seu aniversário e o espera confiante, mesmo sabendo que ele terá que enfrentar inúmeras dificuldades, como atravessar rios e montanhas para chegar até ela e, nesse caminho, através de sua interação com diversos animais, ele acaba descobrindo mais sobre si mesmo e a vida do que poderia prever. Tive meu momento de Bach, diferente, é verdade e a menina que conheci já possuía uma coleção de tristezas e mágoas.

 

Essa “menina” já adulta, por medo de aumentar a sua coleção de tristezas, refugiou-se no aconchego de um urso de pelúcia. Na eternidade que durou apenas a passagem de uma noite, ela me contou alguns capítulo da sua história, tão comum nos dias de hoje. Fez pausas, respirou fundo, enquanto eu falava de um mundo onde sempre vivi: nas estrelas! E como consegui tirá-la por um momento das suas confidências, chamei-a para dançar sobre uma dúvida. E dançamos. De repente, estávamos de rostos colados e olhando dentro dos olhos, onde confissões são feitas em silêncio.

 

Promessas de “para sempre tua” eu conheço, contei para ela, enquanto nos dizíamos querer que aquele momento deveria durar para sempre. Disse-lhe que o ser humano é o único animal que tem consciência da sua finitude, mas faz planos para um futuro geralmente distante. Estávamos vivendo um sonho através da magia da imaginação. E dançamos até quase madrugada já quase se entregando ao amanhecer.

 

Lamentamos não poder voltar no tempo e marcar um encontro no passado. Do futuro não tínhamos controle e ainda haviam muros de pedra das nossas diferenças, mas com histórias quase gêmeas. O medo é uma experiência que pode desencorajar até nos sonhos. Lembrei-me de CARPE DIEM   e acresci CARPE NOCTEM para facilitar.

 

Sonhos acabam e fantasias chegam ao fim. Quando ela me disse que estava cansada e precisava dormir, despediu-se mandando-me um beijo e dizendo que iria tomar banho. Logo que amanheceu, sem saber o que me deu na cabeça, mandei para ela um sabonete especial, mas ela foi lacônica quando recebeu o presente sem tanta importância, registrando apenas “adorei o sabonete”.

 

Neste momento, imaginei-a no banho — a imaginação, além de silenciosa cúmplice, permite fantasiar intimidades e de repente, lá estava eu a massagear-lhe as costas macias, porém aí é outra história e pelo tempo transcorrido e a dinâmica da avidez da vida, perdeu a graça, mas seguramente ela já recebeu outros sabonetes… Vida que segue.

PERDIDO NOS ADVÉRBIOS DE TEMPO  

por A. Capibaribe Neto  

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Veja-se este título apenas como forma de dizer ou pura licença poética, jogo de palavras; não vem ao caso, pois o futuro é sempre uma coisa que se espera, coisa que ainda está para chegar ou póstero, vindouro, mas … Pois bem, lá atrás, no meio da minha enorme coleção de passado, eu tive um sonho — aliás, um monte deles.

 

Poucos consegui realizar e com o passar do tempo, perderam a graça, por eram bobices, coisas poucas, mas teve coisa grande, sonho brabo, pra valer e que ficaram pelo caminho comidos pela realidade de alguns difíceis que se transformaram em impossíveis. Projetei lá nesses passados bem distantes, enquanto vivia cada  presente, retalhos de felicidade cheia de coisas boas que deveriam acontecer nas faldas dos melhores sonhos.

 

Não sei vocês, mas eu cheguei a sonhar tão profundamente que até esquecia de respirar e aí, vinha um suspiro de certezas e acordava-me para cada realidade. Cheguei a sonhar até mesmo de olhos abertos, que estava voando e esse tal suspiro me arrancava de sonhos bons entre nuvens ou estrelas e colocava meus pés no chão, fazendo-me cair na realidade.

 

Falando sério, afirmo que sonhei com tanta vontade, de que alguns desses melhores sonhos se tornassem realidade, que alimentava quimeras com força muita. Como demoravam muito — muitas chegaram a perder o gosto ao ponto de deixar pra lá e esquecer deles sem me dar conta. 


Cheguei a ver meu futuro ali, na esquina ou pouco mais distante, coisinha pouca ou apenas faltando só um tiquinho para sentir seu gosto. Na soma da importância que dei  a esses sonhos grandes, cheguei a ter conflitos com a realidade por conta do uso dos advérbios de tempo que determinam as realidades do presente, passado e futuro, como esse, que acabou ontem.

“Venha, meu filho é hora de voltar pra casa" 

por A. Capibaribe Neto  

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Existem coincidências estranhas quando se misturam com antigas premonições que se vão consumando traiçoeiramente de forma continuada… Para tudo na vida existe um tempo; inclusive tudo, até para pensamentos sombrios como os que nos empurram para a janela cúmplice, onde nos debruçamos para divagar, refletir, meditar.  Sobre a mesinha do chá, deixamos espalhados o butim das promessas, das confidências em que acreditamos e fantasias passageiras que nunca foram promovidas a desejos  profundos a serem perseguidos.

 

Aqui e ali, quase desbotados, recadinhos beirando o ridículo, sugerindo safadezas comuns aos amantes, assinados com o batom de uma boca que lembram beijos distantes e desistidos. Nem lembro o porquê. Certas desistências, convenhamos, acontecem por conta da mesmice que se acomoda devagar, sorrateira, nos rituais de dias quase cópias.  E aí, boom, o desanimo bate à porta e nem é surpresa quando um olha para o outro sem ter o que dizer.

 

Muita gente vive um momento assim e foge com a cumplicidade de um bocejo e um “tô cansado, vou dormir; vai ficar aí? Apaga a luz…!” É ou não é. Aliás, uma crônica assim não deve ser lida a dois e muito menos sugerida tipo assim: “parece nós dois…” É perigoso e pode sugerir um arriscado hum hum  aquiescente  solto no ar, quase sussurrado.  O que é muito ruim.


Ao longo dessa semana antipática, sonhei um sonho nítido, daí, preocupante… A culpa foi da visita da psicóloga sugerida para vasculhar minhas mudanças de humor, apelidadas de depressão, angústias , sei lá. “É bom, rapaz, ajuda muito e aí, quem sabe uma terapia…”. Aceitei o desafio, digamos assim. Comecei do começo ou pouco depois. O tempo era cronometrado e não era barato nem cabia pedir desconto. Fui lá nas minhas origens, me vi criança, menino travesso, tudo muito rápido, até lembrar de meu pai, meu primeiro amigo e farol guia para o meu caráter. Meu pai…!

 

Acho que foi isso. Fui dormir com o peso do resumo apressado dos anos que carrego e contei para a psicóloga simpática, de fala mansa, mas perscrutadora de cérebros. Acordei com um pico de dor de cabeça que me tirou do sonho nítido: meu pai batia à porta da minha consulta já no fim, estendia a mão para mim e dizia: “venha, meu filho, venha comigo…!” Nem deu tempo para eu pedir para ser no fim de janeiro… Coisa mais estranha!

As melhores ausências estão nas boas lembranças

por A. Capibaribe Neto  

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Sim, porque podem se transformar em sadias saudades teimosas. Hoje eu já sei como é porque ainda está acontecendo e embora eu esteja no comando não tenho como parar ou fazer mudanças no daqui a pouco. Refletir sobre aquilo que deixou de fazer sentido é teimosia inútil e continuada de uma loucura consciente que maltrata. “Chama a psicóloga, rapaz…! . Socorro! Não, espera um pouco. É só uma fase, as coisas só estão apenas fugindo dos padrões normais; pura confusão mental. Estado de espírito momentâneo de uma fuga à realidade. Ou da realidade.

 

Pensamentos psicodélicos… Isso existe? Como? Nem uso drogas, nunca usei! Como escapar desse agora? Que abismo é esse que se abriu no ontem que não pude evitar? Já aconteceu e está se repetindo. Ei, doutora, existe remédio para curar as dores na alma? Não, não perdoo. Confesso a bobice do orgulho e repito: eu me basto! Socorro! Ajuda aqui! Não, não, foi sem querer. É por conta dessa música maluca que parece um bate-estaca, dentro da minha cabeça.

 

Enlouquece, sempre repete o mesmo diapasão e consegue desafinar os sons da alma; essa confusão estava prevista para acontecer amanhã mesmo porque já está determinado. Loucura, sim, perda de referencial, de rumo, de equilíbrio. Sinto tudo girar, coisa mais sem noção. Culpas são assim, machucam, principalmente se não aceitam arrependimentos. O vaso quebrou e era de um cristal tão bonito! Bastava um raio sol para elerefletir todas as cores do espectro dentro da sala vazia. Faz frio e está calor.

 

O mundo enlouqueceu e eu fui junto. Isso é perda consciente dos sentidos ou simples compulsão para consumir palavras,  escrevendo coisas sem sentido, como se fosse possível prever o ontem. Cansei! Foi demais da conta! Exagerei, confesso. Um vinho, por favor! Vem beber comigo. Pode ser água? Não posso me embriagar, preciso de sadia e serena lucidez para curtir as boas lembranças…

A MULHER QUE DEIXOU DE EXISTIR

por A. Capibaribe Neto  

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Fora do palco, de modo discreto e civilizado, tenho sido questionado por simpatizantes das sofrências alheias, prestando simpáticas solidariedade aos dramas comuns dos que aparentemente se queixam publicamente.

O escritor/cronista tem plena liberdade de trafegar lampeiro sobre páginas em branco ou telas luminescentes, explorando realidades ou fantasiando, criando, corrigindo as cores das emoções ou cavando mais fundo para abraçar os que chegaram ao fundo do poço onde foi jogado ou voluntariamente se escondeu para lamber suas feridas. É fácil, para aquele que goza da intimidade com as palavras e sabe arruma-las com o máximo respeito à gramatica e pincelando-as com as melhores cores, para extasiar os circunstantes.

 

Tenho lido e fartado-me com citações chegadas do mundo todo e largadas “pelaí”, sobre as terras de ninguém dessa internet e até delas me aposso para girar em torno das mesmas e criar ou recriar. Para cada homem que chora escondido e para cada mulher que perdeu ou lhe roubaram o sonho ou a ilusão de ser feliz, existe um consolo, uma acolhida e apoio. Uma palavra pode ser mágica e ajudar a absorver a primeira dor de uma despedia brusca. Abraço, sem entrar em detalhes, o amigo cuja mulher deixou de existir no quotidiano da sua rotina. Era duro, doía-lhe na alma e no orgulho, vê-la fagueira bronzeando-se em Salvador, meu pai! Tomando sol até ficar rouca.

 

Cada decisão tem os seus motivos e impõe aquele mínimo de dignidade com a qual não se deve negociar e não fazer perguntas, pedir ou não esperar explicações sobre o óbvio. Ora, se já foi, não está mais e não importa por quanto tempo. Se voltar, a melhor alternativa é fazer de conta que nunca foi e muito menos questionar o que fez. 


O que fez cai no “alea jacta est” e na volta, é prudente deixar no “consumatum est”. Melhor, talvez, seja refletir, antes de terminar uma relação, pensar nas vezes que sorriram juntos, nas lembranças divertidas, nos momentos compartilhados. Será que o orgulho remete a sugerir que o ego deva matar uma vivência do que foi bom e bonita?

 

Ou será melhor investir em um esforço sem exagero para reinventar as partes boas do passado interrompido? Afinal de contas, meu amigo, que mal faz o Sol da Bahia, que está (talvez) só atualizando o bronzeado cansado do sol de Búzios? Vai que mulher que deixou (temporariamente) de existir volta depois de descobrir que quem ficou é quem ela queria continuar a historia que começou em Saigon…

Gaslighting ou Prestidigitação Convincente

por A. Capibaribe Neto  

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GASLIGHTING nada mais é do que uma forma de violência psicológica sútil no contexto dos relacionamentos afetivos, no qual o perpetrador dessa ação moralmente criminosa contra inocentes ou pessoas ingênuas. O termo tem origem no filme Gás Light (À Meia Luz  - 1944). Na história, o marido tenta convencer a sua mulher de que ela é louca,

manipulando pequenos elementos de seu ambiente e insistindo que ela está louca ou que se lembra de coisas de forma incorreta.

Quando esse tal GASLIGHTING, alcança um grau extremo e perceptível até para quem está de fora do alcance dessa forma de prestidigitação, a vítima ou vítimas, já está ou estão muito fragilizadas ou incapazes de raciocinar ou refletir. Em um relacionamento amoroso, por exemplo, o cenário comum, embora a vítima (s) esteja sofrendo nas mãos desse mágico das palavras, quando um parceiro suspeita de uma traição e o outro jura que nada aconteceu, acusando-o de estar imaginando coisas ou ficando maluco (a).

 

GASLIGHTING é MANIPULAÇÃO, MENTIRA! O manipulador tenta levantar tenta levantar dúvidas na cabeça da vítima (s) sobre seu comportamento, as suas emoções, seus demais relacionamentos, como familiares e amigos. Essa (s) vítima (s) pode até desconfiar do abusador, mas como ele MENTE com tanta confiança, a sua percepção é colocada em dúvida. Esse prestidigitador mental, sim, porque a prestidigitaçao é a técnica de iludir o espectador com truques que dependem especialmente da rapidez e agilidade das mãos; ilusionismo, mágica. Por exemplo, um indivíduo astuto que consegue convencer os mesmos magistrados que o condenaram, fundamentados com fulcro em evidências sólidas, que o culpado, seria a vítima, merece realmente ser o comandante de um Titanic tupiniquim, a velejar, lépido e fagueiro mundo afora, usando luvas de grife para esconder seus nove dedos vencedores através de competente choldra oportuna, ao som de “Elvira no Ipiranga… etc. e tal…”.

 

O GASLIGHTING em vogue hoje, por exemplo, equilibra-se nos aplausos cúmplices dos  companheiros que desavergonhadamente empunham bandeiras defendendo quadrilhas terroristas capazes de decapitar crianças, arrancar fetos das entranhas de suas mães e atirar em suas cabeças, como se se fartassem de tira-gosto de caju depois de uma talagada de Caninha 51 ou Romanèe Conti, tanto faz.

 

GASLIGHTING é, por exemplo, prometer uma iguaria de carne própria para churrasco e convencer milhões que substituir picanha, por exemplo, por melancia, não se nota a diferença.

GASLIGHTING também pode ser a capacidade de um elemento da horda que alguém do outro lado da rua que bebe leite é um esnobe que discrimina a minoria negra porque o leite é branco.

 

GASLIGHTING é uma autoridade que posa na mesma fotografia argumentar com elogiável desfaçatez que um Buraco Negro, que  é uma região do espaço-tempo em que o campo gravitacional é tão intenso que nada — nenhuma partícula ou radiação eletromagnética como a luz — pode escapar. A teoria da relatividade geral prevê que uma massa suficientemente compacta pode deformar o espaço-tempo para formar um buraco negro, é também uma forma discriminatória de desrespeitar pessoas afro-descendentes, diante das câmeras de televisão e que consegue “iludir”, com inquestionável maestria, o séquito de ávidos por facilidades que os perpetuem na fila do peixe quase vencido, desprezando o aprendizado de pescar.

Enfim, GASLIGHTING é mais ou menos isso ou muito pior, mas é o que merecemos. O Reizinho está nu, mas viva o Rei!

DE VOLTA AO DESCONHECIDO ABSOLUTO ANTES DO PRIMEIRO OLHAR

por A. Capibaribe Neto  

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Existe um momento na vida em que se impõe uma reflexão profunda sobre um contexto, dentro do qual estão todas as passagens vividas. É quando um sentimento transformou-se no eclodir de desencontros, queixas, mãos crispadas, raivas e até pitadas de ódios. Nesse instante, o fantasma de um sábio anônimo aconselha: 


“Não seja prisioneiro do seu passado; ele deve ser encarado como lições, não assumido como uma sentença perpétua. Lembre-se que dentro dessas lições estão os aprendizados decorrentes das tentativas fracassadas; e não importa de quem seja a culpa. Ao final do consumo dessas emoções findas, quando uma decisão imposta apresenta a conta, cada um vai carregar a sua história e encontrar forças de ser capaz de deixar as mágoas chorarem até o fim.

 

O pior é para quem fica com a saudade… Sh, a saudade! Dizem que saudade não pede licença para entrar dentro da sua casa, do seu coração, na sua mente, na sua alma. De repente, você descobre que ela já está lá; chegou bem antes de você se dar conta. Vem com as lembranças das coisas boas interrompidas, causa arrepios, faz escurecer, faltar chão, ar, luz. E vai além; e piora, impõe-lhe ver o filme inteiro da sua vida compartilhada sem mais o dia seguinte, sem mais qualquer depois de amanhã. É como aquele filme que dizem ser visto na ante-sala da morte. Esse filme é quase real.

 

Você sabe que viveu, foi parte dele, mas não está mais lá. A realidade imposta por essas visões intermitentes são carregadas de sons, cores, cheiros… Ah, os cheiros! Quase visíveis… E te grita ou sussurra que está ali sintetizando tudo aquilo que uma vida escolhida para viver a dois significou e… chegou ao fim, como tudo na vida. Não tem como fechar as portas para a saudade. É impossível recusa-la. Ela é tudo aquilo que fica ali, gemendo dentro do peito onde o vazio pesado é tudo aquilo que restou do que deixou de ser parte…”

Sabendo de tudo isso, tendo consciência de tudo aquilo que viveu; se lhe fosse possível voltar no tempo, um minuto antes do encontro do primeiro olhar cúmplice, se pudesse evitar esse momento e seguir outra direção, seguiria em frente? 


Seria voltar ao desconhecido absoluto antes desse olhar com que viu, viveu, sentiu e escreveu seu destino interrompido.

Uma promessa para ser cumprida até na Eternidade

por A. Capibaribe Neto  

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Tenho visto com alguma frequência, aqui mesmo, neste espaço glamouroso, registros de sentidas partidas de pessoas queridas e festejadas. São notícias que a editora não gostaria de dar, mas o inevitável não pode ser ignorado e a tristeza se dissemina. De uma coisa precisamos ter certeza: um dia seremos também essa ausência que nos está reservada desde o dia em que nos fizemos presentes.

 

Ninguém gosta de falar disso porque prefere acreditar na certeza do amanhã e outros, mais visionários, no daqui a uma semana ou no próximo ano. O amanhã não é nosso e a vida ė uma viagem de trem que fazemos sozinhos ou na companhia daqueles a quem queremos bem. A cada dia chegamos a uma nova estação onde estão as surpresas, as festas, as celebrações e a realização de sonhos ou, infelizmente, as tristezas.

 

Quando nos é permitida uma nova partida, ao deixarmos uma estação levamos na bagagem as lembranças que vivemos nessa parada e as transformamos em saudades ou vontade de voltar, mas esse trem nunca volta para repetir a estação anterior. O tempo do trem é para frente e a velocidade é a mesma para todos. A percepção da passagem desse mesmo tempo é igual, só que a paisagem que corre lá fora pode ser diferente dependendo da janela no lugar que lhe foi destinado e da atenção de cada um com o que existe lá fora.

 

Desculpem lembrar-lhes de uma realidade: um dia você deverá descer em uma estação que já lhe está destinada para ser a sua ultima nessa sua viagem; está escrito na passagem; você é que não quer ver. Ou não quer acreditar. Assim, um dia, nem você nem eu estaremos mais aqui, mas o trem continuará sem nós dois. O importante, ao longo dessa viagem é o que vamos deixando como lembrança dessa jornada.

 

Nós somos as soma de todas as boas coisas que deixamos, mesmo as promessas que não pudemos cumprir, mas que foram feitas de coração. Certa vez, faz tempo, eu prometi: “Se um dia você sentir a minha falta ou precisar de uma presença sincera para acudir a uma dor qualquer, no corpo ou na alma, telefone, fale comigo. Não importa como as coisas estejam entre nós, não importa quão distante eu esteja fisicamente, porque eu virei correndo. Eu prometi que sempre estaria com você quando você precisasse. E eu costumo cumprir as minhas promessas. Mesmo que eu não esteja mais aqui, que já tenha descido na minha última estação, estarei acudindo você lá na eternidade…”

 

 

CONFISSÕES — DRAMAS ATÉ O FIM

por A. Capibaribe Neto  

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Muitas postagens mostradas, tanto no Facebook quanto no Instagram, se repararmos bem, remetem a desabafos, indiretas, provocações; remetem a compara-los a um muro das lamentações a se perder de vista. Ali, muitos concordam, identificam-se com o que é dito, solidarizam-se, discordam, debocham, insultam, provocam e respondem, sem ser convidados, entrando “porta adentro” só para preencher seus tempos de solidão.

 

Tenho postado crônicas que estavam dormindo quietas em muitas caixas esquecidas e que arrasto comigo ainda sem coragem de dar-lhes um destino digno que não seja um respeitoso lixo, seja pela inutilidade, seja pelo incomodo no espaço que ocupam e, principalmente pelo risco de se constituirem perigo em caso de incêndio.

 

Já cheguei a pensar em fazer uso da máquina de triturar papeis, transformando tudo em tiras. Minhas histórias e estórias, retalhos românticos de realidades continuadas, sonhos, fantasias, invencionices, ficção desabafos, homenagens aos amores a que tive direito; frustrações, verdades disfarçadas, indiretas amorosas, tudo a que todo mundo tem direito quando tem intimidade com as palavras e sabe bem posta-las com o máximo cuidado gramatical, tudo, mas basta escolher uma, para destina-la à guilhotina para destruir esses sentimentos que fizeram parte da minha vida, de verdade ou na imaginação criativa que me provocou para voltar no tempo e reviver o momento de quando foi escrito. “Por que você não escreve um livro?” - já me perguntaram muitas vezes. Porque os livros estão agonizando lentamente, morrendo dentro de livrarias que fecham, de bibliotecas relegadas ao ostracismo pelo desinteresse pela leitura.

 

O romantismo entrou em coma profundo. Acabaram com a importância e seriedade momentânea do “para sempre”. A moda é a sofrência cansativa nas letras das músicas escritas com as lágrima de mil dramas de periferia sertaneja ou praciana. E haja choro!

 

Olhem só essa que escrevi faz tempo, quando pensei haver encontrado um amor para substituir Laura, que ficou na Piazza Navona, na Piazza del Popolo, aa longo do Trastereve, nos jardins da Universidade Pro-Deo, em Roma: “essas músicas que teimo em escutar vez por outra são as minhas saudades tuas ainda à flor da pele e depois, os dramas a que tive direito. Eu tenho. E continuarei tendo, até o fim…”

 

 

A ASSINATURA DA CHUVA

por A. Capibaribe Neto  

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Estava ali matutando, olhando a noite calma passeando pela madrugada nas ruas desertas, lá embaixo… Tinha chovido, o asfalto brilhava depois do banho da chuva que veio forte lá do alto. Ainda haviam riozinhos correndo apressados pelo meio-fio e atravessando a avenida larga, até sei lá onde. 

 

O vento que acompanhou o resto de chuva, agora empurrava as folhas das plantas do meu pequeno jardim contra o vidro da janela, fazendo parecer que elas procuravam refúgio, querendo entrar. 

Só quem está só, sem muito ter o que fazer é que deixa a imaginação brincar, inventar coisas, cutucar lembranças, bordar saudades dentro do coração. 

 

Ora, agora dei-me conta de uma saudade estranha fuxicando na minha insônia… Saudade estranha porque é de um nome, de um rosto, de uma voz que nunca escutei ao vivo… É de gente, sei quem é, só que nunca vi, mas disse que quer me ver pra valer, quer beber os vinhos que bebo, mas hoje,  em taças distantes, muito longe. 

 

Pra me consolar, disse até que moro em seu coração. Escrevi-lhe de volta que meu coração vagabundo, estava cansado de tanto buscar um chegar seguro pra ficar de vez, depois de já quase sem esperanças de encontrar o fim da busca e plantar-se. “— Entre, se aconchegue…” - ela disse, de longe. Como é que vou chegar, se nem sei o caminho direito, o endereço com placa no portão, só a direção. 

 

Saudade estranha, essa, sem o cheiro na pele, o gosto do gosto da boca, do beijo, o tanto do aperto do abraço que apenas imagino. 

 

A chuva acabou de vez. As folhas se aquietaram, agora coladas no vidro. A noite rendeu-se à madrugada e eu aqui, continuei sozinho, sem saber que é por ela que espero nem mesmo se ela espera por por mim bem longe daqui, onde mora meu eu sozinho, sentindo essa saudade enorme da mulher que encontrei no Vietnã. 

Pela manhã, vi a assinatura da chuva na flor que brotou…

 

 

Alinhando os ossos da alma no Eu interior

por A. Capibaribe Neto  

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Com o passar do tempo, em certos momentos onde tudo parece dar errado e em desalinho com a paz, o eu interior vai-se ajustando às diferenças que doem, mas aceitamos por uma questão de sobrevivência. O preço para sobreviver muitas vezes compromete a paz de espírito e cobra, como juros, os espaços cedidos compulsoriamente às angústias.

 

Como consequência, o corpo refugia-se nos vazios onde só existem nos aconchegos dos travesseiros sem par, desde há muito. O corpo e a alma procuram bálsamo para acalentar, e só encontra no estranho abraço inocente que nos remete ao primeiro mundo naquele espaço antes de vir ao mundo. Abraçamos-nos na posição fetal para enfrentar as ameaças de fora, mas do lado de fora, onde moram as verdadeiras consequências, o corpo consciente acomoda-se, mesmo sofrendo, aos resultados das escolhas e sofre, mutilando aos poucos a paz que devia existir.

 

Bem vindo (?) ao mundo real da depressão! De repente, “crack!” – foi o som mágico dos ossos da alma encontrando o caminho para a serenidade física interior! Esse caminho passa pela coluna que é o pilar da estrutura que possibilitava os abraços agora ausentes. Passei muito tempo abraçado às caraminholas das letras de canções tristes… “—Que depressão é essa?” - escutei muitas vezes. Era saudade de mim, saudade dos raros momentos em que experimentei a sensação de felicidade e sorri com o tempo. “Crack!” e a coluna encontrou o equilíbrio para sair do refúgio sem cor e voltar a caminhar entre as árvores do parque, sentir a brisa com gosto de maresia, reencontrar a paz aguando o pequeno jardim, pensar em A., onde quer que ela esteja. 


Esta crônica é dedicada a duas profissionais que mais parecem anjos da guarda que me socorreram quando desistir parecia ser a única opção. Obrigado, dra. Louise - osteopata que ilustra esta crônica e Beatriz, paciente fisioterapeuta, pelos “cracks” que deram harmonia aos ossos da alma, há muito em silencioso desalinho. Anjos da guarda existem.

 

 

Dançando ao som de “Because You Loved Me”

por A. Capibaribe Neto  

Kintsugi (金 kin = ouro | 継ぎ tsugi = emenda), significa literalmente "emendar com ouro" e é uma técnica de restauração de cerâmicas e porcelanas que utiliza laca ou cola misturadas com pó de ouro, prata ou platina.
O 'kintsugi' evoca o desgaste que o tempo provoca sobre as coisas físicas, dando valor às nossas imperfeições.

 

A filosofia vinculada ao kintsugi pode se aplicar à nossa vida atual, repleta de ânsias de perfeição. Ao longo do tempo, conhecemos fracassos, desenganos e perdas. O mais difícil é que o vaso – filosoficamente é você; se quebrou foi pelo mau uso seu ou por parte da pessoa que você deu para usar – assim, a responsabilidade é sua de restaura-lo, mas você precisa ser artista paciente para juntar os cacos, para recupera-lo e torna-lo mais bonito e a liga para esse trabalho é o ouro que, também filosoficamente é a sua capacidade e paciência para unir cada pedaço. 


Ao longo de toda a minha vida, dei-me conta recentemente, escrevi centenas de crônicas que abordavam a prática que faz tempo caiu em desuso: o romantismo. Minha coleção de momentos felizes — deve ter sido o karma, essa cobrança pelo abuso de tanto livre arbítrio. Estou pagando a conta pesada do EU que fui e não me lembro como foram essas histórias.

Assustei-me, confesso, com tantas coisas que escrevi nas crônicas publicadas na minha coluna, no Díário do Nordeste, “Estrelas Esquecidas”, sobre amores prometidos para sempre e transformados em cacos, como sugere o “kintsugi” e a paciência que não tive ou se tive de pouco adiantou, mesmo usando ouro e paciência.

 

Como eu existem muitos; homens e mulheres, que se arriscaram a acreditar nesse “para sempre” tantas vezes sonhados e prometidos… O tempo é pouco para escolher os melhores arrependimentos e refazer histórias mal acabadas. Ainda bem que é possível continuar sonhando com A., convida-la para sair da piscina, onde ela se refugia desse calorão assustador, para dançar ali, à sombra de seu deck, a música que a coincidência de gostos nos une: “Because You Loved Me…”!

A Rosa do Deserto e um Beduino

no jardim de casa

por A. Capibaribe Neto  

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Descobri a Rosa do Deserto, a música, muito antes de conhecer a planta que dá a flor e o trabalho que dá para cuidar dela e ter paciência por um ou dois anos até que a primeira flor mostre a sua beleza. A floração da Rosa do Deserto, costuma acontece durante a primavera, mas pode apresentar flores e botões durante todo o ano, desde que seja cultivada nas condições ideais de luz, água e solo. Tenho uma aqui, comigo e tenho cuidado dela sem saber que estava cuidando bem. Eram duas e só uma delas deu uma flor e fui muda-la de lugar sem prática na jardinagem e porque ela morreu. Tenho cuidado redobrado com a que sobreviveu enamoramos faz tempo, mas flor, como um primeiro beijo sonhado, não aconteceu ainda.

 

A letra da música fala de um beduíno, talvez, que sonha com jardins na areia do deserto e acorda em vão porque sonha com o amor no mesmo sonho enquanto o tempo passa. Ele sonha com o fogo que une dois corações que não deveriam morrer nunca. O fogo produz sombras que brincam com o desejo do homem pela sua Rosa do Deserto.  Ele diz que seu perfume o torturou mais que nenhum porque carrega uma promessa secreta que se move só na lógica de todos os seus sonhos. Que lógica existe em um sonho? Nada é o que parece, principalmente se o beduíno sonha com a chuva no deserto, assim como eu sonhei desde que descobri também que meus sonhos são antigos, que passei a vida acreditando em sonhos.

 

Estive no Marrocos duas vezes e viajei de Casablanca de carro, um pequeno, sem ar-condicionado, até Agadir e depois, nem lembro mais como, cheguei às primeiras areias escaldante do Saara. Em algum outro tempo, se encarnação acho que fui um desses beduínos a deixar rastros sobre os bordados tecidos pelo vento que nunca para seguindo seu caminho sobre as dunas, ora douradas, ora quase ferro derretido. Tinha comprado, em Dubai, um desses souvenirs de um beduíno montado em seu camelo, produzido aos milhares e aos milhares vendidos.

 

Nessa fase de organizar a história das minhas andanças pelo mundo , do jeito que pude, fiz um canteiro com a minha Rosa do Deserto e “coloquei-me lá”, com a cumplicidade da imaginação e aquietei ensaios de angústia momentânea, escutando a música cantada por seu autor, Sting, em inglês e Cheb Mami, em árabe e volto no tempo, no espaço e junto tudo em uma foto, esperando que tempo ainda me reste para ver florescer a minha Rosa do Deserto que sem eu saber, estava no Vietnam e faz bem pouco sorriu para mim quando mais preciso de um sorriso e um abraço de sonho para acreditar que beduínos podem sonhar com a chuva no deserto quando cultivam a sua rosa, não importa onde.

AS CORES DA VIDA NUMA GARRAFA

por A. Capibaribe Neto  

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Mesmo em um espaço como este, dedicado às boas notícias, aos eventos festivos e ao glamour clássico dos lounges e dos espaços restritos e reservados, as tristezas, já escolhidas pelo destino não perdoam. Não podemos esquecer a saída prematura do querido casal, como todos sentiram e as passagens do jornalista amigo, Anderson Sandes e outro colega conhecido por dar destaque à festa da socialite, Mr. torres; devemos aceitar a finitude das nossas missões e da nossa presença na experiência fantástica que é o dom da vida.

 

A vida é um espectáculo e cada um de nós, mesmo separadamente, mesmo sem contacto diário ou a frequência contumaz nas salas e espaços onde tudo acontece, aqui, ali, além, em todo o mundo, desempenhamos o papel que nos convém nesta grande área, nos palcos, nos picadeiros, nas praças, nos muitos caminhos e nas escolhas, onde viemos — de passagem, para brincar. Um dia, as cortinas se fecham e os holofotes das apresentações individuais se apagam; luzes modestas, velas ou lâmpadas não dizem mais onde há vida, existência.

 

O ser humano sempre esteve habituado a celebrar a vida, mas o fato de a vida não ser eterna a passagem é uma questão desagradável, hostil, indesejada, mas infelizmente inevitável. O fim das amizades, dos relacionamentos, dos contratos siciais diante da justiça — os casamentos, das uniões estáveis, em todas essas existe a possibilidade de que essas decisões inoportunas ou não sejam revisadas e possam proporcionar, com a força do arrependimento, um novo começo.

 

Porém, nem sempre isso acontece porque nessa vida, onde quase tudo é possível, existe a exceção quando morre a energia das emoções, quando o coração pára de bater na entrada da porta onde começa o caminho do “para sempre”, na eternidade depois da derradeira passagem... É lá, neste ponto, que recebemos a condição de nos tornarmos boas lembranças e saudades saudáveis.

 

Neste momento aqui, onde um silêncio que se impõe às decisões de uma ausência em vida, vejo dentro do frasco que enchi com os cristais de uma flor de vidro que se desfez, ao olhar mais de perto descubro as cores de pequenos arco-íris. É uma celebração dentro luminária que construí e já instalei.

 

Estou me divertindo com essas faíscas que vão desaparecer quando eu apagar a luz for dormir, mas amanhã, quando será um novo dia — porque até agora tem sido assim — mais uma vez, quando eu acender a mesma luzinha a festa voltará. Pelo menos enquanto eu estiver aqui para acendê-la. Nesta calma particular imposta, neste silêncio que já começa a se tornar sereno e saudável, aproveito e faço as minhas malas sem pressa, vou me desfazendo das lembranças ruins e separando as boas saudades e aproveito para deixar aberta a porta da vida...

Não conhecemos essas decisões desagradáveis do Criador...

“EU NÃO MERECI”  UM GRITO NA MADRUGADA

por A. Capibaribe Neto  

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Rico, não era, tinha dinheiro; aliás, seus pais, que trabalharam duro, deram estudo nos melhores colégios – onde ele sempre conseguiu ser o pior, o mau exemplo, cheio de graça, palhaço, mas achava que os colegas gostavam. Que nada, as meninas, por exemplo, faziam troça dele pelas costas e o pior, tinha halitose e ainda por cima se gabava, achando que era coisa boa. Nunca se deu ao trabalho de procurar saber, pois ozostomia é sinônimo de mau hálito. Filho único, teve sorte – modo de dizer; era um exímio inútil, mas tinha tudo o que queria. O pai, coitado, fazia-lhe os gostos.

 

Não trabalhava, diga-se, pois o pai preferia mantê-lo longe da empresa para não atrapalhar ou mexer com as mocinhas que trabalhavam duro e “deixavam pra lá” as piadinhas de mau gosto, os enxerimentos ridículos, mas tinha dinheiro – o pai tinha e como filho único mimado, tinha por tabela. Frequentava a periferia porque nos ambientes de classe, de boa gente, de bons modos, ele não tinha vez... até que faz pouco, descobriu um clube que incomoda e funciona contra todas as regras em seu entorno – porque do lado de fora, é com a polícia que nunca fez nada para coibir, efetivamente, as faltas de respeito continuadas, nos fins de semana ou véspera de feriado.

 

No estacionamento de uma farmácia, um quiosque funciona antes, durante e principalmente depois da barulheira que incomoda. O portão de ferro que existe no canto, mostra onde a moçada estabeleceu como banheiro unissex para eliminar as cervejas fartas. Os donos do quiosque cuidam para deixar tudo limpo quando os mais exagerados decidem ir embora e o pior, é que quando a madrugada se cansa e o dia vem raiando, existe uma meia dúzia que parece ter ficado surda e mesmo que seu interlocutor esteja até dentro de um abraço, só fala gritando.

 

Pois esse rapaz, encontro ali o seu picadeiro. Como a experiência de empinar moto e arrastar a rabeira no asfalto para impressionar circunstantes, de quem não escutava as vaias dos civilizados – sim, porque mesmo pessoas civilizadas vaiam quando o espetáculo é ruim. O dele e daqueles que afrontam as autoridades com o desrespeito gritante a todas as leis do trânsito, vendeu o que sobrou da moto e seu pai lhe deu um carrão. Era com esse carrão que chamava a atenção das mocinhas contumazes do lugar e das madrugadas adentro.

 

O tal rapaz acha-se o máximo quando ensaia que vai embora, buzinava e acelera ao máximo, com os efeitos sonoros que ele paga caro para ser mais ridículo ainda, incomodando quem, infelizmente, escolheu morar em um lugar que já foi muito calmo e bom. Mas, gora mesmo, enquanto dedilho essas mal traçadas linhas, uma mocinha roubou o espetáculo do chato do ridículo; é que ela, visivelmente enxarcada com muitos coquetéis, está gritando, a plenos pulmões: “eu não mereci, não mereci...”.

 

Não sei o que foi que fizeram com ela para não ter merecido, mas foi preciso uma amiga ir em seu socorro e levantar a alça da blusa, porque metade dela é que dava o espetáculo, por sinal, muito interessante. Hoje,  mesmo com a barulheira do rapaz ridículo a madrugada foi, definitivamente, da mocinha da alça que baixaram.

A Noite da Grande Lua

por A. Capibaribe Neto  

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Faço anotações sobre momentos, pensamentos ou retalhos de inspiração avulsas, nascidas assim, às vezes do nada ou de uma brisa ou corrente de ar na rua ou na praia, em qualquer lugar, quando, por exemplo, por perto ou mesmo longe vestiu-se de Trussardi ou L´Iínsolete, de Charles Jourdan  e aí, corro para o primeiro pedaço de papel, valho-me de uma caneta e faço uma anotação. Tenho centenas dessas anotações e muitas delas não lembro mais o que significavam porque aconteceram muito depressa, anotei uma ou duas frases, coloquei no bolso, na mochila, centro de um livro, durante um voo e pronto, só aparecem como agora. “Bonita por Natureza...” Quem terá sido?

 

E continuei, no mesmo pedaço de papel amarelo: “Não precisava fazer nada, mas já era um pecado, só pelo fato de respirar dentro de um decote, desses modernos, que podia estar debruçado na blusa simples que, talvez estivesse usando para ir a uma missa sem graça. Cultos, hoje, são estranhos. Pastores pulam, gritam, inventam, mentem, tudo em nome do Grande Arquiteto do Universo que, seguramente, não liga para o que os ingênuos dizem aproveitando-se do passaporte azul do Livre Arbítrio. Fosse no fade (fusão) da liberdade dos costumes, quando tudo está podendo, o padre grisalho, ainda assustado e temeroso de ceder ao modernismo que foi eliminando muitas restrições, até poderia pedir a uma das beatas mais assíduas e prestativas, para sugerir que a moça do decote vivo e em cores, não desfilasse pelo corredor da igreja e postasse-se na primeira fila para o culto da hora.

 

Talvez estive sozinha, não vem ao caso, estaria acompanhada de mil olhares afiançados pelo livre arbítrio e também, olhar de esguelha não seria lá tão pecado assim. Não foi uma mudança de humor radical, uma escapada oportuna, não. Está aí o pedaço de papel amarelo que não me deixa mentir... A verdade é que a “Luazona” dessa semana fez-me cobranças pertinentes. Foi intuitivo mandar limpar a minha luneta e recebe-la justo no dia do espetáculo que alvoroçou românticos e novos curiosos para espiar o céu. Continuando...

 

Era uma mocinha linda por natureza, disso não tenho dúvida, tanto que a imaginei indo – olhe só, a uma missa. O olho do furacão é quando acontece aquela calma aparente. Em volta, todo mundo já sabe, já viu. Nessa analogia romântica, digamos, é quando uma acomodação tectônica das placas litigantes recuam ou permanecem em estado de atenção para uma nova investida. A “Luazona” desse agosto apareceu majestosa, assestei as lentes da luneta e a a trouxe mais pra perto.

 

Encontrar a folha de papel amarela e ir espiar a Lua estilosa foi uma fuga providencial. Tirou-me da mesmice cansativa de procurar motivos e razões para o furacão nascido de uma tempestade perfeita não prevista. E lá estava a Lua, linda... como a mocinha que despertou as minhas atenções, não sei quando nem onde. Já passou, faz tempo e nem sei quanto. Esse agora está acontecendo e nesse durante, A. me escreve e diz que é apenas um namoro especial... Especial como o quê, como o decote da mocinha que talvez tenha ido à missa?

As mensagens trazidas pelo vento

por A. Capibaribe Neto  

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A semana teve de tudo. Inclusive, ventania forte, gemendo pelas frestas da minha janela, parecendo fantasmas querendo causar medo, que nada mais é que uma mentira que só serve para alimentar o inimigo. Cheguei a gravar, inclusive a dança das plantas do jardim pequeno contra os vidros, como se quisessem entrar.

 

 Uma casa, grande ou pequena, mesmo momentaneamente, respira. Pulsa, tem vida, fantasmas antigos passeiam sem pedir licença e não adianta fingir coragem. A imaginação pode ser quase perversa. O pior, nesse contexto quase verídico, foi a leitura, de um texto que falava de um morto: “ele, ali, silente, de olhos fechados, sem mais dor, sem mais sofrimento, aparentava a lembrança fria e ausente de quem recebeu e absorveu muita dor e sofrimento...” – o pior é que o pouco tempo da permanência dos circunstantes não conseguiu preencher as perguntas dos curiosos para saber as histórias e depois poderem divagar sobre as versões.

 

 Pois bem... a ventania durou bastante. Ora assobiava, ora gemia, mas os nossos maiores inimigos, em noites/madrugadas assim não são esses fantasmas que parecem querer dizer alguma coisa; são as forças de certos males que represem mágoas que carregamos dentro de nós. 

 

O ser humano é muito complexo; acompanhado ou sozinho, mesmo em meio a uma festa contagiante, sua imaginação está sempre em atividade e assuntando, procurando complicar o simples e simplificar uma teoria da física quântica.

 

Aliás, falei em física quântica só mau, para sofisticar. O que acontece na vida de cada um de nós, na maioria das vezes, deixa marcas profundas na carne e não passa de uma mentira, ferindo fundo a alma e em noites assim, com o vento forte fustigando as frestas como uma provocação, para suscitar o medo e servir de alimento para o inimigo, muitas vezes imaginário. 

 

O vento faz uma pausa, silencia e, de repente, insiste com mais força ainda, acordando lembranças de momentos mais sombrios. Chego a imaginar que o cronista tem o poder de virar para a outra extremidade dos 180 graus, mudar de assunto, fingir-se de maluco e mudar de assunto abruptamente, mas logo diriam “o cara saiu de sintonia com a realidade”; bebeu? Sei lá. Trauma!

 

 Ninguém sabe, ninguém viu, ninguém entende as mensagens que o vento traz no meio da semana, com esse tempo louco, noticiário assustando, dizendo que o mundo vai pegar fogo, que o Bolsonaro vai ser preso. Tudo vale. Esses recados são confusos. 

 

O certo é que, em noites estranhas desses tempos estranhos, como costumava dizer o ex-ministro decano, Marco Aurélio. Em síntese, mente desocupada é oficina para o capeta fazer das suas, não que a minha esteja desocupada, principalmente porque fiquei assustado com o vento forçando os vidros da minha janela, como se estivesse tentando me dizer as mensagens que vinham de longe...

Uma dose de poção mágica

por A. Capibaribe Neto  

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Fazia tempo que não nos víamos, mas a necessidade de uma circunstância especial a trouxe ao meu lugar. Estava simplesmente linda e não precisou de artifícios para exibir a simpatia de sempre no sorriso mágico que a caracteriza. 

O contexto do encontro não foi dos melhores porque envolvia a necessidade de ela ser portadora para levar um remédio especial entre outros objetos e documentos para um parente em São Paulo.

 

 Quando acabei meu bocado da história que tinha para contar, ela abriu um vidrinho com uma poção mágica que trazia em seu coração lindamente moreno. (Abro um parêntesis aqui para lembrar que a gentileza da concessão deste espaço não me confere fazer uso dele para o que vou fazer agora por se tratar de um familiar querido.

 Jornalistas ou mesmo um cronista não é notícia; notícia é você, que acontece, mas vou me permitir o direito de abusar, desculpem). Estou falando da minha primeira neta, no caso. 

 

“Capizinho...” ela não me trata por avô e eu simplesmente adoro. Pode levar o tempo que levar, mas quando nos encontramos é sempre uma alegria sem cobranças... minha mãe um dia me perguntou porque quase nunca uso o sobrenome dela, mas sempre o da família do pai. “Mãe – continuou, quando eu preciso de colo, de aconchego, de um abraço que só uma mãe pode dar, eu uso, sim, o meu Norte mais seguro, que é você e o bem que lhe quero não tem tamanho, mas quando estou na lida, enfrentando as rotinas do meu trabalho, da minha profissão, onde não existem concessões para que eu ocupe os espaços de cada dia, é no sobrenome do meu pai, que saio do seu aconchego, mãe e encontro força para desconhecer medos e temores, onde posso mostrar o que aprendi e não temer as dificuldades e seguir de cabeça erguida.

 

 Visitando você assim, nesse momento de diferenças que grassam país afora, vendo as consequências que atingem a tantas pessoas, envolvendo amigos, familiares e interesses pessoais, quero que você saiba que não é a evidência de tanta ausência minha por conta do trabalho, você, sem estar tão implícito no que digo, escrevo e falo defendo, está, sim, sempre comigo...”

 

 A sinceridade não permite espaço para questionar o olhar da alma quando a mensagem do que nos chega vem direto do coração de uma neta querida para o coração cheio de culpas ao longo do caminho de uma vida inteira e as desculpas para explicar o erro humano ou as facilidades do livre arbítrio e as defesas nem sempre tão assimiladas.

 

 Essa estava sendo uma conversa entre uma neta e seu avô e não havia espaço para esconder um fraquejo que denunciassem lágrimas nos olhos de um homem de cabelos brancos. Ela precisava ir. Levantei-me para ir pegar a caixa com os remédios e os documentos solicitados e que deveriam ser levados e entregues em mão. Abraçamo-nos rapidamente e acompanhei-a até o carro quando ela foi embora. 

 

Não havia nem mesmo um suco que pudesse ter oferecido a ela, nada. Em outro momento, poderia até fazer uma festa para a festa que sempre era a presença dela. Ficou para outra vez.

 

 Quando comecei a vestir a sensação de estar sozinho outra vez na casa grande sem ninguém, descobri um bilhete sobre a mesa e que agora está debaixo do vidro da mesa que uso como escrivaninha. Era uma dose de poção mágica: “Você não está sozinho. Com amor, sua Neta (Aléxia Capibaribe)

Novos Sons do Silêncio

por A. Capibaribe Neto  

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Com alguma frequência, minha inspiração tem-se valido, amiúde, de inspirações alheias, principalmente quando coincidem, nos cantares de músicas românticas, sejam pelas colocações de palavras mágicas de suas sofrências discretas ou escrachadas. “The Sound of Silence”, por exemplo, remeteu-me a uma realidade que sempre caminhou ali comigo, instigando-me a largar a mão de ser teimoso, de acreditar que o tempo tudo cura. 

 

Meu deus, quanta ilusão. O tempo apenas passa e tudo o que faz é afogar-nos nele próprio e, de repente, ali estamos de forças minguadas, a reclamar de nós próprios e arrependidos por não termos dado ouvidos à sensatez. Paul Simon chama uma certa solidão “velha amiga”… Ora, quando uma determinada solidão bate à porta, mesmo que já tenha avisado antes, e até pior, tenha ameaçado, não deixa de ser uma surpresa, mesmo porquê a solidão é praticamente o exercício do silêncio como escolha ou mera fuga como alternativa, quando você começa a falar consigo com uma visão que aparece vez por outra, impondo a sua presença suavemente, como um anjo que vem em socorro.

 

Muitas vezes, lembro bem, adormeci como em um desfalecimento imposto pela necessidade de paz ou busca de restos de força para não desistir, mas depois, acordava para retomar a caminhada, vendo pessoas falando sem falar para pessoas que apenas fingiam escutar, sem dar a mínima importância. 

 

Um dia, a razão se impõe e grita, ou se impõe e tudo parece fazer de conta que em um gesto simples é possível fazer parar o tempo… Basta um segundo para se escrever: chega! Ou não vou voltar.

 

 Aparentemente, não mudou nada, havia a dinâmica do silêncio e a intransigência na disputa com um fio tênue que sempre ligou o nada das escolhas radicais à intolerância e desrespeito ao contraditório. Então, com um clique poderoso, acionado pelo nível que faz derramar a última gota, o novo silêncio se estabelece. Fica tudo tão quieto que a alma parece adormecer como em uma anestesia no templo de uma sala cirúrgica onde os espíritos operam. O silêncio é pesado, quase se pode ver porque assume formas.

 

 Cheguei a escutar o som dos fantasmas, o alívio das culpas e das razões fugindo para seus esconderijos separados. O silêncio é diferente. No início, incomoda, mas depois, vira uma canção discreta que começamos a gostar. São os sons de um novo silêncio a caminhar nos corredores na penumbra…

Cobranças do Karma 
em noite de lua cheia

por A. Capibaribe Neto  

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Há tempos — dizendo assim parece vago —, mas é uma forma de dizer o que se pensa quando a precisão desse espaço não vem ao caso, pois que seja… há tempos, eu não sentava diante das janelas fartas onde, em uma delas coloquei uma rica moldura italiana. 

 

Lá fora, o cotidiano da vizinhança, nada de novo; aliás, a mocinha que passeava só de calcinha, dentro da moldura comum do apartamento dela, sumiu. Um dia, viu da janela dela que eu era uma figura curiosa na moldura do meu apartamento e até sorriu.

 

Não se protegeu nem nada; abriu a geladeira, pegou uma cerveja, uns salgadinhos na prateleira, fez um gesto de tim-tim e sumiu pra dentro de casa.

 

 Então… dessa vez, era de noite, esta semana, mais precisamente… passara o dia dando uma de faxineira, organizando meus arquivos, preparando o espírito para assumir as cobranças do Karma – ele sempre chega, é pontual e cobra à vista. Não é dando um de conformado, não. O livre arbítrio não brinca e não é tão livre assim, os juros estão embutidos e especificam tudo, cada parcela, mas nas letrinhas miúdas de um contrato que assumimos sem nos dar conta. 

 

O dia fora preenchido na cata de comprovantes, atenuantes para apresentar na audiência da prestação de contas moral. Que seja. Quando eu repetia que “me bastava” não estava brincando, mas cada culpa tem um tamanho e não aceito os exageros oriundos dos das intolerâncias, dos radicalismos que querem ou pretendem se impor como o supra sumo das razões universais. Não aceito. 

 

Aí, volto à janela dessa noite. Ninguém tem nada com as cobranças do Karma de ninguém, principalmente do que bate à minha porta. Devagar, sem muita pressa, quando saí do transe das elucubrações, a Lua! Nem sabia que era noite de lua cheia. Nessa noite, foi especial e mágica.

 

Acalentou, fez um afago, falou comigo, disse que houve exagero, oportunismo, que a vida é assim mesmo, que o Karma, do jeito que veio me visitar, daqui a pouco vai bater à porta de quem exagera nas parcelas e alega que não pediu o pudim de leite condensado.

 

Mentira, pediu. A lua viu. Deixei pra lá. Devagar, a Lua conselheira e companheira de uma vida inteira cuidou de mim. Nem lembro quando fechei os olhos e dormi. Era madrugada, fazia um frio besta. Na janela havia uma tela escura, tudo indicava que iria chover, mas no dia seguinte ainda seria noite de Lua cheia.

Explicando o trauma da traição

por A. Capibaribe Neto  

 

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À pergunta anônima solta, largada no meio do Instagram, li a resposta que faz algum sentido, dependendo de que lado se esteja aquele que que sofreu uma. Em todos os quotes no Instagram, nas citações publicadas, podemos encontrar, aqui e ali um bom trigo em meio a tanto joio farto, que confunde e às vezes agride pelas invasões atabalhoadas à gramática. Mas vamos lá, depois desse introito. “Você sabe o que é um trauma decorrente de uma traição, seja ela qual for? É como se você tivesse sido empurrado para fora de um avião sem paraquedas. E enquanto você está caindo, olha para cima e vê a pessoa que te empurrou, apenas olhando a tua agonia, o teu desespero em queda livre. A pessoa fica vendo você cair até bater no chão e agora, a pessoa está sorrindo.

 

A queda quebra todos os ossos do teu corpo, mas milagrosamente, de alguma forma você sobreviveu, embora você não se sinta vivo e definitivamente não se sinta com sorte. O fato é que a pessoa que te empurrou continuou seu voo, não pousou nem procurou saber de você, não se explicou ou desculpou, simplesmente continuou. Em vez disso, envolveu-se com outra pessoa ao longo de novo caminho.

 

O trauma da violência dessa traição não quebrou apenas teus ossos, destruiu a tua auto-estima, a tua confiança, a tua segurança e a tua verdade. Você deixou de entender o amor, e passou a conhecer o mal. Essa pessoa matou uma parte de você antes de você estar preparado para morrer. Existe egoísmo nas pessoas que decidem abandonar o outro sem avisar e deixam você seguir no mesmo voo e de repente, abre a porta te empurra pra fora e você não tem um pára-quedas…”

Devem existir mil outras formas de buscar empregar a analogia para explicar a dor de uma despedida sem aviso, sem dar sinais de que você seria descartado em pleno voo.

Mesmo com todas  as turbulências, você foi co-piloto, contornou os perigos de atravessar muitas nuvens perigosas. Assim, ainda que exista um exagero gritante na intenção desse quote, só quem sabe como é a sensação de estar caindo e sentir as dores dos ossos sentimentais se quebrando é quem chega ao chão da realidade sem para-quedas.

 HISTÓRIAS CANSATIVAS
por A. Capibaribe Neto

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As historias de cada um, principalmente quando contadas em desabafos magoados, nascidos de mágoas disputadas, confrontos, nunca retratam imparcialidade por uma questão de autodefesa explicita ou subconsciente. Essas histórias são cansativas e se encontram ouvidos pacientes ou ombros momentaneamente solidários, são apenas bálsamos, nunca uma cura. A vida, agitada ou mansa tem os seus detalhes e retalhos de culpas cerzidas com as linhas das razões que avocamos e sem cerimônia, relegadas a pano de fundo sem cor definida.

 

“Tocando em frente”, de Almir Sater, diz bem dessas histórias em uma passagem: “Ando devagar porque já tive pressa  levo esse sorriso porque já chorei demais…  É preciso paz pra poder sorrir … É preciso a chuva para florir…  Todo mundo ama um dia e no outro vai embora … Cada um de nós compõe a sua história cada ser em si carrega o dom de ser capaz …E ser feliz…”

 

Fica bonito no tocar, no cantar, na poesia, na melodia, mas na hora de compor, de chorar contando essas histórias, mesmo que alugue a paciência alheia de um amigo deito confidente, por mais capaz que seja de descobrir e escrever as melhores palavras para o seu lamento, são sempre histórias cansativas. Que seja, que o valha. Só sabe é quem precisa arcar com o peso de arrastar a asa partida, não no acidente de um voo desastrado ou no pouso mal calculado, mas ter essa asa quebrada pela pessoa a quem deu o estilingue como mimo bobo para lembrar a manga derrubada na infância.

 

“Vai jogar hoje, não, fica aqui… Escuta o resto, falta pouco…” — Too late, o Uber chegou”. Cada um de nós precisa carregar a sua história e ter o dom de ser capaz e forte porque qualquer jogo, qualquer sorvete programado pode ser preferível a escutar uma história cansativa, como essas dos dramas de cada um.

VALEU A PENA ESPERAR
por A. Capibaribe Neto

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Depois de uma ausência longa, de certa forma cercada de lembranças confusas, ruins, finalmente o reencontro. Estava lá, no registro: 6 de novembro de 1983, um domingo. Cinquenta anos, incrível! O tempo passa e quando a gente menos espera, além da má sorte de envelhecer, tudo à volta mudou. Não podia ser diferente. Para o passar do tempo, esse tempo insignificante da vida de cada um não tem a menor importância; é coisa passageira, diferente do tempo lerdo das esperas ansiosas, quando sempre havia uma desculpa esperar. Esse tipo de tempo, aguardando que logo a trouxesse parecia não passar nunca; cada minuto tinha segundos de uma hora, mas era só ela chegar e as horas eram segundos apressados. 


— Puxa, quase não chega!
— Tanta saudade assim?
— O que você acha? Já perdemos tanto tempo com a bobice daquela briga, confusão sem motivo…
— Sem motivo? E aquela fulana, que até esqueci o nome… Ai, que ódio!
— Êpa! Vai voltar tudo? 
— É verdade, deixa pra lá. E ai, que fez nesses anos todos?
— Envelheci, mas não tive culpa…


Segui com a vida enquanto a tinha. Ela também, cada um com as suas histórias, seus começos e fins. A velha teimosia de encontrar essa tal de alma gêmea. O peso dessas histórias mal sucedidas eram como fantasmas pendurados nas paredes de quartos que mudavam de endereço, de cor, de vizinhança e de bairro, mas insistiam em assombrar, arrastando suas correntes enferrujadas lembrando retalhos de momentos bons, infelizmente vencidos pelo desencontros de ideias e preferências. Enfim, estávamos ali para conversar, trocar ideias com cuidado para não mexer nas feridas. 

 

Pouco mudei meus hábitos, meus gostos, meus vinhos, músicas. Para ela, tanto fazia e não me incomodava. Os problemas foram outros e as soluções vieram; diferentes para a paz de cada um, mas trouxeram outros e a história repetiu-se. Não convinha falar sobre o que deu errado na contabilidade do tempo que nos punha à vista depois de tanto anos. O saldo para o futuro de cada um era incerto. A única certeza era a do passado, onde fomos apaixonados e acreditamos nas juras e promessas não cumpridas. Naquele momento, o melhor a fazer era deixar fora dos olhos e do coração, as bagagens do passado.

 

Afinal de contas, teria pouca valia e no mínimo, só serviria  para disputar os débitos das culpas. Melhor focar nos créditos das coisas boas. E foi assim, focando nos créditos, que vimos a madrugada curiosa nos avisar quer estava na hora de ir embora. Estávamos rindo, com os mesmos sorrisos das paixões adormecidas e o melhor, sem nos darmos conta, de mãos dadas, feito namorados com as mãos enrugadas…
valeu, querido!

Orient Express de um novo amanhã
por A. Capibaribe Neto

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TENHO um lugar reservado no Orient Express, mas o Orient Express ainda não sabe. Vai ver porque não paguei ainda, mas na minha imaginação o vagão e o assento estão marcados. E na janela. Quero ver as paisagens correndo lá fora e as paisagens só vendo o trem passar. Para quem não sabe, a rota do Orient Express começa em Paris, atravessa a Europa através de Strasbourg, Munique, Viena, Budapeste, Bucareste, antes de chegar a Istambul. São seis dias de sonho… Tenho uma coleção imensa das paisagens que vi da janela… nos meus sonhos.

 

A vida de quem sonha é cheia de fantasias porque a imaginação voa livre enquanto viajo nesse trem, mas até sonhos carecem de tempo e o tempo passa rápido nesse trem Express que vai até os confins do Oriente. Daqui a pouco vou pegar meu trem, tenho hora, o tempo ficou pouco e não importa, pouco ou muito o tempo não espera por ninguém, que nem as marés. Logo Paris ficará para trás e mais perto de Istambul, embora ainda esteja longe. Já estive em outro trem, em outra viagem até receber uma mensagem: “Sou extremamente grata a você, por muitos momentos da nossa vida, mas estou doente. Meu corpo esta doente. Minha mente está doente, minha tristeza e essa angústia me adoecem dia após dia.  Sempre lhe falei, mas vc não acreditou. 


Nossa visao da vida, nossa maneira de lidar com tudo, sempre foi muito diferente. Não posso e não devo continuar me autodestruindo para me adaptar ao que você pensa da vida, sua visão de mundo, mas preciso descer desse trem na próxima estação para que possamos criar um pouco de calma e felicidade…” Entendi, você achou bonita a mensagem que uma moça magoada escreveu e publicou no Instagram, lembrando a alguém que estava abandonando, para que esse alguém não esquecesse de dar comida a um peixinho dourado…”

 

Que desculpa, a culpa foi da tua paixão pelo Lula. Eu vou mesmo, vou seguir em frente e quando chegar a Istambul vou pegar outro trem e seguirei para outro destino, mais distante ainda, sem olhar para trás. Fazia tempo que as nossas luzes se apagam em quartos diferentes em camas de um calor só. A vida, minha querida, não dá uma segunda chance. Eu sempre sonhei com o Oriente e talvez esse ainda esteja perto. Precisamos de mais lonjura um do outro até onde ficar muito difícil voltar. O Orient Express sempre foi um sonho, lembra? Chegamos a sonhar juntos, mas concordo que deves descer mesmo na próxima estação, de onde partirá teu trem com destino ao teu novo amanhã, em Istambul ou mais adiante…

 O TERRÍVEL POIS ENTÃO, TÁ!
por A. Capibaribe Neto

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OS RISCOS que envolvem um relacionamento começam no olhar e o “match” acontece logo após as primeiras perguntas por coincidências e afinidades encontradas, além da atração física, sejamos sinceros.

A superficialidade do visual tem muito peso no somatório dos quesitos dessa atração. Sobre quem é a pessoa, o que faz da vida, os planos para o futuro, a família, os amigos, tudo isso e muito mais só aparecerá no decorrer da aceitação do “chegar perto” no encontro marcado. Com o passar dos dias, das mensagens, dos telefonemas sem fim e do fogo que acende o estopim das bombas hormonais do casal, como a testosterona do homem, enquanto nas mulheres os principais hormônios sexuais são o estrógeno e a progesterona, que remetem à questão que suscita a afirmação da frase “deu química” - ninguém discute.

 

E é nesse contexto onde predominam as flores da máxima de que no começo tudo são flores e diminutivos que beiram o ridículo onde cabem os ciúmes e outras bobices. Meu “neném”, meu “docinho”, princesa, amorzinho, “meu gostoso” e os “quem é aquele cara?”; “que intimidade foi aquela” e dezenas de outros mais. Depois, tem os presentinhos, as comemorações, as viagens de fim de semana, a intimidade para ir dormir na casa da “sogra” de ocasião e detalhes que não acabam. É com tudo isso que se constrói uma história de amor, uma caixinha de lembranças vai crescendo, arquivos eletrônicos se enchem de selfies e se espalham pelas redes, marcando terreno, oficializando informações tipo, em um relacionamento sério, namorando, noiva, casada.

 

Daquele match ao casados, foi uma longa história, às vezes nem tão longa assim e muitas, irresponsavelmente rápidas demais. Faz parte. Um dia — nunca planejado ou imaginado, o match que foi crush acaba em um crash e tudo se espatifa como um vaso jogado no chão. E aí, cada um vai para seu lado, fazendo um desconfortável caminho de volta, um dos dois mais machucado, ruminando arrependimentos sem conserto e enfim, “vida que segue”; às vezes, bem depressa.

É nesse ponto, por essa nova estrada, caminhando para novas tentativas de matches que vez por outra as melhores lembranças fustigam certas saudades, incomodam o sono, dá vontade de ligar com a desculpa de “só para saber se está tudo bem com você”. O orgulho pode responder “estou ótima” e o outro orgulho, despeitado, responder “que bom, fico feliz!” Mentira! E o pior é escutar “pois então, tá…!”
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Consumatum est no choque

de uma decisão unilateral
por A. Capibaribe Neto

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Cada ser humano é um universo em miniatura e único; mais único que uma impressão digital e é formado em média, por cerca de 37 trilhões de células — e ainda estamos em meio a uma jornada revolucionária para entender o que faz cada uma delas. Só no cérebro, existem de 80 a 100 bilhões de células nervosas e é aqui nesse “departamento” que está o controle e administração de todo o resto.  

 

É muito poder para uma única decisão envolta por razões, motivos ou desculpas e sempre muita emoção, que é uma reação a um estímulo ambiental e cognitivo que produz tanto experiências subjetivas, quanto alterações neurobiológicas significativas e está associada ao temperamento, personalidade e motivações tanto reais quanto subjetivas.

 

Uma mudança de direção assim mexe com cada uma dessas bilhões de células. Em uma fração de segundo essas células se tornam cúmplices e podem apertar o botão liga/desliga ou delete/bloquear e para que é o alvo de uma decisão unilateral assim, fica do lado de fora e a porta só abre pelo lado de dentro. Insistir em entrar, além de chato é constrangedor. É preciso um mínimo de dignidade — com a qual não se deve negociar e aceitar a “demissão” sentimental, onde geralmente é alegada uma “justa causa” sem nenhum direito a explicações, desculpas, perdão. Nada.

 

Acabou, fim, kaput, the end, bye-bye!  Mais claro? Nem desenhando. Uma decisão unilateral, onde uma parte fica literalmente de fora do “daí pra frente”, é um choque, sem dúvida. Fica tudo confuso e no escuro e é provável que não exista nesse espaço cheio de passado, espalhado pelo chão, nas paredes, em cima da cama, nem uma só luzinha para onde se aponte o controle remoto da realidade, nua e crua, para ligar o Netflix ou o que o valha. Uma decisão unilateral é cruel, perversa, mas existe culpa na burrice que cegou e impediu enxergar as pequenas mudanças e perceber que em algum momento o beijo ficou mais rápido e sumiu um gemido que seja. Aí, um dia, aparentemente sem motivo: CLIC!

 

Acabou! Todas as 80 ou 100 bilhões de células, só no cérebro, foram unânimes. A pessoa perdeu o chão quando a luz apagou e tiraram a escada e você ali, segurando no pincel. O remédio – aliás, o único – é esperar pelo advento de um novo dia e reunir forças, caminhar em direção ao nascer do sol, respirar fundo porque é vida que segue. A sua, principalmente… “Consumatum est!”

CHAMANDO O UBER URGENTE

por A. Capibaribe Neto

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FIM DE TARDE de junho, dali a pouco a Lua cheia esplenderia majestática. Ele – ele quem? – não vem ao caso, um ele qualquer – resolveu degustar um vinho simples, aproveitar o branco leve que estava ali, na geladeira, convidativo. Arrumou depressa a mesinha encostada da janela de frente para os nascentes comuns de Sol e Lua. Pediria um delivery do Soho umas trouxinha de camarão e um combinado com fartas unidades. O vinho branco cairia bem ou o Sakê original, japonês mesmo, gelado no freezer. Ele, o mesmo ele, era metido a besta, cheio de boas escolhas.

 

Acontece que todo cara de bom gosto às vezes tropeça quando quer experimentar companhias extravagantes fora das quatro linhas. Um tal de Tinder aguçou a curiosidade dele – o ainda ele do começo – e viu que se tratava de um site para marcar encontros aleatórios entre pessoas com perfis que coincidissem nas informações fantasiosas e depois de um “match”, o enfrentar a realidade de cada um pode acontecer. Seria um encontro para curtir a Lua, ao som discreto de sua seleção de clássicos como fundo. Deu “match” com Orlenne, que lhe pareceu interessante, não para outros propósitos.

 

Ele – ainda o mesmo, era respeitador e sem quintas intenções – pode crer, não era dessas coisas. Queria dividir o vinho, o lusco-fusco, a apresentação da Lua no céu limpo, o sushi e as músicas clássicas que se sucediam. Swan Lake, de Piotr Ilitch Tchaikovski, Suite Bergamasque L75:Clair de Lune, de Claude Debussy, An der schönen blauen Donau (Danubio Azul), de Johann Strauss e por ai. Quando a campainha tocou, estava na introdução do Bolero de Maurice Ravel…
— Olá, eu sou a Orlenne, prazer!
— Prazer, entre…
Os primeiros acordes, quase inaudíveis da abertura do Bolero deixou Orlenne com olhar espantado.
— Vixe! — morreu alguém aqui?
Mas à proporção que o crescendo do Bolero chegou a ela, depois do “vixe” que não combinou com o “match” do Tinder, ele perguntou:
— Como, “morreu alguém?” E aí, ele foi cuidando de acender todas as luzes da sala e apagar as velas do castiçal..
— Esse ambiente e essa música parece coisa de enterro…
O vinho devia estar esquentando no freezer.
— Que tipo de música você gosta? Ele perguntou.
— Você tem Modo Turbo? Descontrolada? “Ameianoite”, do Pabblo Vittar? Foi um choque pra ele e faltava pouco para a Lua aparecer. O Ravel continuava firme. Foi quando ele pediu licença para fazer uma ligação. Enquento isso, o interfone tocou. Não era o delivery ainda.
— Orlenne, seu Uber chegou!
— Vixe, eu não pedi Uber…
— Foi o Pabblo que pediu pra você, venha, eu lhe acompanho. Desceu com ela, abriu a porta do Uber Hyundai e aproveitou para receber o Sushi que estava acabando de chegar.
Subiu a tempo de ver o nascer da Lua enquanto abria a garrafa  do vinho, comia a primeira trouxinha de camarão e ria discretamente desse Tinder Vittar. Foto: Adriane L.

ALEGRIA

por A. Capibaribe Neto

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(Texto de A Capibaribe Neto, inspirado na letra de ALEGRIA - Circ de Soleil)

 

Sim, alegria, sim; não porque me acostumei a essa ausência que me apertou feio todo dia, toda noite, sem dar folga, sem pena. Alegria porque já vejo mais claro e sem os olhos embaçados com a desculpa de cuscos que nunca existiram.

 

Alegria, finalmente, pela luz que eu sabia existir no final do túnel, onde carpem os ingênuos contumazes que teimam em  acreditar que "dessa vez encontrou o amor da sua vida". Alegria porque calei o grito de "alegria" com que alardeei "felicidade" enquanto fazia o caminho até o ponto de encontro. Troquei pelo pensamento que ensinou como é a realidade dos atalhos, principalmente nos desvios ou nas vielas, os becos sem saida.

 

Alegria, sim, porque assumi a culpa da euforia apressada de amar. Pareceu bela a tristeza dessa raiva pela despedida traiçoeira. Não adiantou culpar a onda de expectativas a cada advento de um dia aqui e outro... sem saber se aconteceria. Alegria porque deixei rugir sem peia a raiva, o quase ódio pela tristeza bonita em que vi o consolo na coleção de frases "vem, que delicinha, isso, não para, bebe na minha boca...". Que raiva foi essa, de amar, que virou rugido nos pesadelos!


Alegria, sim pela luz que iluminou o vazio e mostrou a porta de saída para a vida que sempre continua do lado de fora, avisando com ironia "vida que segue!" Existe um circo na rua, nas praças e o palhaço grita ALEGRIA!  

 

Hoje tem espetáculo, o show precisa continuar e continua mesmo. Alegria louca porque a tristeza, igualmente louca, acalmou como a raiva da onda que se rende ao rochedo ou se desfaz humilde na areia. Alegria por estar preparado para novos assaltos de felicidade. Alegria, sim, pela força e pela coragem de desejar a ela uma ALEGRIA ainda maior e felicidade como a que vi nos meus braços. Eu fui feliz, aqueles foram momentos meus. ALEGRIA!

Quando os cinquenta tons de uma fantasia

desaparecem de repente
por A. Capibaribe Neto

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Uma das vantagens de um sonhador é que ele é o mago dos pincéis, senhor de todas as cores, tons e meios tons. Tem seu próprio arco-íris e consegue pinta-lo à noite, madrugada ainda sem luz nas imensas telas da sua imaginação. Ah, a imaginação! Campo fértil e farto por onde pode caminhar devagar e correr, contra e a favor do vento ou lento como as brisas perto ou longe do mar. Às vezes, uma palavra solta, perdida, para justificar uma escolha, desistência apressada e logo depois revista: “intempestivamente escolhi” e o repensar, como quem escuta um grito do que estava escrito.

 

Sobre a tela transparente de um nada improvável ou previsto, possível, o que seja. De repente, A., aqui perto, longe, muito longe, ainda sem forma, sem rosto, sem som, assumindo tudo de… Adaline, a mulher que nunca existiu na minha vida, mas que sempre andei à procura e com quem criei mil cores e todos os matizes e tons que preenchiam os sonhos de amores perfeitos. Depois, os sons, até “quero ouvir a tua voz…”, mas aí as vozes já estavam mornas, eram quase gemidos." 


O sonhador viaja livre, sem peias, vai ao de quer e bem entender até sentir materializar-se diante de si o que nunca imaginou que existisse e daí em diante, sentir perder o controle, como se duas correntes de vento se encontrassem, vindas de longe, de outras paragens sentimentais, resquícios das abas de furacões que destruiram os sonhos e as fantasias de cada um. E depois, com as mesmas cores do primeiro quadro e todos os tons, acabou…

 

Foi assim, como na música, “Foi assim, como um resto de sol no mar, como a brisa da preamar, nós chegamos ao fim, foi assim (mesmo) quando a flor ao luar se deu, quando o mundo era quase meu, (intempestivamente)tu te foste de mim e foi tão rapidamente que nem escutastes mais quando eu gritei, perdido, confuso  “volta meu bem” e quando o silêncio parece gritar que não tem volta. É justo quando sobre a tela e o cobertor que aceitaram todos os tons, bem mais que os cinquenta de outras histórias e não vi mais nada…

MEA CULPA, MEA CULPA, MEA MAXIMA CULPA
por A. Capibaribe Neto

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Quando Carpe Diem é pouco demais

 

Certas músicas, mesmo sem letra, me fazem passear, viajar sem sair do lugar, encontrar-me com emoções vividas e outras, que queria muito tê-las vivido, mas se foram em sonhos, fantasias… Nem mesmo sei explicar. Estava vendo um filme, protagonizado pela Jennifer Lopez, exibido em 2001, quando um blue, me chamou a atenção: Nature Boy! Fui pesquisar a letra e me encontrei em algumas passagens da canção triste: “Havia um menino...Um menino encantado, mas muito estranho. Dizem que ele vagou muito, muito longe, sobre terra e mar. Ele era um pouco tímido e tinha os olhos tristes…”


E então um dia, um dia mágico, ele passou por mim e enquanto falávamos de muitas coisas, ele me disse, “ – a melhor coisa que você aprenderá e deverá por em prática  é amar e ser amado..." E lembrei, assim, de repente, que depois de muito tempo, de muitas histórias, de coleções de “para sempre” curtos e outros com mais esperança de serem levados mais a sério, depois de haver cansado, desisti.


Mergulhei nas gavetas e caixas de lembranças que perderam o sentido e aí, “ por mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa” cedi à miragem de um sonho intempestivo. Nem esperava, nem acreditei quando depois de um encontro nas nuvens, de ver pegadas em terras por onde deixei rastros em uma das fugas às realidades impostas, sempre por mea culpa, ali estava, quase em pele macia e perfume, a mulher que criei para amar escondido. Sonhos não duram a vida inteira, principalmente se são bons, se nos dão a sensação de felicidade e alegria no corpo e na alma. “Carpe diem”, ela sentenciou.


Também carregava as suas histórias e as suas mochilas de lágrimas e reveses e reveses sempre são embalados em descrenças que refaçam esperanças para reviver vestidos longos e votos de “até que a morte nos separe…” e como, aceitar as dúvidas sinceras, confessadas ali, nos olhos e na tristeza que precisou prometer não mais que um dia de cada vez? Eu precisava de um pouco mais de eternidade, mesmo que pouquinha coisa, um quase nada, mas que desse tempo para chamá-la de meu amor.


Senti falta de sentir falta de pequenas esperanças, de acreditar que o ontem passageiro podia ligar-se ao dia seguinte, um novo dia, uma promessa de um novo encontro sem a fragilidade explícita desse “carpe diem” a que ela se apegava irredutível. Aqueles perto vez por outra não faziam sentido para o enorme vazio carente de abraços e beijos sem um convite para qualquer depois, fosse quando fosse, mas sem a amargura de saber que “carpe diem” podia nunca mais acontecer. Acho que vou continuar o menino grande de olhos tristes, por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa porque um dia de cada vez é pouco demais…

PRESENÇA INDESEJÁVEL 
por A. Capibaribe Neto

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AO LONGO DE MUITOS anos, nesses últimos anos, quando tudo não eram assim, tão flores, mas ainda não tinha ficado ruim, haviam as festas, os salões cheios de glamour, as conversas divertidas – outras nem tanto, as fofocas saudáveis, divertidas e até mesmo os fuxicos dos inconvenientes, as luzes brilhavam. Festas de quinze anos de princesas que desabrochavam, de outras, sonsas, já desabrochadas; casamentos pomposos, festas só por festejar mesmo, inaugurações, lançamentos, em todas, haviam os convidados especiais, os destaques, homenageados e os que faltavam por motivos com desculpas quaisquer depois justificadas. Seguindo “pari passu” com o caminhar do tempo e a certeza de tudo tem um começo, um meio e um fim, mesmo que em alguns eventos exista a prorrogação, um minuto de tolerância, um atraso, tudo faz parte…


Retomando… nesses tempos, reuníamo-nos em volta de divertida mesa, sempre reservado – fosse no restaurante do simpático João do Bacalhau e depois que ele voltou para seu país, mudamo-nos para um seu vizinho, de bons garçons e excelentes cozinheiros, mas de dona antipática. Ali, Edilmar Norões, Francisco Ribeiro, Edison Silva, Pádua Lopes e eu, degustávamos bons vinhos até à saideira. Envaidecia-nos as insinuações de amigos pessoais de vários dos contumazes, para fazerem parte das nossas alegrias.

 

Tudo na vida, repito, tem seu começo, meio e fim e a vida, como bem sabemos, é um jogo de cartas marcadas: nascer, crescer, fazer bons amigos e colegas de trabalho e de repente, aceitar, sem direito a protestar, a visita de ausências. Por mais paradoxo que seja, o derradeiro capítulo dessa sequência lógica é a presença das ausências sentidas.

 

Há alguns anos, diante de uma cadeira vazia, colocamos uma taça para fazer um brinde ao Edilmar Norões que foi chamado para responder às mudas interpelações divinas. No meio desta semana, sentamo-nos, Edisin Silva e eu, para fazer um brinde silencioso ao Wilson Ibiapina, nosso amigo e colega do Sistema Verdes Mares, diante da presença de sua ausência indesejável.

TUDO JÁ ESTAVA PREVISTO DESDE O BIG BANG
por A. Capibaribe Neto

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Reflita aqui… você sentado à mesa de um restaurante, de um café ou em uma recepção, festa, o que seja. Concentre-se na porta de entrada e observe. Chega uma pessoa. Coisa simples, sem importância aparente. Engano seu. Tudo tem importância e faz parte de um todo universal e além. Desde a criação do universo, esse momento, inclusive o fato de você estar presente nesse contexto e a chegada dessa pessoa que voltou para pegar o celular, também estava prevista e tanto estava que aconteceu. A orquestração desse fato, assim como trilhões de outros, estava prevista.

 

A partir do preciso momento em que cada uma dessas coisas aconteceram, não podem mais deixar de ter acontecido. Ponto e não tem volta. Você pode mudar o foco e concentrar-se em outra coisa ou pessoa, mas também estava previsto. A pessoa que entrou pode dar meia volta e ir pegar algo que deixou no carro ou no Uber. Ela voltará calmamente se achar que foi no carro.

 

Ninguém sobrevive sem o apêndice eletrônico, convenhamos. Mas se se der conta que esqueceu no carro de aplicativo, mostrar-se-á assustado e voltará correndo com cara de desespero. O Uber já foi embora e o motorista não a viu correndo pela rua, agitando os braços. Esse ridículo desespero estava previsto. E nem viu o desespero dessa pessoa porque mudou a visão e o foco. Tudo estava absolutamente previsto.

 

Mas você ali, olhando para o relógio, vendo que a pessoa por quem está esperando está atrasada e não tem a menor ideia do que possa ter ocasionado o atraso dela que já passa de meia hora. A pessoa pode ainda estar em casa, mergulhada em dúvidas sobre o que vai usar, se deve ou não usar uma calcinha para não marcar no vestido justo, qual a joia, o perfume, pois são tantas as coisas das quais depende a pontualidade dessa criação sublime e perfeita do mundo: a mulher por quem você está esperando.

 

O atraso estava pontualmente previsto; a sua espera também. Nada pode mudar o quanto ainda vai durar esse atraso porque ele está em andamento, acontecendo, como previsto. Sua ansiedade também está em andamento e só aumenta porque o telefone da pessoa não atende. Tudo isso e trilhões de bilhões de outras coisas no mundo inteiro e na vastidão incomensurável do universo estão acontecendo, fração de segundo - uma após a outra, como previsto, para a satisfação pessoal do Criador de todas as coisas, no caso, Deus!

 

A partir desse Big Bang contínuo, desde antes do primeiro Big Bang - se é que aconteceu mesmo, tudo, absolutamente tudo, sem faltar uma grama ou um detalhe, já estava previsto. O que não sabemos é o que vai acontecer com o Brasil daqui a pouco, mas é melhor estar preparado, pois irá acontecer exatamente como já está previsto.

REFLEXÕES EM CIMA DE QUOTES

por A. Capibaribe Neto

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Deve haver uma razão para assim, de repente, sem motivo aparente, essa razão urgente, num rompante e depois galopante, arrancar palavras, juntá-las em frases e dizer coisas, falar de sentimentos, de histórias, mistura-las com fantasias e permitir que o peito exploda e eu permita até a mim mesmo essas entranhas estranhas onde adormeceram sentimentos, gostares, benquerenças, paixões, vai ver e até amor — que eu não sabia mais como era. Que tenha sido, que ainda seja. “Che sarà, sarà!”


Pois bem, foi assim… foi virando uma madrugada inteira, à cata de inspiração que colhi algumas lições sintetizadas em “quites” para melhorar os pensamentos. Uma delas lembra que existem coisas que não se pode nem se deve adiar: a VIDA e a FELICIDADE! Que se deve estar atento e refletir: Ninguém nunca morreu com a picada da cobra, é o veneno que mata. Quando alguém te ofende é como uma picada, mas o ressentimento, a vontade de se vingar, a raiva, o ódio é que são o veneno dentro de você e são esses venenos que matam. Seja aquele que, quando estiver sozinho, cuide da sua mente. Quando estiver com amigos, cuide da sua língua. Quando estiver nervoso, cuide do seu temperamento.

 

Quando tiver problemas cuide das suas emoções. E quando vencer, cuide do seu ego. É de bom tom e de prudência, ser mais criterioso em acreditar mais nas pessoas. Prefira acredito nos fatos; não por falta de confiança, mas uma questão de legítima defesa. As pessoas costumam prometer, por exemplo, mas depois raramente cumprem. Aproveite para estar atento àqueles que demonstram exercitar a deselegância embutida na maldade de perguntas improprias para ganhar a atenção que uma falta de caráter não merece.

 

E não esqueça, se as pessoas te respeitam, respeite-as também. Se eles te desrespeitam, continue respeitando-os. Não deixe que as atitudes dos outros mudem as suas boas maneiras, porque a sua conduta representa o que você é, não os outros.

MULHER NUA

por A. Capibaribe Neto

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Foi a coincidência dos improváveis, dos quase impossíveis de acontecer que aconteceu: esse encontro! Em uma dessas voltas que o mundo dá, encontramo-nos no saguão do aeroporto Changi, em Singapura. Eu estava voltando de Saigon, Vietnam e estava ali para um voo de conexão: Dubai – São Paulo - Fortaleza. Ela, da Tailândia, voltando para casa, São Paulo. Tivemos uma história mal acabada… De repente, no meio do nada, na plenitude de uma coleção de ausências de tudo, vivendo um contexto confuso onde a ruptura com todos os passados que me agoniavam há anos… Ela, ali, do outro lado do mundo, na Ásia. O “delicinha” havia adormecido e mudou de endereço e, consequentemente, de nome.

 

Mais de 15 anos esperaram por esse eclodir de convergências de mundos agora tão diferentes, distantes? Que MAKTUB foi esse? Onde estava escrito? Na vastidão das surpresas beirando o impossível? Tu, eu, nós…! Que histórias, essas de cada um. Que impossibilidades possíveis foram, estavam sendo essas, no saguão de um aeroporto enorme?

 

Encontro de improváveis provando serem prováveis para contradizer lógicas? Quanto mais procurei palavras simples para me traduzir mar de emoções, mais necessitava de outras, mais complicadas para descrever e tentar entender essas equações de emoções que agora, nesse exato momento tínhamos na simbiose que nos aguardava na alça da mira de um cupido que a razão teimaria em dizer que não existe. A verdade é que estávamos ali. Eu houvera decidido ficar dois dias em Singapura e por mais incrível que pudesse parecer, ela também é nos encontramos justo no lugar onde se reservam hotéis.

 

Nós tivéramos uma história, então permiti-me a ousadia de perguntar se gostaria de dividir um quarto. Singapura é um lugar caro. “Por mim, tudo bem…” Cada um de nós havia passado por algo em nossas vidas que nos havia mudado de tal maneira que nesse momento sabíamos que jamais voltaríamos a ser quem fomos um dia. O medo de morrer, para uns, vinha do medo de viver e nós, que sempre vivemos intensamente, estávamos preparados para desafios como esse encontro e voltar a um quarto anônimo do outro lado do mundo.

 

Dispensando detalhes que não vem ao caso, ela deitou-se de lado, com os cabelos ainda molhado, com um sorriso igual ao de muitas vezes ainda juntos, sussurrou “quatro anos!” Não entendi. Estivéramos longe um do outro havia mais de dez anos. Quando perguntei “quatro anos o quê?” Ela levantou-se, foi caminhando para o banheiro, parou, silhuetada pelas luzes de lá e sem se voltar totalmente para mim disse sorrindo: “ quatro anos que eu não me sentia tão feliz!”
E fomos a prova de que o impossível pode ser vencido pelo provável…

ONDE VÃO PARAR AS DECLARAÇÕES DE AMOR 

por A. Capibaribe Neto

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Por mais que se lhes deva tentar proteger, sentimentos são intempestivos e chegam a parecer ter vontade própria. Ao se avolumarem no peito, mesmo correndo o risco da frustração, explodem. Saltam fora do peito e escapam à razão pela infantilidade da pressa. 


E aquilo que foi dito não retorna à origem, sejam quais forem as tentativas de as pegar no ar ou depois do “send” da mensagem eletrônica. Já foi! O pior é quando, quase ao mesmo tempo em que a confissão desses sentimentos já correram para os olhos de quem se lha mandou, chega um aviso: “Deixe as pessoas perderem você, em vez de tentar convence-las constantemente de seu valor. Não peça  pelo tempo de ninguém nem cobre reciprocidade pelo tempo que você as dedica ou espera que deveriam demonstrar gostar mais de você. Deixe que lhe percam, deixe que se vão.

 

Insistir exige muito de você, já chega! Você sabe que fez o seu melhor. É suficiente. É hora de deixa-los perder você. Sim, perder você. Agora, respire fundo e sinta a paz que acabou de acontecer. Mas por um segundo, expus a minha melhor declaração de amor, de benquerença e mandei tudo junto com rosas vermelhas com um cartão falando bonitas coisas de amor. E aí, onde vão parar as declarações de amor quando não deveriam ter sido feitas ou foram antes da hora? Sei lá! Fico imaginando que estarão comigo, sentado de frente para o mar, talvez de búzios ou nas Maldivas, contando as ondas. Tanto faz, já disse “Eu te amo…” e você disse que era cedo para dizer…

UMA VIDA I NTEIRA NOS DIMINUTIVOS

por A. Capibaribe Neto

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“Oi, meu amorzinho…” - era o mínimo. tinha o cafezinho, o suquinho, a comidinha, sanduichinho… E ah! tinha  a ligação no final da tarde: — “Hoje vai ter namorinho?” E tinha. Sempre tinha Também tinha o “hoje, não, meu amorzinho, sua gatinha está com dorzinha de cabeça. Eu gostava. Só não gostava da desgraça da TPM porque nunca era no diminutivo. O mau humor era enorme. O choro fazia parte do pacote e a minha proteção contra a ferinha era dormir na salinha sozinhozinho. Diminutivos cativam, viciam. E muito. Lembro que uma vez viajou pra Búzios, tinha uma casinha por lá. Foi espairecer. Estava enjoadinha, cansadinhas por conta de uns probleminhas. Não seria por muito tempo, embora a vidinha em Búzios também viciasse e distâncias são bálsamos para curar rotinazinhas. O namoradinho trabalhava para manter os diminutivinhos. De repente, o celularzinho emudeceu. As mensagenzinhas também. Evidenciou-se uma briguinha de egos sem razão. Silêncio com silêncio se paga. Quis fazer o meu silencio maiorzinho que o dela. Orgulhinho bobo. As pessoas nunca lembram como começa um amor sem diminutivos ou uma paixãozinha básica. E aí, no meio do nada, uma foto com uma legenda: “Búzios te espera junto comigo…” 


Saudadezinhas atacam quando a briga acaba. — Está fazendo o quê, amorzinho? “Vendo um filmezinho”…


Tinha um voo de promoção. Não falei muito alegando estar escrevendo um artigo para uma revista de fora. Fui direto ao aeroporto e depois de duas horas estava dentro do avião…


Menos de cinco horas depois, liguei:
— Meu amorzinho, vem me buscar…
— Como? A essa hora? E como, que história é essa de vem me buscar?
— Estou no Rio…
— Ah, meu amorzinho…! Não acredito!


Pra encurtar a história, ainda me alimentei de milhares de adjetivos, todos no diminutivo, por quase dois anos. A última vez que nos vimos foi aqui mesmo, em Fortaleza, em um supermercado de hortifruti, ela com seu novo namoradinho. Olhou-me espantada e me deu um tchauzinho…

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ASSUMINDO OS PERIGOS DAS VIELAS

por A. Capibaribe Neto

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"É muito triste quando a única pessoa que podia devolver o seu sorriso é a Pode ser, mas a essência de certas divagações postas através de aforismos não passam de gritos contidos na pretensão de desabafos disfarçados e muito pessoais. Mágoas teimosas, tristezas e frustrações são, em realidade, tão ridículas que só com ajuda de um jogo de palavras rebuscadas ou hermenêuticas sentimentais podem ganhar importância momentânea. Mas passa, porque descuido é uma falta de atenção, falta de cuidado, de contar até dez, depois é tarde.

 

Uma fração de tempo determina a direção e sem que a gente se aperceba, entrou em uma viela apenas bem decorada e só mais adiante descobre que é um beco sem saída e ao fazer o caminho de volta é que vemos as consequências e para as quais quase sempre não estávamos preparados. A cabeça não estava preparada e as respostas rápidas ou outras opções não estavam à vista. A repetição dos erros acarreta esses suspiros de surpresa com pouca valia. “Puxa, eu podia ter feito diferente e teria tanto mais a dizer …!”

 

Fingir que é forte às vezes só piora e nem pedir desculpas a si mesmo ao fazer o caminho de volta no labirinto em que se transformou o atalho que conduziu à viela…
 

A realidade mostra, sem piedade quais são as cores postas e nesse momento o preto e o branco se evidenciam e essas cores são impiedosos. Aí é quando você se dá conta de que não estava preparado para a nova caminhada. Não, não estava.
É, não estava ainda. “Havia tanto que eu poderia ter dito diferente…! Mas disse tudo errado quando entrei na viela…”

UM ENCONTRO NO OUTRO LADO DO MUNDO

por A. Capibaribe Neto

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Que o mundo é pequeno todo mundo sabe,  principalmente que se atreve a deixar rastros em paragens diferentes da 5ª Avenida, Champs Elysèes ou Piazza Navona. Muito clichê, desculpem… Então, estava aqui, comendo umas goiabinhas, como dizia Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, gozador criativo emérito, quando fiz uma pausa em não sei o quê e fui garimpar  inspiração na Internet, mais precisamente, no Facebook. Aí, vi uma foto de um lugar no Vietnam, onde já estive seis vezes. (Vocês não sabem oque estão perdendo!) 

 

A imagem foi postada por uma certa Isabeau. Nome estranho, mas depois vi que existia como personagem do filme Feitiço de Áquila. Abordei Isa, puxando conversa sobre o lugar, curiando (curiando existe, viu? Curiar, significado: ficar espiando coisas alheias) como uma mulher tão elegantemente vestida, esparramava classe em um mercado onde iguarias como escorpiões negros, besouros e outras extravagâncias eram vendidas. Mensagem vai, mensagem vem, já estávamos prestes a dizer tchau quando ela me mandou um cartão do Snoopy, personagem criado por Charles Schultz, o mesmo da turma do Charlie Brown.  

 

De repente, estávamos os três, ela, eu e o Snoopy trocando figurinhas em Da Nang, que é uma cidade costeira na região central do Vietnã conhecida pelas praias de areia branca e pela história como porto colonial francês. Ela é muito procurada como base para visitar as colinas Bà Nà, no interior, localizadas a oeste da cidade. Nessa região, a passagem Hải Vân tem vistas para a Baía de Da Nang e as montanhas Ngũ Hành Sơn, 5 afloramentos de calcário que abrigam pagodes e cavernas com santuários budistas.

 

Isabeau já havia passado por Saigon, hoje rebatizada de Ho Chi Minh City. Para não prolongar a história, segui Isa por onde passou até entrar na Tailândia, mas continuar mostrando seu êxtase com os lugares, o povo e a culinária. Cheguei a pensar que estava passeando de mãos dadas com Isa, que nos conhecíamos há anos. Imaginei passear com ela pelo rio que estava sendo testemunha do nosso encontro que nunca existiu.

 

Certas afinidades desembocam, como o Mekong, após percorrer uma extensão de 4500 quilómetros, para desaguar no mar da China Meridional, formando um delta pantanoso. Para os circunstantes aqui, pode até parecer bobice, mas tenho certeza que ninguém chegou a conhecer outra assim, no meio do nada, lá no Vietnam, começar um papo suave, trazer para a conversa o simpático Snoopy, passear pelo Mekong de barco e depois, cada um seguir seu caminho.  

 

Qual não foi a minha surpresa hoje, manhã cedo, com uma ligação: — Capibaribe, aqui e Adriane, amiga da Isabeau, ela pediu que você não a esquecesse e desligou. Agora, não sei como vou encontrar Isabeau e só me restou Snoopy…

LONGE É UM LUGAR QUE PODE EXISTIR MAIS PERTO

por A. Capibaribe Neto

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O ser humano é o único animal que tem consciência de que vai morrer e faz planos para um futuro que não lhe pertence. Digo futuro distante, mas distante pode ser longe e segundo um livro de Richard Bach, “Longe E Um Lugar Que Não Existe” — “quando eu era apenas um efebo, fuçando nas coisas da minha tia achei um pequeno livro de capa laranja, cheirando a mofo e já com as páginas amareladas. Na época, já havia ouvido falar e lido o livro Fernão Capelo gaivota, do escritor Richard Bach e, apesar da pouca idade e de não entender muito bem as profundas mensagens que o livro quis passar, achei muito bonito.

Então, ao ver que o livro que havia encontrado era do mesmo autor, comecei a ler.

 

O livro de que falo chama-se “Longe é um lugar que não existe”, e é uma curta fábula a respeito de uma menina de cinco anos chamada Rae, que convida Richard Bach para o seu aniversário e o espera confiante, mesmo sabendo que ele terá que enfrentar inúmeras dificuldades, atravessar rios e montanhas para chegar até ela.

 

Recém tive cá meu momento de Bach diferente é verdade, mas a menina que conheci possuía uma coleção de tristezas e mágoas. Essa “menina” já adulta, por medo de aumentar a coleção refugiou-se no aconchego de um urso de pelúcia. E na eternidade passageira de uma noite, ela me contou alguns capítulo da sua história, tão comum nos dias de hoje. Fez pausas, respirou fundo, enquanto eu lhe falava de um mundo onde sempre vivi, entre as estrelas. E como consegui tirá-la por um momento das suas confidências, chamei-a para dançar sobre uma nuvem. E dançamos.

De repente, estávamos de rostos colados e olhando dentro dos olhos, onde confissões são feitas em silêncio. Promessas de “para sempre tua” eu conheço, contei para ela, enquanto nos dizíamos querer que aquele momento deveria durar para sempre.

Disse-lhe que o ser humano é o único animal que tem consciência da sua finitude, mas faz planos para um futuro geralmente distante. Estávamos vivendo um sonho através da magia da imaginação. E dançamos até quase a madrugada já quase se rendendo ao amanhecer. Lamentamos não poder voltar no tempo e marcar um encontro no passado. Do futuro não tínhamos controle e ainda havíam os muros de pedra das nossas histórias quase gêmeas.

 

O medo é uma experiência que desencoraja até nos sonhos. Lembrei-me de dizer-lhe CARPE DIEM e acresci CARPE NOCTEM. Sonhos acabam e fantasias chegam ao fim. Quando ela me disse que estava cansada e precisava dormir, despediu-se mandando-me um beijo e dizendo que iria tomar banho. Não sei o que me deu na cabeça para mandar para ela um sabonete especial no dia seguinte. Mandei.

 

Os dias se passaram, falamos pouco, quase nada e ela foi lacônica quando recebeu o presente sem tanta importância:”registrando que adorei o sabonete”. Neste momento, imaginei-a no banho. E sem que eu soubesse, nesse momento estive com ela, a massagear suas costas macias. A menina está longe, muito longe e este longe existe. Estou cansado de tentar dar cores vivas, cheios de pele perto, colada, sentindo a festa dos arrepios, mas por um momento, estive com ela diante da nudez consentida nos pensamentos longe de tudo. Mas aí já é outra história.

Uma despedida

por A. Capibaribe Neto

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Querida Salete,

Ao longo de todo esse tempo de honrosa convivência aqui, neste simpático espaço do seu apreciado Blogue, experimentei manter um oasis de romantismo à sombra de palmeiras imaginárias. À minha volta, fora das quatro linhas da paz tão fustigada pelos ataques, sem canseira, de dois inimigos formidáveis: as consequências de uma pandemia e agora, como se não bastasse, o clima triste e perigoso do esgarçar - em todas as acepções desse verbo - que define o estado das bandeiras tremulando descontentes e enfurecidas.  Esse clima chegou à minha rua, à minha casa, à minha mesa. O desfiar de lembranças de histórias verdadeiras ou apenas misturadas com imaginação fértil e fantasias perdeu forças e comprometeu meu ânimo para insistir em ignorar o momento.

 

Quando você me alertou por ter saído da proposta do blogue, mesmo sem pretender misturar emoções partidárias, senti, aos poucos, fraquejar minha capacidade de alimentar o romântico que nunca deixei de ser. Não sou torcedor por nenhum dos lados violentos que partiu o país em dois, mas uma pessoa profundamente incomodada com a virulência do agitar de ideias radicais e intransigentes que colocaram amigos e familiares em campos opostos.

 

Peço-lhe licença para cuidar di romântico teimoso, mas sem ânimo para falar de abraços, beijos e outros bons avanços, por me ver cercado de tanto ódio no contexto perigoso do momento.

 Caminheiro Errante 

por A. Capibaribe Neto

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Ao longo da minha coleção de anos vividos, fui caminheiro errante, percorrendo estradas e caminhos fora das escolhas confortáveis dos passeios comuns. 

 

Certa vez, aventurei-me no norte da Africa, Agadir, nas faldas do Saara, no  Marrocos, onde procurei um guia para me levar às dunas douradas do deserto. Depois de meio dia de carro, chegamos a um acampamento de beduínos, próximo às palmeiras de um oásis. Dali, a jornada seria montado em um camelos.

 

 Eu sonhava, fazia tempo, conhecer o deserto, dormir em um oásis, como via nos filmes, fotografar um por do sol do alto de uma duna. 

 

O Saara é fascinante. O som do silêncio ali, no fim de tarde, vem com uma brisa que esfria à medida que a noite toma de conta do mar de areia. À noite alta, frio do deserto pode matar. A visão do céu estrelado é difícil de descrever. É preciso viver a experiência para sentir a importância do nada absoluto cercado de horizontes sem fim. 

 

Mal o nascente começou a se espreguiçar com o dourado das primeiras luzes do primeiro dia, Amshir se aproximou e disse: — Sahib (Sahib significa proprietário e é usado em diferentes idiomas como saudação, como nas áreas de língua indiana e paquistanesa, e significa "Senhor"), hora de ir.
 
E lá fomos nós. Amshir pouco falava francês e o meu árabe era pouco mais de nada. Afora “sabah alkhayr” (bom-dia), “shkran” (obrigado), além de “As-Salamu Alaikum” (que a paz esteja sobre vós) e “Aalaikum As-Salaam” (E sobre vós a paz – como resposta), deixei que deserto traduzisse a minha curiosidade através dos cliques das minha câmaras.

 Devíamos ter caminhado umas três horas quando pedi a Amshir, com um gesto, para pararmos. Ele me ajudou a descer do estranho animal e experimentei caminhar sobre as estrias que o vento desenhava sem parar sobre aquelas areias que logo estariam escaldantes. 

 

A beleza daquele imenso nada, o chiar dos grãos que faziam bordados únicos apagavam depressa os rastros que eu deixava. De repente, Sahib apontou para um dos muitos horizontes à nossa volta e alertou-me: – “Sahib, Sahib, regarde, la tempête de sable arrive…!” – Sahib, Sahib, tempestade de areia chegando…!

 

Depois dessa emoção e uma centena de fotos, pedi para retornarmos ao acampamento. Ainda teria um longo caminho até cruzar o Atlântico para chegar em casa. Pode parecer tolice esse passeio, mas depois de passados tantos anos e já próximo do meu ocaso, ainda tenho bem nítida na memória as minhas pegadas passageiras nas dunas do Saara, graças a Amshir…

Solidão Diferente 

por A. Capibaribe Neto

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Aprendi muitas coisas ao longo da vida. As lições estão aí, bem diante dos nossos olhos. Lições com as nossas experiências, com as vivências dos outros, com os conselhos avulsos, que não pedimos ou sugestões e até mesmo em encontros que nunca marcamos, embora já estivessem marcados pelo destino.

 

Dia desses, no meio de um assunto desagradável, escutei de uma mulher sem nenhuma culpa de ser bonita, elegante, carismática, uma queixa por não encontrar uma companhia para dividir descontraídos momentos sem terceiras intenções. Digo terceiras, porque as segundas são manjadas. 

 

Escutei poucas linhas da sua história, desde que aportou em nossa terra de muito sol que a dela não tem e no pouco tempo da nossa conversa que não tem encontrado espaço para plantar amizades. “Talvez porque você intimida, mesmo com esse seu sorriso gentil, a magia do seu rosto e a simplicidade do seu todo…” É verdade e passa longe de qualquer exagero sem as tintas daquelas intenções. 

 

Vir de longe, cheia de responsabilidades profissionais, sem parentes ou mesmo conhecidos que abram as portas nos para lugares da moda para um happy hour. É estranho que esse tipo de solidão exista, mas existe e só sabe sensação desagradável desse tipo de solidão quem por ela já passou, viveu a experiência. 

 

Eu vivi quando saí do Brasil e fui morar do outro lado do mundo. Depois de algum tempo, encontrei as portas que se abriram para mim, mas a cada vez que mudava de lugar para outras paragens, voltava a ser o mesmo alienígena sem encontrar rostos sorrindo para mim ou mãos estendidas para me dar boas vindas. Abraços? Nem pensar. 

 

Existem muitos tipos de solidão. Aquela imposta, a escolhida, a necessária; quando carecemos de um tempo para mergulhar em reflexões ou debulhar tristezas, saudades, mágoas ou ainda,assimilar e aceitar separações que não queríamos. A vida é assim.

 

Cada um de nós, repito, é que conhece a sua história e precisa apelar para o dom de ser capaz, descobrir outros horizontes, caminhos, becos ou sentar-se diante do confessionário de uma taça de vinho e sorrir sozinho. Já fiz isso. Muitas vezes. 

 

A moça bonita não me saiu da cabeça. Enquanto estava dentro de um avião, viajando para bem longe dela, olhei pela janela, a noite estava limpa, sem lua, mas com todas aquelas estrelas e em pensamento mandei uma para ela. Pode ser piegas, bobice, ela nem lembra mais de mim, mas por uma fração de tempo que comportou a visão passageira do rosto dela de sorriso meio triste, disse cá com os meus botões: “você não está sozinha nesse momento. Estou erguendo um cálice de Amarula para brindar a você e desejar que dentre as boas surpresas que seguramente lhe estão reservadas, uma já esteja acontecendo e você esteja diante de um sorriso agradável sorrindo para você".

O LENTO PROCESSO DO ESQUECIMENTO

por A. Capibaribe Neto

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Mudar o caminho, apagar um número, bloquear um nome, deletar fotografias, rasgar cartas antigas, jogar fora bilhetinhos apaixonados, tudo isso pode ajudar depois de um tempo; mas esse tempo que dizem curar tudo não é pouco. E também não é verdade. De repente, as surpresas, em um rosto que passa depressa na rua, passeia no shopping ou aparece em uma cena de filme, trazendo um furacão de lembranças. Não existe um botão liga/desliga. Não adianta forçar o sono, mergulhar em taças de vinho ou procurar em novos abraços o mesmo perfume ou o mesmo gosto em outros beijos. Às vezes, até piora.

 

Depois do cristal fino se quebrar, não tem volta no tempo, não tem conserto,  nada. As lembranças são cruéis, não perdoam, fazem cobranças magoadas, cheias de arrependimentos, pelo menos em um dos lados. Perdoar depende da capacidade de esquecer e esquecer, convenhamos, é impossível.

 

Assim como um rosto que faz lembrar, o motivo do contexto da despedida que causou as mágoas, as tristezas, que abriu feridas e essas não sararam de vez ou deixaram cicatrizes que continuam ali, lembrando com dores menores, mas ali. É fácil dizer que não se deve cultivar a raiva, o rancor, o ódio muito menos, mas é tudo discurso.

 

Mesmo com a melhor reconciliação, vez por outra, um dos dois vai dormir e se revira muito na cama e se descobre abraçado ao travesseiro com um gosto amargo na alma, um peso no peito, uma vontades gritar ou tentando disfarçar um soluço por essa dor que ficou lá atrás. “Deixa pra lá…!” – Ok, deixei, pronto. Funcionou…

 

Mentira! Deixou, nada. E o silêncio que prefere não explicar ou mente sobre estar calado? É impossível abrir mão de viver. Viver é preciso. Quando o difícil sucumbe à constatação do impossível, aceitar o definitivo é uma imposição e assumir os desafios do lento processo de esquecer é a única opção. Ontem, por exemplo, escutei uma mocinha dizer “oi, meu amorzinho…!” e aí, um flash enorme, me trouxe a fotografia falante dela abrindo a porta para mim e me abrigando no abraço ainda molhado, mal saída do banho.

A FORÇA RIDÍCULA DO DESRESPEITO

por A. Capibaribe Neto

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Diante da força avassaladora de um furacão, não existe defesa. O remédio ou consolo é esperar que ele amaine, aquiete-se aos poucos, vire uma tempestade tropical e depois vire chuva fina deixando os rastros de destruição que, de certo modo, por conta da sua contumácia previsível, assola certos lugares do planeta não surpreende. 

 

Existem forças negativas e aquelas positivas. A força do amor, por exemplo pode muito, quase tudo, vira letra de música, com essa de Celine Dion: 


“Os sussurros na manhã/De amantes dormindo apertados/Estão rolando como um trovão neste momento/Enquanto eu olho em seus olhos/Eu me seguro em seu corpo/E sinto cada movimento que você faz/Sua voz é calorosa e suave/Um amor que eu não poderia abandonar/Porque eu sou sua dama/E você é meu homem/Qualquer hora em que você procurar por mim/Eu farei tudo o que puder /Perdida é como me sinto deitada em seus braços/Quando o mundo lá fora é muito/Muito para levar/Isso tudo acaba quando eu estou com você/Mesmo que possa haver momentos/Que podem parecer que eu estou longe/Nunca fique imaginando onde eu estou/Porque eu estou sempre do seu lado/Porque eu sou sua dama/E você é meu homem/Qualquer hora em que você procurar por mim/Eu farei tudo o que puder/Nós estamos nos dirigindo pra algo/Algum lugar onde nunca estive/Algumas vezes/eu fico assustada/Mas eu estou pronta para aprender/Sobre o poder do amor…” 

 

Basta refletir sobre o que a letra da música diz para descobrir a força do amor, seja se uma mulher — principalmente, mas não menos de um homem. Ambos, capazes de coisas absurdamente malucas, tanto para agradar ou virar fera bem rápido diante de uma traição. A força das palavras, das mentiras, dos enganos, engodos, da decepção, da vingança… 

Ah, a vingança! Que mentira, essa de dizer que vingança é uma prato que se come frio! Que nada! O prato da vingança que se urde é quente, é fervida no sangue que ebule nas veias, no coração pelo fogo do ódio santo, raiva pura.

 

Nessa hora, aceita-se o olho por olho e dente por dente, vejam as unhadas, as mordidas raivosas. Feito os furacões e os rastros que deixam, as vinganças, não raciocinam. Planejam! Que seja uma analogia, colocar no mesmo cenário a força de um furacão, a força do amor e a força da vingança é que não sejamos bons samaritanos ou anjos com brincando de bons filhos de deus, dizendo, apenas dizendo, que se deve dar a outra face. 

 

Dizem que a bofetada, física ou moral, dói pra caramba! Os destroços deixados por um furacão ao longo do “passeio” de um fuçarão podem ser removidos e o lixo depois dar espaço à reconstrução, em contrapartida, os escombros sentimentais se fincam dentro do peito, são regados pela decepção que muito chora e o coração pouco dorme, descansa. Assim, principalmente, no contexto atual, aflora, sem muita surpresa, uma força capaz de separa pessoas dentro de casa, a mesma rua, no mesmo parque; a força ridícula do desrespeito.

A Intolerância Comprometendo a Amizade e o Amor

por A. Capibaribe Neto

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Seria irresponsável da parte do cronista pretender tapar o sol com uma peneira, ignorar o perigoso terreno da intolerância e fingir que o clima é ruim e a chuva que está caindo é ácida. 

A crônica da semana passada é fruto da criatividade e da imaginação do escritor. Aqui, o romantismo é bem vindo, bem sei, assim como se deve fazer uso da leveza das palavras para enlevar e entreter o leitor, a leitora.

 

No decorrer desta semana, que acaba hoje, deparei-me com um artigo, por sinal muito bem escrito, onde o autor anônimo explica, com toda propriedade, o que é ser uma pessoa de esquerda, mas não comentava ou mencionava, em nenhum momento, o que é ser de direita, deixando implícita uma preferência radical. O contexto inspirou-me pelo fato de que a direita foi ignorada. 

 

Ora, meu coração bate dentro do meu peito, do lado esquerdo, onde guardo os amigos sinceros e as boas lembranças dos amores vividos, as emoções dos abraços ardentes, beijos sem fim e muitas outras coisas mantidas em segredos convenientes, mas sou destro. É com a mão direita que escrevo, que aceno – na maioria das vezes – que afago ou bato na mesa em raiva passageira.

 

Sou normal, comum. Já me confessei como a soma de todas as minhas emoções, crenças, escolhas, pecados e erros. Sou também a soma dos arrependimentos por esses erros que, infelizmente não pude fazer um caminho de volta para desfazer a mágoa ou dor que tenha causado. Pedir desculpas ou ir mais à frente e pedir perdão nunca me diminuiu porque sempre me expliquei de cabeça erguida e olhando nos olhos do ofendido, do magoado, do que fiz chorar.

Sou um ser… humano. Forte e fraco ao mesmo tempo. “A mão que afaga é a mesma que apedreja…” - escreveu Augusto dos Anjos, que morreu há pouco mais de cem anos. 

 

Lembro dos afagos que fiz durante a cumplicidade permitida e consciente, mas não tenho lembrança de nenhuma pedra jogada, pelo contrário; voltei-me rápido para encarar o que me atirou várias pelas costas e correu com medo depois, mas por mais incrível que pareça, foram em contextos com um mínimo de civilidade, sem muito ódio, intolerância.

 

Hoje, nesse agora complicado, amizades são desfeitas, beijos são cancelados, pessoas são demitidas do coração intolerante.

 

Queria aqui estar falando de amores, contar boas histórias, aventuras, sadias irresponsabilidades e rir, até, das consequências; não todas, mas de várias, muitas, até, direi. Adorei abusar das vírgulas para enfatizar a frase na explicação, diga-se de passagem. Infelizmente, angústia-me a constatação da dificuldade de abusar de  “las palabras de amor…/Las palabras de amor/ Let me hear the words of love/ Despacito, mi amor/Love me slow and gently” do Queen, porque a intolerância reinante comprometeu as amizades, comprometeu muitos amores e o cronista não pode deixar de escrever com tristeza sobre as agonias desses momentos.

Desamor à Segunda Vista

por A. Capibaribe Neto

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Quando se conheceram em um barraca de praia, a faísca da atração física brilhou forte…  Ela, coberta de morenice sem jaça, corpo concebido em pecado com o aval divino, cheia de curvas impecáveis sem exageros nas reentrâncias ou protuberâncias, sem adjutórios estéticos — toda original — cabelos negros como a asa da graúna, lábios carnudos que de sorriso perfumado e fácil, inteligente e, o mais importante, exageradamente politizada e decidida. Em resumo: um pecado cometido pelo próprio Criador quando projetou a mulher e exagerou  na perfeição. Cearense da gema! 

 

Ele, à imagem de Apolo, que estava presente no panteão de deuses dos gregos antigos. Era considerado o deus do Sol e o deus patrono da luz, da música, da medicina, das artes, da profecia etc. Era um dos deuses mais relevantes da religião grega e era considerado um grande representante das artes, da beleza e da juventude, abdômen sutilmente trincado, isento de anabolizantes, cabelos de quase mel, braços naturalmente torneados, olhos entre o verde e o azul, quase o protótipo do primeiro homem sem costela, criado à imagem e semelhança e Deus, o próprio.

 

Pois bem, ambos alvos dessas coisas do destino, estavam sozinhos na manhã de Sol apenas morno do domingo antes das eleições.

 “Oi” - a frase curta mais comprida quando pronunciada com um sorriso cheio de intenções explícitas de desejos coincidentes. “Oi…!”, como resposta, no mesmo contexto, a porta de entrada aquiescente.

 Minutos depois, pareciam já se conhecer desde a criação do mundo e cheios de curiosidades. Era paulista, inteligente, visitante de primeira viagem e filho de pai carioca e mãe maranhense. Conversaram um monte! 

 

Ele falou que viera conhecer Jericoacoara, o paraíso onde o Grande Arquiteto do Universo fizera o esboço para criar o mundo. Falaram de tudo, menos de política e religião. Falaram de sonhos, do que pretendiam fazer de suas vidas, realizações profissionais, lugares que gostariam de visitar. Fizeram caminhada na beira da praia, pisando sem culpa nos bordados de espuma deixados por ondas mansas da primeira maré vazante.

 

 Depois, pediram água de coco quando a barraca abriu e quando o sol avisou que ia esquentar, pediram uma caipirinha e se soltaram, achando graça da coincidência do encontro e simpatia galopante, sem olhares indiscretos. 

Havia natural provocação nas curvas dela, no decote feito moldura perfeita para a paisagem simétrica dos seios dela. “Você é linda..!” — ele disse. “Você é muito bonito…”. 

A semana proporcionou telefonemas compridos, mas somente à noite. Ela trabalhava. Ele, de férias. Ele queria voltar mais vezes; ela queria conhecer Copacabana, Ipanema. Ganharia fácil da famosa Garota de lá.

 

 Aí, chegou o dia de votar. Ele, justificaria o voto e ela, iria votar no Colégio Batista. “Posso te acompanhar?” — Vou adorar, mas vou cedo, viu? É assim foi. Marcaram o encontro no pátio. Ele chegou com a bandeira do Brasil nas costas. Ela, de camisa vermelha com desenho do Lula. Esperando por eles,  vários Cavaleiros de Apocalipses antagônicos. Ela cobriu o sorriso com uma providencial máscara contra a Covid. Ele, puxou a aba do boné para baixo. Fingiram não se conhecer.

 

 O amor não tem vacina ainda para essa onda de intolerância, radicalismo e preconceito. E lá do alto, o Criador — em momento de sublime humor, ria alto e dizia para si mesmo, em um murmúrio sagrado: “… quero ver o mar pegar fogo para comer peixe cozido…!” Que é isso, meus filhos?

OS “MAKTUB’s” DA VIDA

por A. Capibaribe Neto

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Maktub é uma palavra em árabe que significa "já estava escrito" ou "tinha que acontecer”. Também foi título de obras de diversos escritores, mas a obra original, da autoria de  Malba Tahan, significa “estava escrito!” e conta como o jovem Fauzi Nalik escapou à força após pintar o retrato do Rei Mahendra ou saber o segredo do Sábio da Efelogia. São diversos contos. Apresenta lendas orientais e tem prefácio do general turco Khara Ulugberg. 

Pois bem, tenho uma coleção enorme de “MAKTUB’s” porque tudo o que me aconteceu estava realmente escrito e a prova é tanta que aconteceu. E aqui relato um deles… 

 

O ano era 1969. Eu havia saído do Brasil com mala pouca, apeei em Lisboa e depois, aproveitando um convite de amigos da juventude, segui às escuras para Roma, onde tive a dita de ter-me sido oferecida uma bolsa de estudos para estudar jornalismo na “Libera Università Internazionale degli Studi Sociale Pro Deo”, lá mesmo, em Roma. 

Ao longo da primeira semana, ainda sem me enturmar, afastei-me da turba e fui sentar-me na grama do imenso jardim, perto de um fonte e fiquei ali, pensativo. De repente, aproximou-se de mim uma bela jovem romana, muito simpática e perguntou se podia me fazer companhia.

 

 “Ciao, posso?” Você é de onde? Respondi que era brasileiro, de Fortaleza, no Nordeste do Brasil, à beira do mar verde do Atlântico. “Estava olhando você de longe e a sua tristeza me chamou a atenção. Que aconteceu? Posso ajudar?” — Não, não estou triste, é saudade…! Que significa saudade?  – quis saber Laura, Laura Sensi, era esse seu nome. Tentei explicar o que era saudade e ela aceitou como sendo nostalgia. Havia melancolia como sinônimo, que é uma tristeza profunda causada em uma pessoa longe de sua terra natal. Este introito serve apenas para explicar um dos mais importantes e marcantes desses MAKTUB’s da minha vida.

 

 Continuando… semanas depois, ficamos mais próximos, começamos a namorar e, para passar a fita bem depressa, ficamos noivos. Quando fiz planos para trazê-la comigo para morar no Brasil, despertei a águia que era a mãe dessa filha única e não aceitava ter a filha carregada para o outro lado do enorme oceano. A vida virou um caos de desentendimentos e a águia astuta conseguiu fazer com que Laura desfizesse o compromisso, devolvendo o anel que lhe havia dado para selar minhas intenções. O anel foi parar no fundo do rio Tevere (Tibre). 

 

Na noite desse mesmo dia, fui à via Vêneto, onde ficava uma agência da Varig, perguntei pelo primeiro voo para o Brasil e fui informado que seria à meia-noite. Nem fui fechar a modesta conta em liras, que tinha na Banca d’Italia, deixei roupa estendida, livros da faculdade, meus rastros ali mesmo, onde morava, Via dei Portoghesi, 2, bem ao lado da Igreja de Santo Antônio dos Portugueses.


Na manhã do dia seguinte, estava de volta ao Brasil porque assim estava escrito.

 “Perduto ” - uma música de Ornela Vanoni,  conta o que foi uma parte da minha história…

 

“Eu posso esquecer-te/seguindo a rota de um pássaro mudo/Eu posso juntar-me a gente diferente que você não conhece/Posso preencher-me com amores superficiais que nunca quis…/E depois, à noite, sentir-me morrer/E por orgulho não lhe pedir ajuda…/Posso tentar lhe esquecer/Passando horas contando os dedos/Posso me cansar o dia inteiro/E chegar de noite mais morto que vivo/E depois, na minha cama, confundir os sonhos/Com o vermelho do vinho…” Estava escrito, está escrito é assim será. MAKTUB!

A DIFÍCIL HORA DA DESPEDIDA

por A. Capibaribe Neto

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A IGNORÂNCIA DO CIÚME 

por A. Capibaribe Neto

O ser humano, já aludi, é o único animal que tem consciência de que vai morrer e faz planos para um futuro que não lhe pertence. Tudo na vida — inclusive a própria vida de todos os seres animados — tem um começo, um meio e um fim e nada ou ninguém pode fugir dessa finitude.

 

 Assim, quanto mais nos damos conta do peso da bagagem de tempo acumulado, mesmo que se tenha cuidado da saúde, física e mental, o momento de passar a régua e fechar a conta não nos pertence. Vida eterna não existe. Não existe remédio, nem fórmula mágica, nada. Ninguém consegue fugir do passar do tempo e nesse tempo não se pode pretender retroagir um segundo sequer. Nada. 

 

O tempo é linear, segue em frente… Pra onde, ninguém sabe. O daqui a pouco não é mesmo nem uma suposição. Tem-se que esperar. O que vier não deixa de ser uma surpresa. 

 

Enfim… Cada um de nós é a soma de tudo o que fez; de bom e de ruim. Arrependimentos pouco contam, mesmo porque de nada adiantam. Tenho, confesso, um monte deles e cada causa teve um custo muito difícil de saldar. Os juros são altíssimos. Assumir culpas tem um limite. Não se pode ou deve diminuir ou aumentar o drama do tamanho dessa ou dessas culpas para valorizar humildade. Pouca valia! Tudo é e tem a medida do mal ou dos males compartilhados; para tanto, houve cumplicidade e pronto.

 

Assim, confesso, no meio dessa semana, meio da madrugada, ainda faltando alguma coisa antes do sol entrar pela minha janela, que dei-me conta de que a minha conta de tempo está alta. Consumi da melhor forma que achei; melhor dizendo, em alguns momentos fui perdulário, gastador sem poder e sem dever ter sido.

 

Continuando, porque tenho pressa, não sei o quanto me sobrará. Enfim, repito, sem fazer drama, assumo que está na hora de fazer as malas, preparar uma saída à francesa para muitos e encontrar o melhor momento para dar um abraço em cada um dos poucos amigos que enriqueceram e enfeitaram a palavra amizade. Pode parecer meio chato assumir, mas já são muitos os amigos que me surpreenderam com as suas ausências quando eu menos esperei.

A IGNORÂNCIA DO CIÚME 

por A. Capibaribe Neto

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A melhor liberdade é quando se pode escolher ficar preso a alguém, mas isso não significa, necessariamente, que a reciprocidade seja uma obrigação. Prender-se a uma pessoa sentimentalmente é uma decisão unilateral, é uma escolha. A felicidade que enseja esse gesto é gestada no interior da alma, onde moram as melhores emoções. 

 

Ninguém faz o outro feliz. A felicidade é uma sensação muito particular, pessoal, vem de dentro pra fora; nunca de fora pra dentro. Cada metade desse todo é indivisível e a sua grandeza está na escolha, é descoberta de cada um dos detalhes que nasceu sem avisar, sem que se planeje ou adivinhe que ia acontecer.

 

 Um dia, assim, de repente, você encontra o que passou a se convencionar como “alma gêmea; que de gêmea não tem nada, mas o encontro de preferências nas coincidências de escolhas, de confissões, febres e vontades, desejos. 

É bom quando acontece. As pessoas geralmente não lembram quando aconteceu, mas seguramente nunca esquecem quando o encanto acaba e o estar perde a graça do ficar. Nunca esse momento é coincidente…

 

 Como na letra de uma música antiga, sempre existe um que fica chorando porque não era mais bem vindo para seguir junto ou permanecer no aconchego de dormir de conchinha. O quebrar do encanto é sempre ou quase sempre um mistério, um segredo que geralmente envolve o encanto por outro olhar quando o canto de uma sereia ou “sereio” invade o privado, o pessoal, aquele espaço prometido tipo “pra sempre”. Isso não existe. É ilusão. Todo para sempre sempre acaba e quando acaba, dói pra caramba.

 

Devia parar aí, pronto, mas nem sempre é assim. Aliás, dificilmente a outra parte aceita o “acabou”, o “descurtir” e não importa o motivo. 

 

Existem aqueles que aceitam a humilhação da convivência oportuna com as desculpas ou apenas uma delas “ruim com ele/ela, pior sem…" Que tristeza, que declínio moral! E o que poderia ser civilizado, consensual, vira terra fértil para plantar as agonias crescentes dessa separação onde o inconformismo se alimenta de raiva, ódio santo, mortal.

 

Sim, mortal, como vemos com tanta frequência nas crônicas policiais. Que tempos, esses que estamos vivendo, onde mesmo com a quantidade enorme de alternativas, tanto para um quanto para o outro, a irracionalidade leva um ser — que deveria ser humano, se transforma em um animal predador cheio de impulsos absurdos e se arvora de proprietário da outra metade do que foi o amor que deixou de ser passa a se alimentar, se deixar invadir pela ignorância um ciúme mortal.

Literalmente. A fila anda, minha gente. O show da vida não pode parar…

O SILÊNCIO NO CASTELO DA RAINHA

por A. Capibaribe Neto

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Tudo leva a crer que a rainha Elizabeth II adormeceu em paz desde cedo. No dia anterior, seus familiares já haviam sido convocados para participar do ritual da sua passagem. Seus súditos foram cuidadosamente preparados para a notícia do desenlace.

 

Seriamente afetada pela morte do marido e sofrendo as consequências de ter sido contaminada pela Covid, Sua Majestade se viu cada dia mais debilitada, mas perfeitamente lúcida. O peso de 96 anos era um fardo difícil de carregar.

 

Primeiro, noticiou-se que a rainha estava sob cuidados médicos e esses se mostravam preocupados; em seguida, veio a informação de que os filhos estavam se dirigindo ao castelo de verão da rainha. Era o pior sinal do que já havia acontecido. Era preciso que todos estivessem juntos, principalmente o filho Charles, seu sucessor. O “a rainha morreu, viva o rei!” precisava ser anunciado. E foi. Fez-se silêncio no castelo de verão e a realeza, ali presente, respeitosamente contrita, experimentou o frio ritual da ausência definitiva.

 

 Quilômetros distantes dali, no outro castelo, o de Buckingham, a bandeira da Inglaterra foi baixada a meio pau. A rainha estava morta e já havia o rei sucessor. Sem o carisma da mãe, tendo caído na antipatia dos súditos, principalmente por haver traído a eterna princesa Diana e assumido o romance da paixão adolescente, com a duquesa da Cornualha, Camila Parker, Charles assumiu-se Charles III e logo será coroado Rei.

 

As matérias que encheram os noticiários, mundo afora, mostravam a rainha que sempre foi majestade desde criança e que foi dotada de beleza ímpar e sorriso contagiante desde a adolescência. Faz pouco, seu príncipe encantado foi na frente para preparar a festa no paraíso encantado da eternidade para recebê-la e continuar suas histórias de amor.

 Pode parecer frio falar da morte de uma rainha e ser piegas ao mesmo tempo sobre o castelo no céu, mas não é assim que se conta uma história de conto de fadas? 

 

A Inglaterra tem novo rei; não podia ser diferente, embora muitos súditos desse reinado não veem mais sentido em uma monarquia em pleno século XXI. Que discordem, mas quem foi rainha, como a monarca Elizabeth II, bem como a Princesa Diana, nunca perdem o encanto da majestade. 

O peso do silêncio no castelo de verão foi a prova maior da importância da ausência de Elizabeth II.

O fim do livre arbítrio-

a morte sempre surpreende os que são jovens

por A. Capibaribe Neto

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A atriz e modelo sul-africana Charlbi Dean, que atuou no filme "Triangle of Sadness", vencedor da Palma de Ouro em Cannes, morreu ontem em Nova York, aos 32 anos, vítima de uma doença repentina, que à falta de detalhes para preencher a curiosidade dos fãs, pode ser vista como um eufemismo; palavra, locução ou acepção mais agradável, de que se lança mão para suavizar ou minimizar o peso conotador de outra palavra, menos agradável ou mais grosseira.

 

Na filmografia da atriz, constam filmes como, “Triangle of Sadness” – Triângulo da Tristeza, onde interpretou a top model e influenciadora "Yaya", obcecada por sua imagem e sua carreira e podia mesmo ser, de tão linda que era, desde que nasceu em 5 de fevereiro de 1990, na Cidade do Cabo, África do Sul, pois já começou a trabalhar como modelo aos 6 anos, antes de iniciar a carreira de atriz, aos 20 anos. 

 

Em 2017, Charlbi atuou no filme de terror americano "Don't Sleep", e, no ano seguinte, em "Entrevista com Deus". Interessante, o título desses filmes! Chamou-nos a atenção a coincidência desses títulos mencionados na rápida biografia da atriz, principalmente o Triângulo da Tristeza — apenas o título, sem nos atermos ao seu enredo, propriamente dito — pois remete a uma reflexão pessoal sobre o que pode representar no contexto a sua passagem. 

Em geometria, um triângulo equilátero, por exemplo é todo triângulo em que os três lados são iguais, isto é, todos os três ângulos internos são congruentes.

 

Teria a vida de Charlbi sido assim, tão certinha? Tivesse sido, o triângulo não seria equilátero, mas isósceles ou escaleno. Se isósceles, a base (a menor)  remeteria divagar sobre o que lhe aconteceu ao longo de seus apenas 32 anos; depois, a subida vertiginosa do sucesso invejável e depois, no lado oposto, uma descida rápida até o desfecho que pegou a todos de surpresa.

 

Geralmente, a vida da maioria de nós outros, igualmente mortais — tenhamos certeza, mais se assemelha a um triângulo escaleno, onde os três lados são absolutamente diferentes. 

 

Em 2017, Charlbi protagonizou “Don’t Sleep”, mas ela não seguiu o roteiro desse thriller de terror e seja lá qual tenha sido a história, Charlbi adormeceu e acabou morrendo como haveremos de adormecer um dia. 

 

A morte sempre surpreende, principalmente quando se trata de uma pessoa jovem; se bem que juventude é um estágio muito relativo na vida e na percepção de todos, mas enfim. Trinta e dois anos direi que é pouco. Já carrego bem mais que o dobro e aqui e ali, pessoas que não vejo há muitos anos (e muitos é muito relativo e vago), exclamam, generosamente: “rapaz, tu não envelhece!”, mas não me animo. Volto pra casa, olho-me no espelho e constato, com toda certeza, que a gentileza não passou de uma gentileza. Envelheci e não tenho culpa. 

 

Voltando à Charlbi, um ano depois de estrelar o “Não durma”, ela protagonizou o filme “Entrevista com Deus”, que deve estar acontecendo agora e diante dEle, respeitosamente genuflexa, respondendo às suas divinas interpelações e prestando contas sobre o “Livre Arbítrio” um filme onde cada um de nós é um mocinho ou um bandido, mas para o Criador, não faz a menor diferença. O diretor desse filme é Ele, que sempre foi onipresente, onipotente, mas nunca interferiu.

 Um par de sapatos

por A. Capibaribe Neto

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O rancor é um ódio profundo, não manifestado, adormecido, esperando a hora da cobrança na mesma moeda ou com juros. E depois, com o fechar da conta, vem o quê? A festa do escárnio silencioso, para o ufano do recebimento da paga soldada. É assim que imagino a ceia fria solitária de Adrasteia, epíteto de Nêmesis, a deusa do destino, do equilíbrio e da vingança divina, segundo o qual ninguém pode escapar.

 

Vingança! Um prato frio preparado com requintes de paciência para o gáudio bizarro da mágoa. “Deixe estar, um dia você me paga!” A ameaça se traveste de promessa solene ante a ferida aberta na carne ou nos sentimentos. Rancor e perdão não se sentam à mesma mesa. O rancor é uma ferida teimosa que se abre e sangra, vez por outra, por mais que o tempo passe.

 

A vingança é uma esperança feia, cuja fome só se sacia com os bocados poucos até a chegada do dia incerto. Por mais que demore, fica ali, feito bálsamo temporário. “Perdoar é divino!” – é bonito só no dito, sem que se leve em conta o tamanho do lanho infringido na carne alheia ou na dor impossível de descrever com serenidade. 

 

Lembro de certa vez, afastado do azáfama do intervalo das aulas, sentado sobre as primeiras pedras para a construção dos blocos do Campus ainda sem árvores e jardins, mãos em concha, espremendo lágrimas teimosas, deixei a confusão das emoções se refestelarem sem peia. Era noite sem lua e serviu de cúmplice para o eclodir do machucado recente. Macho brabo não chora. Mentira besta! Chora, sim. 

 

Traição é fichinha diante das consequências pela ingenuidade de cair numa armadilha plantada pela vaidade. Não é a traição das trocas sobre as camas alugadas, não. São as consequências arrastadas pela companhia inevitável do arrependimento que sempre chega depois. O soluço aquietou-se justo quando o cascalho denunciou passos caminhando na minha direção.

 

Não tirei os olhos do chão, mesmo quando senti uma presença perfumada chegar bem perto, puxar meu braço, abrir a minha mão, colocar um pedaço de papel dentro, aperta-la e se afastar. A luz da Lua quase cheia e lá estava escrito: “chorei muito por um par de sapatos até que um dia encontrei um homem que não tinha pés…”.

 A única saída é a porta de entrada

por A. Capibaribe Neto

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De onde viemos? Onde estamos? Quo vadis? À primeira pergunta, existem controvérsias. Dizer que foi de um “naco” de barro mascado e cuspido pelo Grande Arquiteto do Universo, mais conhecido na intimidade por Deus, não seria de todo absurdo, porque assim caminha a humanidade que foi ensinada, aprendeu e difunde. 

 

Quanto ao “Quo Vadis?” que em latim significa “aonde vais?”; não sabemos, ninguém se atreve a dizer. Está tudo muito confuso, complicado, nervoso, cheio de antagonismos, confrontos, intransigência, insultos, provocações… precisa mais? 

 

Nunca antes, na história deste país, esta frase cansada, enfadada de tão replicada, não só o Brasil, como o resto do mundo, que está aflito, a maioria nem se dá conta disso, embora sinta o cheiro de pólvora no próprio quintal, está atônita. Não se importa de onde veio, perdeu sua própria história, desligou-se das origens e relegou os valores ao mais completo ostracismo. Onde está, pouco se importa, o que conta é seguir a boiada oportuna e se deixar hipnotizar pelo berrante do mau vaqueiro. “Tempos estranhos” volto a parafrasear o ex-ministro do STF, Marco Aurélio… 

 

De onde viemos, podemos afirmar com absoluta dúvida ou indignação que não sabemos ao certo e ou pouco nos importa. O que conta é que estamos no meio da bagunça como o quase nada no olho do furacão, onde predomina uma calma aparente.

 

Tempos confusos, basta observar em volta. E perdidos, como desprovidos de visão, estamos todos perdidos e aflitos no meio desse tiroteiro de mentiras, narrativas, não deixam escapatória para ninguém. De onde viemos? Sou mais de acreditar que viemos dos confins do universo, restos de estrelas que colidiram e viraram pó para seguir sem destino pelos caminhos impensáveis do Cosmos.

 

Resumindo, somos pó de estrelas e ao pó retornaremos com cheiro de pólvora nuclear — se não nos precavermos. Quo Vadis? Não me pergunte, dona… Só quero sair daqui, mas estão dizendo que a porta dos fundos está fechada. Uma janela serve, mas onde estamos é muito alto. Espatifarmo-nos-íamos ao cair estatelados no chão de uma realidade confusa. Esta é a visão mais serena desses tempos confusos, complicados, violentos, por conta de uma disputa intolerante é radical. Quero sair daqui e depressa. E o pior, a porta dos fundos está fechada. A alternativa é a porta de entrada, que é de onde viemos e faz-nos lembrar do Inferno de Dante, com ranger de dentes, olhares de ódio, gritos de intolerância. Enfim, estamos as vésperas das eleições…

Palavras do momento

por A. Capibaribe Neto

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Desculpem, leitores românticos, pessoas queridas e suaves que outrora (e nem tanto tempo faz), se enlevavam com as noites de lua cheia e podiam curtir, com alguma paz e tranquilidade, o luar e as estrelas. 

 

Hoje não podem mais. Não por falta da Lua ou das estrelas. Elas estão lá, piscando. Mas, dessa vez, incrédulas, cercando a lua grande atônita, e mais, impávida, não por indiferença. Queria voltar a ter no rosto o riso solitário, sorrindo por dentro, pensando na felicidade daquele encontro, o primeiro, que perseguia a ansiedade do primeiro beijo e depois esqueci porque foram tantos e perderam a graça. 

 

De repente, o mundo agora é outro, as expectativas são outras, as pessoas são outras, e as diferenças  também são outras e muito mais, e muito piores, nas disputas desnecessárias. “Não é necessário mostrar beleza aos cegos, nem dizer verdade aos surdos. Mas não minta para quem te escuta e nem decepcione os olhos de quem te admira…” E completo, a coisa ficou feia, quase horrível, não dá mais gosto de se ver, participar, discutir, é tudo disputa feia, cheira a sangue, vontade de matar, destruir… todo dia é o que se vê. 

 

Nem parece a escrita bonita, como nas declarações de amor, de juras, beijos antigos, amassos, gemidos, gritos de prazer, de que é bom e depois “foi gostoso, de vamos de novo, nem que seja nadar, passear passeio simples, moleque, divertido". Misturaram as cores, as vontades, o modo de falar. Agora, não é mais pedir, é exigir, impor, mandar, dar ordem, obedecer ou reagir, desobedecer, enfrentar pra ver no que dá. Ficou fácil ir embora, desobedecer, inventar desculpas, histórias, narrativas. Acabou a crença, é muita desesperança, tristeza na alma, no corpo moído pelas porradas da vida. 

 

E aí eu me pergunto: o que é a vida? Encontrei a resposta pronta numa frase solta, numa folha largada trazida pelo vento: “A vida é o que viemos fazer aqui…”

Palavras do momento

por A. Capibaribe Neto

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RACISMO, INTOLERÂNCIA, PRECONCEITO, DISCRIMINAÇÃO, RADICALISMO, OPORTUNISMO, MODISMO, INDIFERENÇA, EXIBICIONISMO, IGNORÂNCIA E IDIOTICE.

 

Cada uma dessas palavras possui um significado diferente e, embora guarde, entre algumas, uma correlação, não são sinônimos, mas podem se utilizadas em uma mesma frase ligadas apenas pela conjunção “e”; por exemplo: racismo e idiotice, só pra começar. Radicalismo e idiotice, outro exemplo. Exibicionismo e idiotismo, preconceito e idiotice. A lista dessas palavras que podem ser associadas à idiotice é vasta e são sempre antipáticas. A idiotice é um mero substantivo feminino que representa, segundo o dicionário da língua portuguesa, como “qualidade do que ou de quem é idiota; ato ou procedimento de idiota”. A ignorância do modismo nas exibições tolas de pessoas que desfilam querendo e conseguindo chamar a atenção com o escandaloso barulho de escapamentos de seus veículos é uma idiotice.

 

 É aqui, louvem-se as mulheres, pois essas não entram nessa onda e torcemos para que não reivindiquem equanimidade nesse direito. Elas têm muito mais classe. A idiotice, nesse exemplo, é prerrogativa dos machos alfa no capítulo que explica a redução de cérebros atrofiados ou deformados, uma espécie de fimose cerebral.

O idiota que desfila fazendo toda essa barulheira acredita que está fazendo bater mais forte o coração das mocinhas ou dos demais circunstantes. Aceleram, empinam suas motos, indo e voltando e no caso dos carros, dando voltas nas quadras ou incomodando aqueles que moram perto de “points”, como o Austin, onde as mesmas noitadas que não incomodam dentro do ambiente, extrapolam para o estacionamento da farmácia ao lado, em volta de um barzinho que vara o resto das madrugadas de quintas, sextas, sábados. A maioria ali não fala; grita! Tem o tipo do chapéu branco de cowboy, que aboia seu gado de clientes mal educados e desrespeitosos para com trabalhadores, crianças, idosos que habitam os condomínios em frente. São radicais na idiotice e na insistência do modismo esdrúxulo. 

 

Não se trata de intolerância ao direito que cada idiota tem de ser estúpido, tolo e mal educado. Não sei se está na constituição como causa pétrea. Cada pessoa tem o sagrado direito de se comunicar e evidenciar suas “qualidades” forjadas nos berços, muitas vezes fartos, de pais igualmente idiotas.

 

 Estamos vivendo em um mundo com os dias contados; seja pela iminência de conflitos nucleares — e seria apenas um, evidencie-se; pelas pragas, vírus e pestes e agora, pelo radicalismo, intolerância, preconceito, racismo, oportunismo, tudo junto e misturado. 

 

E de repente, enquanto dedilhávamos essas mal traçadas linhas, chega a notícia que Jô Soares, o gordo simpático agora está rindo de nós lá em cima, talvez tentando descontrair o Criador, triste e desapontado, com toda essa idiotice no mundo que Ele criou. Se arrependimento matasse, né, Deus?

Sagrados Direitos à Teimosia e à Estupidez

por A. Capibaribe Neto

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Mais que nunca, é oportuna a frase “tempos estranhos”, usada com alguma contumácia, qua se deparava com argumentações destoante de seus pares no Supremo Tribunal Federal. Pois é, estamos vivendo tempos muito estranhos. Mesmo acatando os direitos à teimosia de cegos de boa visão e estúpidos oportunistas. Ora, duas pessoas debruçadas sobre parapeito de uma mesma janela, podem estar contemplando, uma, o campo; a outra, as estrelas.

 Os que se deleitam com o que veem, tanto com a vastidão dos campos ou os diamantes eternos do universos, podem escolher o que mais lhes toca o coração. Os tempos estranhos, todavia, estão no plano único onde deveria estar o bom senso, a coerência, o respeito ao contraditório, ao invés da crescente estupidez da teimosia. 

 

Cobra-se do vizinho uma escolha igual à sua e condena-se o discordante com insultos, provocações e ameaças. Sim, sim, estamos falando dos verdadeiros campos de batalha, onde os ensaios para um das mais emblemáticas e polarizadas disputas eleitorais. As responsabilidades dos eleitores nunca foram tantas. Alardeia-se com estranha convicção que, entre nós, nos campos ou nas estrelas, está um homem mais honesto que aquele vendido por um traidor por meros trinta dinheiros. Tempos estranhos! E põe estranho nisso!

 

Do outro, sejamos honestos, permita-se-me, um soldado destemperado, de gênio indomável, pouco afeito a levar desaforo para casa. Como escolher entre o mais honesto dos honestos — inclua-se aí o filho do Criador e o ungido de gênio forte, campeão de levar pancadas diárias, ambos com as vísceras à mostra, para o deleite dos mesmo abutres de sempre, esperando ávidos para avançar e se empanturrarem com as iscas das vantagens oferecidas.

 

Nesse caso, os tempos nem são tão estranhos assim; pois os atores — todos — são sobreviventes confusos da pandemia e mesmo não sendo ouvintes dos tiros dos canhões, das explosões formidáveis dos mísseis, que já ceifaram milhares de vida, também sofrem e gemem com as consequências e efeitos colaterais eu seus bolsos e seus estômagos.

Tem estranhos e cruéis, sem vislumbre de armistício, de trégua. E segue a estupidez, galopa à teimosia.

Rigores da Semântica não explicada

por A. Capibaribe Neto

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Que culpa nos cabe, se o tempo passou e não nos deu chance de recusar o acúmulo de aniversários que nos foram impostos desde que nascemos? Que defesas tivemos contra as marcas nos rostos, os cabelos brancos? De quê adiantam as tinturas para encobri-los se eles continuam embranquecendo por trás das cores que repudiam a realidade?  

 

Somos inocentes e impotentes diante da ordem natural das coisas. Não foi uma escolha nascer ou envelhecer; ambas são consequências. Seria injusto e apenas piegas lamentar a coleção de muito passado e a sensação desagradável de pouco futuro. 

 

Como saldo passageiro dessa experiência e responsabilidade que é viver, estão os filhos, frutos das parcerias escolhidas conscientemente ou consequências das afoitezas nos arroubos de vaidade. Filhos e netos são as recompensas que nos fazem rir por ver neles as lembranças de quem fomos, principalmente quando ainda são ingênuos.  Fomos um dia e que ainda aceitam as exageradas proteções que também recusamos e choramos ao obedecê-las.

 

 Ruim é ver esses filhos crescerem, empinar o nariz e nos tirar o sono enquanto não chegam de seus voos pelos céus noturnos de sua quase independência. Que culpa nos cabe se somos pais e depois avós? Que podemos fazer contra a sadia troça que fazem se não entendemos seus linguajares, suas gírias, seus novos modos, suas escolhas? Nada!

 Também nos revoltamos, batemos o pé, nos rebelamos, mas é vida que segue, o show precisa continuar e nem sempre é fantástico, embora o show da vida tenha a sua graça.  

 

A quem podemos reclamar se a vida que nos é imposta vier com defeito? Qual a possibilidade de um reset? E reprogramar? Nenhuma atualização disponível? Não. Nada. O relógio continua marcando, o tempo continua passando e pesando. Nem mesmo um arrependimento aqui e ali resolve. 

 

O tempo, assim como a maré, não espera por ninguém. O pior é o tempo porque é pontual. Não dá para viver tudo, desfrutar tudo. Não se pode usar todos os relógios caros ao mesmo tempo. Não se usa um Hublot em um braço ou um Piaget no outro. Assim como as canetas Mont Blanc que já foram moda e ostentavam nas mãos até dos que não sabiam escrever, com o passar do mesmo tempo foram aposentadas. 

 

A quem cabe a culpa se o modernismo, a evolução das coisas tomaram assento e tudo virou passado, fora de moda? Esses cabelos brancos, essas prioridades nas filas, nas estacionamentos, nos atendimentos…! Fazem-nos assumir culpas pelos direitos que se tem. Nascer nunca foi uma opção que nos tenha sido apresentada e viver, mais que uma responsabilidade, é uma obrigação que cobra contas diárias, com juros e correção à vista.

 

De repente, deixa-se de ser um inofensivo idoso e passamos a fazer parte de um certo grupo de risco em nome de uma semântica não explicada.

MELANCOLIA – COMPANHEIRA FIEL DA SOLIDÃO

por A. Capibaribe Neto

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A melancolia, segundo está definido, em uma de suas acepções gramaticais, é um estado emocional caracterizado por profunda tristeza e desencantamento, sentimento de languidez, permeado por uma suave e indefinida tristeza que leva que leva à meditação e à introspecção, depressão; mangorra. Do ponto de vista psicológico, é um estado mórbido caracterizado por falta de energia física e mental, geralmente causado por doença psiquiátrica, atualmente considerado um estágio da psicose maníaco-depressiva.

 

Em resumo, ser melancólico não é bom, mas não é uma escolha voluntária, é-se acometido dela sem que se aperceba, como parcelas de emoções que se contrapõem, por exemplo, à euforia ou sensação escude felicidade que se diluíram e, como num fade, foram se transformando através de uma soma de coisas desagradáveis, na síntese de uma despedida. Ative-me à palavra ao escutar “Melancolie”, interpretada por Rokia Traoré, uma cantora, compositora e guitarrista nascida no Mali, oficialmente República do Mali, que é um país africano sem saída para o mar na África Ocidental, sétimo maior país da África, cercado por sete países: Argélia, Níger, Mauritânia, Senegal, Costa do Marfim, Guiné e Burquina Fasso.

 

A precisa localização da terra natal dessa cantora de belíssima voz e interpretação serve para contextualizar as lonjuras que reforçam dizer que apesar de suas composições serem apreciadas, principalmente na Europa, é uma artista pouco conhecida aqui no Brasil. Para Rokia Traoré, melancolia é uma companheira fiel da solidão, talvez a palavra que melhor traduza “saudade”, que também acomete quem dela sofre, de tristeza, depressão e mangorra ela transforma a Melancolia em algo com que pode dançar, por exemplo: “Melancolia dança comigo na bela cadência dos meus sonhos de alegria; Melancolia, canta comigo palavras de felicidade que inspiram minha vida. Melancolia, companheira fiel da minha solidão.

 

Eu não quero a sua dor nem que passes pelas frestas do meu coração; nem quero que as suas lágrimas borrem as cores da minha alma. Quero de volta os sonhos que me fazem dançar e dizer poemas, ser mais suave e a melhor versão de todas as minhas alegrias. Vem cantar comigo as palavras de felicidade que inspiram a minha vida. Melancolia, volta para o fundo do abismo onde devem ficar esses tormentos que me assombram.

 

Não quero saber desses males que só servem para me manter longe das luzes brilhantes da vida. Quero escutar o sussurro de doces palavras de esperança na cadência dos meus sonhos de felicidade e alegria…” Para falar de melancolia e entender o significado intrínseco que passa pelo desencanto, depressão, estado mórbido, caracterizado pela falta de energia física e mental, Rokia se inspira no seu oposto, naquilo que necessita para recompor-se e escapar dessa sensação ruim pela qual já passaram os apaixonados que se despediram de suas histórias findas e deixaram como lembranças insistentes a saudade; que na verdade, aquele estado que nos faz ser visto como alguém melancólico e poucos no entorno conseguem entender essa que é uma uma companheira fiel de toda solidão.

A pontualidade nos encontros marcados
por A. Capibaribe Neto

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— Qualquer dia a gente pode tomar um café…
— Será ótimo. Não vejo a hora.
— Combinado, mas olhe lá, não se atrase…

Acho ótimo encontros assim! Já aceitei tantos. Ainda não foram ótimos, mas serão. Essas promessas estão sempre atualizadas, assim como as desculpas sorridentes…

— Estou em falta com você. Precisamos remarcar. Esses dias passam e a gente nem nota. Também tem essa Covid. 
— Pois não é? É um tal de pode tirar a máscara, volta a máscara…
— Atualizou a vacina?
— Já tomei a quinta dose.
— Teve reação?
— Dessa vez dei uns espirros, nada de mais.
Quinta dose? Estarei atrasado ou adiantado? Nem sei mais. Agora, tem aquela coisa da Varíola do Macaco! Lembrei dos “posts” no Instagram… Aqueles macacos engraçados. Tem um que parece rir. 
— Diz aqui, era você naquela foto com aqueles macacos engraçados, na Internet?
— Não, eu não! 
— Era, não minta. Vamos fazer assim, sabe aquele café? Melhor adiar, né?
— Também acho. Que tal próximo mês?
— Combinado. Qualidade desses eu te telefono e a gente marca direitinho.
— Pois liga mesmo. Vou ficar esperando.
— Não vejo a hora! A gente precisa colocar o papo em dia. Tantas novidades…!
— Você soube, né? 
— O quê?
— Da Gircelene…
— Não…! Morreu?
— Covid?
— Não, coitada, mas no dia em que saiu para tomar a quinta dose. Aquele assalto no Shopping.
— Mas ela estava no Shopping?
— Não. Do lado de fora. Avançou o sinal…
— A gente precisa se encontrar mesmo pra colocar as notícias em dia. Preciso sair agora, senão me atraso para um chá que estava marcado há tempo…
— Ih, agora lembrei… Que dia é hoje?
— Sexta-feira feira…
— De que mês?
— Julho. De 2022…
— Nossa! Que horas são?
— Eu também tinha um café marcado pra hoje… Muitas conversas para colocar em dia! Essa vida corrida! Esses compromissos. Essas vacinas.  Os medos antigos, os novos, o tira-e-bota dessas máscaras. As pessoas se perdem nessa confusão das eleições…
— Ah, já se decidiu? Vai votar em quem?
— Estou confusa… Depois do escândalo dos pastores, mudei. Vou votar em branco. Nulo, sei lá…
— Vamos marcar mesmo aquele café. A gente precisa se ver…
— Também acho.
— Mas você só faz dizer…
— Você que esqueceu…
— Menina, tanta coisa…! A Selma chegou e já foi embora… Nem a vi…
— A Selma? A Selma do Mário?
— Sim, não acredito?
Pois é, essa agenda! Tanta coisa! Tantos compromissos! Tantas vacinas, tantos medos para atualizar,  ainda mais essa varíola dos macacos. As pessoas se perdem, se atrasam. Os escândalos novos, os antigos desenterrados. A posse do Lula! A posse do Bolsonaro! 
— Você votou em quem?
— A eleição ainda é em outubro!
— Em que mês estamos?
— Julho, criatura!
— Meu Deus, a gente precisa se encontrar. Vamos marcar um café…
— Tudo bem, mas não seja tratante. Da última vez você falhou…
— Que tal na próxima semana?
— Combinado. Qualquer dia eu te telefono e a gente marca direitinho.
— Fechado! Beijo!

Momentos parados no tempo 
por A. Capibaribe Neto

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Até 1826, as transcrições dos visuais de pessoas, objetos, paisagens, acontecimentos, para uma linguagem visual eram feitas através da interpretação artística de milhões de pintores, incluindo aí os pintores rupestres — pintores antigos — que gravavam em rochas ou cavernas, detalhes do mundo dos primeiros habitantes do mundo em evolução.

 

Das pinturas rupestres à primeira imagem fotográfica, em 1826, muitos séculos se passaram e aquilo que um pintor levava horas ou dias para imortalizar, a fotografia passou a fazê-lo em frações de segundo. A fotografia mais antiga do mundo foi feita em 1826 por Joseph Nicephore Niépce, a partir da janela de sua propriedade em Saint-Loup-de-Varennes, na França. Não foi capturada em fração de segundo como as mais modernas; ela levou oito horas, contra /125.000 avos de segundo (um segundo dividido por 125.000). 

 

A história da fotografia deixou de ser apreciada em cursos de fotografia porque a própria história do mundo e das civilizações foi se diluindo com o advento de novos interesses e invenções. O saudosismo é quase uma ofensa para os cabelos brancos de quem ainda lembra, nostálgico, “daqueles tempos”. E, de repente, eu me dou conta deles. De que me vale isso? De que vale isso para tantos outros, mundo afora? O que me trouxe até aqui, neste espaço? 

 

A fotografia que ilustra esta crônica foi registrada há mais de 30 anos… O perfil sensual da moça de moreno suave e lábios sensuais, tinha, à época, saudáveis 18 anos! Vi-a de longe, semana passada. Nem nos cumprimentamos na passagem. Quase voltei para relembra-lá do momento em que a eternizei em centenas de cliques com a minha câmara. Naquele instante, a imagem imortalizou-a, congelou sua juventude, a graça daquele ar, a pose estudada para a produção e a sensualidade dos lábios oferecidos momentaneamente. Ficará assim para sempre se for guardada como a tenho, mas para sempre é muito relativo; é só um modo de dizer.

 

 Desde a primeira imagem fotográfica, gravada ao longo de oito horas, por Niépce até a fotografia desse perfil único passaram-se muitos anos. Centenas de bilhões de fotografias foram feitas no mundo e muitos bilhões foram perdidas, mas as que ainda estão adormecidas nas gavetas da minha história, como fotógrafo, vez por outra me fazem voltar no tempo para reverenciar momentos assim, parados no tempo onde fui um artista das lentes a ficar extasiado diante da musa que nunca me sairá da lembrança enquanto o destino não passar a régua e fechar a minha conta. 

 

Tenho milhares desses momentos parados no tempo. Todos esses rostos permanecem como foram um dia, na plenitude de suas belezas que seguiram em frente, aceitando, compulsoriamente o passar do tempo, as dívidas de todos os dias vividos.

Tokotsubo: a síndrome do coração partido
por A. Capibaribe Neto

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Tokotsubo é um termo relativamente novo e se refere a uma disfunção sistólica ventricular esquerda transitória, usualmente com dor torácica associada, mas seria apenas uma síndrome descrita inicialmente em população asiática em 1991, mas logo descrições da síndrome em populações norte-americanas e europeias ocorreram. 

 

Seria uma coisa usualmente interessante ao universo da cardiologia, coisa técnica, científica, mas há alguns meses, vendo um filme inteligente, em um dos diálogos entre os protagonistas, um deles mencionou que a mocinha estaria com a síndrome de Tokotsubo. Como já era a segunda vez que me deparava com a palavra, fui pesquisar por pura curiosidade e descobri que eu mesmo já havia sofrido da Síndrome de Tokotsubo. E aqui, saímos da parte cardiológica propriamente dita e entramos na versão emocional pura e simplesmente. 

 

Naquele filme, a personagem quase morre e o médico que a atendeu deu como diagnóstico a Síndrome de Takotsubo, também conhecida como a Síndrome do Coração Partido. Lá vem a velha história de roendo a corda, as sofrências pelas dores de amor; seja porque tenha chegado ao fim a história que foi intensa ou em decorrência do confronto de gênios ou litigas entre gênios fortes. 

 

Não sinto nenhum constrangimento em confessar que já sofri dessa tal Síndrome de Tokotsubo. Não é um nome bonito, diga-se. Imagine o cara com a pior cara do mundo, esquálido, quase padecendo de uma greve de fome, hospitalizado e constando na prancheta do relatório de acompanhamento médico e para conferir as medicações ministradas, a doença do paciente: Síndrome de Takotsubo. — Isso é contagioso, doutor? — perguntaria um curioso ou uma visita. Não foi o meu caso. Essa mazela, os mais fortes curam do lado de fora do hospital. Mas não custa nada alegar para a mocinha, todo queixoso: você me fez pegar a Síndrome de Takotsubo. “Oh, meu amor. Nunca mais eu faço isso…” Melhor mesmo, quase morro. Você fica aqui pra cuidar de mim?  — “Fico…” você também já teve essa síndrome, não negue, só não diga que se trata de consequência do coração partido. Takotsubo desperta curiosidade.

Saudades daquelas saudades
por A. Capibaribe Neto

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Para os agraciados com muitos aniversários já comemorados, ou não, mas vividos, coleções de chegadas, permanências e partidas são comuns. Os números desses encontros, experiências, fracassos e novas investidas não podem ser analisados como inconstâncias, vulgaridades, canalhices, não. 

 

Mesmo antes da moda do “vida que segue”, as buscas por relações duradouras ou as novas, chamadas de sérias, aceitam as “relações complicadas”, coisas que, se assumidas publicamente, remetem à aceitação de que um dos dois não presta ou brinca com o fogo. Até parece que as pessoas gostam de escancarar que essa relação não tem futuro ou tem tudo para virar um escândalo ou, em última hipótese, um tentativa de chamar atenção ou juntar seguidores assumidamente fuxiqueiros ou curiosos para saber a quantas anda o tal relacionamento complicado.

 

Frequentar as redes é divertido e o divertido anda parelho ao decepcionante. Uma relação virtual, por exemplo, comporta tudo; desde um encontro etéreo furtivo, uma paixão louca que explode logo após as primeiras perguntas-clichês e uma despedida assim, sem mais nem menos. É isso, para não falar da troca de nudes irresponsáveis e muitos deles fakes ou dissimulados através de filtros mágicos.

 

As despedidas, nesse contexto, poucas vezes deixam sequelas — embora raramente deixem marcas e até se transformem em tragédias anunciadas. As despedidas de antigamente — que me perdoem os que são avessos ao saudosismo, se arrastavam, passavam por confissões de paixões físicas, se expressavam através de serenatas, flores, cartões perfumados ou aqueles que tocavam musiquinha tão logo o destinatário/a os recebiam. Eram cartões de material espesso, difíceis de destruir quando se fazia imperiosa a despedida.

 

As despedidas de antigamente, repito, se arrastavam mesmo, davam espaço para sentidos e sinceros arrependimentos, possibilitando reconciliações verdadeiras. Outras, nem tanto; algumas, uma verdadeira falta de vergonha, pudor e respeito. Tinham as despedidas que exigiam a devolução de cartas, fotografias e até presentes, restos de perfume, nas despedidas pobres de casais medíocres. Haviam as despedidas escandalosas, por conta de relações que pendiam de traições explícitas, difíceis de assimilar ou aceitar, mas não de todo impossíveis. Cartões, cartas, bilhetinhos perfumados perderam a vez. Seja para declaração de amor ou pedidos de namoro.

 

 O fade da transmutação do amor para o ódio ou a indiferença pelo despeito, é rápido nos dias de hoje e quase não deixa resquícios desses amores hodiernos. Mesmo assim, despedidas são despedidas, como diz a letra da música “Adeus” - as cinco letras que choram… ponto final de um romance de amor. Que nada! Pouco se chora quando essas histórias de “amor”, pois sim! — de hoje se acabam. 

 

Aí, que saudades daquelas saudades quando cada um seguia seu rumo, um querendo ficar, o outro querendo partir! Nas despedidas de hoje, os dois querem dar no pé, partir pra outra. Dizer saudade daquelas saudades parece romantismo bobo, jogo de palavras, fora de moda, que digam, mas essas saudades, as melhores saudades que não existem mais fazem a gente sentir como era bom sentir saudades…

L

LLembranças da Válvula Mitral 
por A. Capibaribe Neto

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Tecnicamente, a válvula fica no lado esquerdo do coração e controla o fluxo sanguíneo entre o átrio esquerdo e o ventrículo esquerdo. Quem faz exame do coração e é curioso que nem eu e fica olhando no monitor seu próprio interior em preto e branco, pode não entender as verdades estáticas explicitadas ali, mas um coisa não passa despercebida: a válvula mitral no seu pulsar, desde a forma mais primevas de vida até que… Num átimo de tempo ela pulsa pela derradeira vez e para.

 

Por incrível que pareça, essa coisinha tão fina como uma folha de papel celofane, no comando da vida, feito uma sentinela que nunca dorme, na vigília pelo ritmo passagem do sangue. Bem que eu podia ter olhado curioso, mas sem perguntar o que era, para que servia…

 

 Como se não bastasse, depois do exame, quando tive alta, fui mais curioso, fui pesquisar na internet e mais ainda, fui olhar um vídeo em cores, no YouTube e lá estava ela, batendo, abrindo e fechando, deixando passar o sangue entre átrio e ventrículo. A vida de nós, mortais, depende da fidelidade da…Válvula Mitral.

 

 Não existe padrinho, não adianta dar carteirada naquela passagem. O sangue pode até ser ruim, como o sangue dos maus carácteres, ela não discrimina. Não quer saber em quem cada um vai votar, se a escolha é boa, se é péssima, se o candidato roubou, se a justiça deixou passar a sujeira das suas molecagens, se foi conivente e deixou passar a boiada, nada. A Válvula Mitral é apartidária. Não tem opinião como não deveria ter um bom jornalista. 

 

A Válvula Mitral não se vende, não compactua, não escolhe. Está ali e lá, enquanto os glóbulos vão passando, apressados ou lentos; em uma crise de hipertensão ou quando a pressão é baixa. 

Não aconselho a ninguém perscrutar a vida, a intimidade da sua Válvula Mitral nem ter inveja da Válvula Mitral dos outro. Cada com a sua. E não tem essa de acusar ninguém que está assim ou assado por não ter cuidado da sua. O que complica são os periféricos, mas aí é outra história. 

 

Pois bem, esta crônica está sendo escrita na sala de emergência de um hospital enquanto a Válvula Mitral de uma pessoa querida andou avisando de suas dificuldades. Válvulas Mitrais são amigas e quem avisa amiga é. “Ei, doutor, a Válvula Mitral dela está lenta…!” O que o senhor entende disso?” “Muito pouco, doutor…” — então fique quieto e me deixe auscultar… “Posso ouvir também, doutor?” — Não, por favor, não atrapalhe…!  E aí, só me resta sair da sala. Olhar com a cara feia para o médico e fazer aquele sinal, com os dois dedos apontados para os meus olhos e depois para o médico que nem deu bola. Sai da sala e fiquei espiando através do vidro. Vi agulha catando veias, soro chorando pelos tubos, ventosas grudando aqui e ali, agulhas dançando seus balés sobre uma tira de papel, expondo a conversa da Válvula Mitral. Ora pula, ora desce e em seguida treme, contando suas histórias, suas dificuldades.

 

 Ninguém pode atribuir culpa ao capitão, nem ao homem honesto que vai cuidar das Válvulas Mitrais de radicais de santos-do-pau-oco… (Santo do pau oco é uma expressão popular brasileira utilizada para designar um indivíduo de caráter duvidoso, com ações fraudulentas, uma pessoa mentirosa, falsa ou hipócrita) — só para constar. E aí, enquanto radiografias e resultados de exames de sangue não chegam, estou aqui, tentando não me envolver emocionalmente com o rapaz que grita de dor com uma crise de vesícula, a senhora aqui do meu lado, reclamando da ardência do cetoprofeno para cuidar da sua enxaqueca. Não importa cada dor, cada histórico, cada queixa, por enquanto, as Válvulas Mitrais de cada um estão ali, tremilicando fiéis dentro de seus peitos aflitos, guardadas do lado esquerdo do peito, como um amigo…

A Soma de todos os erros
por A. Capibaribe Neto

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O certo seria acertar sempre, mas aí alguém escreve que é errando que se aprende. Pode ser. Vem outro e tasca: errar é humano! Animais erram, mas erram menos, vão pelo instinto, conhecem o dono pelo cheiro. 

 

Li, certa vez, que um rei pressentindo que estava perto de morrer pediu a um dos seus conselheiros que encontrassem uma frase que gostaria de dizer como última no leito de morte. E lá foram eles na busca de uma frase forte que o imortalizasse para seus súditos. A maioria das frases que trouxeram já haviam sido ditas por outros reis, imperadores, presidentes. E quando chegou o dia da sua morte, vendo que não lhe haviam trazido nada de original, sussurrou para os que estavam presentes: “digam ao meu povo que esqueçam meus erros, pois quando os cometi foi com intenção de acertar…”. Ele mesmo havia encontrado a frase para despedir-se da sua gente. Nada forte ou original, mas valeu. É bem provável que passados os anos, seus súditos não tenham lembrados dos erros do rei e depois, do próprio rei. 

 

No mundo de hoje, no contexto atual, autoridades dizem tantas bobices em pronunciamentos carregados de agressões gramaticais, atentados ao pudor das concordâncias verbais, estupros das ênclise, próclises, mesóclises, que fica difícil separar o trigo, porque é tanto joio que o trigo se perde e quase nada se aproveita. Às vezes, propositadamente, faço uso de sinônimos, de oxímoros só para causar, para me divertir — pura maldade.

 

 Redundâncias me dão azia, principalmente quando grassam nas entrevistas com autoridades tentando se explicar nos insistentes “há muitos anos atrás”; não consigo imaginar o ciúme dos ingênuos subiu pra cima ou desceu pra baixo. A língua brasileira,  português – “Flor do Lácio”, é uma expressão usada para designar a língua portuguesa. O poeta brasileiro Olavo Bilac, se referiu ao idioma português como a última das filhas da língua latina, tornando assim conhecida a primeira frase de sua poesia chamada “Língua Portuguesa”, onde diz “A última flor do Lácio, inculta e bela”, e por aí vai, é muito rica e bem poucos a dominam, diga-se de passagem. Aliás, bota rica nisso; basta invocar como exemplo, o vocábulo “manga”, quantas acepções! Manga fruta, manga do verbo mangar, manga de lampião, manga de camisa, vestido; manga tubo de plástico para envolver condutores elétricos, manga peça tubular que serve para revestir ou proteger outras peças. 

 

Quem acha que a mocinha do interior está errada quando diz que já “barreu” a casa, está errado, é ela que também está certa, pois  barrer, embora seja uma forma arcaica, é o mesmo que varrer e também bassoura está certo, tanto quanto assobiar. “Estória” tem lugar cativo no dicionário Michaelis da Língua Portuguesa, embora sugira-se “história” sempre, para designar área de estudos científicos como para enfatizar lendas, contos, casos. Não seria de todo errado grafar “estória” pra boi dormir assim mesmo. 

 

Do jeito que as coisas estão caminhando no Brasil que já foi Brazil, mesmo em português lá de antigamente, um dia, se houver um futuro distante, encontraremos, com bastante propriedade, as Estórias do Brasil desses dias que remontam à Lava Jato, que deveria ser Lava à Jato. Essas estórias falarão das mágicas do juíz sendo julgado pelo marginal, das mil vacinas para combater um vírus do olho puxado, dos arroubos de atores nervosos de uma CPI. Tanta estória engraçada, entremeada com “nada haver” e mil outras preciosidades. Tenho estórias na minha história, “causos” engraçados, outros tristes, estórias de enganos dos meus mistakes e engodos, onde me confundi e quase afundei, perto das profundezas abissais de uma ingenuidade adulta. Ingenuidade, ora valham essas desculpas esfarrapadas, verdadeiras estórias pra boi dormir.

 

Enfim, quem somos nós, além da soma de todos os nossos erros e acertos, desculpas, estórias amarelas que são deixadas de lado ou na gaveta, onde guardamos a essência da nossa verdadeira história nessa passagem breve.

De repente, Giselle, a espiã nua que abalou Paris
por A. Capibaribe Neto

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É cansativo, entediante e chato, confesso, permanecer marcando passo em cima de lembranças ruins. A angústia é um prato que é imposto, quase compulsório. As pessoas podem controlar as emoções até certo ponto, depois perdem as estribeiras. Uns, explodem, outros buscam fuga no irrelevante, forçando importância através de retalhos de valores que perderam o significado e seguem a rota descendente rumo ao esquecimento. 

 

As festas estão aí, a gritaria das aglomerações em fim de farra, liberando seus Baços cambaleantes, irresponsáveis, moleques, desrespeitosos. Fazer o quê? A monotonia é ruim, mas a rotina é praticamente uma escolha, mesmo no trabalho. 

 

 Preencha o tempo contando os dedos silenciosamente, nada da braçadas em uma taça de vinho, faça um caminho diferente, coma um pastel de frango com coca-cola, engorde e depois desengorde, mande às favas as próprias favas. Aceite uma solicitação de amizade e depois bloqueie silenciosamente se a amizade for chata, se esticar conversa, lhe encher de orações, enviar fotos de Cristo de barba estilosas, olhos azuis, sobrancelhas bem feitas, cabelos bem cuidados. Cristo era quase negro, era simples, humilde, modesto, bom. Ruins são os homens, mulheres, incluindo os das letras de parte do alfabeto, que se ajoelham, mas não rezam, só buscam direito.

 

Tempos estranhos, festa da cachorrada, dos fuxicos, do assanhamento dos insultos, acusações, bandidos querendo prender juízes, juízes apressados, desmoralizados. 

 

Entre escrever sobre as mazelas quais iguais de amores perdidos que se encontraram em outros caminhos e a bagunça seminal e oportunistas nas mesmas promessas de “vamos juntos”, “vai ser diferente…”. Diferente e dormir de conchinha ou fazer biquinho, virar as costas e fingir raivinha para justificar a farra da tarde em meio a outros perfumes. Desculpem aí, mas o mundo é uma farra, uma orgia, uma bacanal intermitente, entrecortado com uma guerra aqui e outra ali. No meio, um Putin que todo mundo é igual ao nome dele: Putin, mas da vida. 

 

Pois bem, respirei, desabafei, não para tão somente debochar, mas espairecer. E de repente, no meio do nada, sem mais nem menos, a mulher que eu nem imaginava que existia: “… enviou uma solicitação de amizade”. Tinha rosto e foto de perfil sem retoque, sem filtro. Tinhas dentes lindos, a sorrir feito uma moldura para o convite da boca. “Me beija, me abraça, me acorda, me deixa com febre…!” Mas por que eu?

 

Não sei, me sugeriram… Achou ruim? Deleta, desculpa, adeus, peraí… Não, não, não vai embora. Como é mesmo teu nome? “Não posso dizer… Sou uma espiã que veio te espiar, escrever um relatório para o FBI, a CIA, a KGB. Ah, e para o MOSSAD…” Espiã? Como é o teu nome, criatura? A única espiã que conheço é a Giselle, a espiã nua que abalou Paris, no livro de Giselle de Montfort. É você, Giselle? “ É, vai, faz de conta que sou eu mesma. Aproveita que estou nua e me abraça, me beija…!” Acabou a mesmice, acabou o drama. “Vien, Giselle, Je t'aime, je t'aime, oh oui, je t'aime moi non plus. Je vais, je vais et je viens, entre tes reins?… Que loucura, Giselle, mon amor!” Deixa que digam, que pensem, que falem, deixa isso pra lá, vem pra cá que é que tem, vem, Giselle, vem ser feliz…!

Lembranças de Futuros Passados
por A. Capibaribe Neto

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Sonhos são livres e sem os quais a vida, agitada ou mansa, da maioria, perde a graça, a esperança. Sonhos alimentam a fantasia, a esperança e mesmo a ilusão. Conheci uma mulher bonita, cujos injustos machucados da vida a deixaram descrente e avessa aos assuntos relacionados a sonhos. Pelo que escutei, seus sonhos sumiram faz tempo. Não sonha com ninguém, com um abraço, um beijo, um carinho, um cuidado. Isso não impede que sonhem com ela, mesmo que feche suas pesadas portas aos sonhadores em acalentar seu rosto triste, seu olhar triste, sua tristeza particular.
Sonhar não impõe a sua realização implícita. Sonhar faz bem a alma e acalma, leva o pensamento a divagar, ganhar alturas ou lugares alhures ou mais além ou bem depois. 

 

Lá atrás, bem no começo, quando corria afoito pelas calçadas da minha infância modesta, tinha meus sonhos limitados pelas fronteiras da realidade do pequeno mundo onde vivia. Bastava-me uma história ouvida para formar uma imagem e me transportar para dentro dela. Se o circo chegava e desfilava pela avenida, eu me via no trapézio, perto dos tigres, leões e palhaço. Sonhei em ser trapezista, domador, segurar as mãos da moça bonita – malabarista, ser o amor da vida dela. 

 

Se via um filme de cowboy, sonhava com um cavalo branco, como o do Durango Kid ou do Zorro. Sonhei em ser Tarzan, viver na selva, dar aqueles gritos, pular de cipó em cipó, rir da Cheetah, viver em paz na casa da árvore.

 Aos poucos, sem me dar conta, fui sonhando com as coisas que via pelas ruas mais distantes que ia percorrendo, até que vi o mar pela primeira vez. E vi o horizonte, a jangada branca que sumia de manhã cedo e no fim da tarde ia surgindo do linha do mesmo horizonte, trazendo peixes, trazendo histórias. 

 

Tanta coisa foi se juntando nas minhas lembranças e fui colecionando esperanças feitas de sonhos. “Um dia…!” E sonhava. Quando chegasse o futuro, depois que o Papai Noel perdesse a graça, depois do primeiro beijo que deixou meu rosto quente, eu imaginei meu futuro. Sonhei com ele.

 

 Sonhei atravessar o mar, ir até onde nasciam as ondas, do outro lado do mundo onde nem sabia que era nessas lonjuras todas onde o Sol nascia e vinha se arrastando e puxando as noites que anoiteciam sem pressa, passando pelo lusco-fusco até se espreguiçarem nas madrugadas que anunciavam um novo dia. 

Ah, que saudades daqueles futuros que chegaram e passei por eles sem me aperceber, sem poder fazer cobranças ou refazer os sonhos, mudar as lembranças, as fantasias…!

 

 Acostumei-me com as tristezas que me esperavam no futuro que chegou e depois passou, como tudo passa, fica lá atrás, onde não tem mais jeito, não tem mais volta. 

Ah, que saudade daqueles futuros inocentes, quase ingênuos, daquelas vires e cheiros, das vontades, dos primeiros desejos e as saudades deles saciados!

 

 Minhas lembranças daqueles futuros são parecidas com as realidades dos amigos que chegaram até aqui, onde cheguei, onde penso neles e relembro passagens nas fotografias que pararam esse tempo, como um marco, um ponto onde plantei meus sonhos e alguns vi realizados. Outros, esqueci e nem lembrei mais, mas que saudade desses futuros que se perderam no tempo! Resta-me pouco tempo para plantar esses futuros, mas valeu a pena ter sonhado, fantasiado, imaginado, porque fui feliz até com o que não realizei.

 

 Não gostar de sonhos é um direito ou uma escolha triste daquela moça que conheci, não vejo culpa nisso, não aconselho a dar uma chance ao futuro, a um sorriso, ao abraço de um amigo, a um beijo, mesmo que seja só no rosto. 

Não consegui ser do circo, não conheci uma bailarina, não fui Tarzan nem Durango Kid. Não tive um cavalo branco de farta crina esvoaçante, mas sinto uma saudade imensa das lembranças daqueles futuros…!

SOFRER É PARA OS FORTES
por A. Capibaribe Neto

 

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Certas passagens de nossas vidas parecem vividas em um mundo em chamas onde nada, nem ninguém, podem nos salvar ou nos estender a mão. E não é por conta de dinheiro, mas pelo ar que falta ou se comprime no peito. A angústia! 

 

Nesses momentos, é estranho o desejo que pode impulsionar reações tolas, inimagináveis, como escancarar as janelas e portas para expor o mais recôndito do interior agoniado e carente. Armamos nossas próprias armadilhas e nos tornamos presas fáceis pela fragilidade da estima que míngua sem nos darmos conta.

 

A rendição quase incondicional do vexame a que nos entregamos leva a acreditar que a presença circunstante que apareceu pode cuidar, curar ou anestesiar a dor que supomos única  é insuportável. E nem é. 

 

Falar assim, desabafar assim remete ao ataque de vitimização que nos expõe ao ridículo emocional que nos permitimos — vai ver, conscientemente. Melhor seria, descobrimos depois, chorar sozinho, gritar, espernear, abafar no travesseiro, lamber as feridas no escuro e não mostrar as cicatrizes. Deixar que elas sumam sem que ninguém se dê conta. 

 

Essas passagens, esses momentos, fazem parte do pacote quando assumimos as aventuras que espreitam a cada curva das estradas que se mostram ao longo das escolhas que atraem, embriagam e fascinam. De repente, tudo não passou de uma ilusão, uma  quimera, fantasia impossível de se materializar. O preço dessas ilusões, desses sonhos, pode custar caro quando acordamos para a realidade do amanhecer, quando a luz invade o quarto e a cama está vazia e nem um bilhete de despedida foi deixado. 

 

É preciso coragem para encarar o espelho e o que ele diz na nossa cara: você perdeu. Aliás, nem ganhou. Foi só aquilo e foi passageiro. De pouco adianta prometer-se que não vai deixar que aconteça de novo. Como? Já aconteceu antes. Faz parte. Vazios pedem preenchimentos, outras cores, caras, perfumes, sonhos, tudo parecido, quase igual. Catar palavras, escolher as mais sinceras para reclamar, plantar raivas ou ódios tem pouca valia. As flores são feias, cheiram a arrependimento e não servem para colocar em jarro e esperar que murchem. O tempo não tem tempo para perdas de tempo inúteis. A fila anda, é vida que segue.

 

 Repetições precisam ser assumidas porque os vazios não podem permanecer sem formas para sempre. Cada outra metade joga seu jogo e as cartas marcadas não ligam se você joga honestamente. O coração não tem cara; só responde com apertos, soluços, vontade de correr, de sumir. “Que jogo perverso você jogou, puxa! Que azar o meu… Que coisa feia de fazer. Tomara que você receba o troco com a mesma altivez com que recebi essa paga. Nem sabia que estava devendo….” 

 

Ninguém deixa ninguém, essa é a verdade. As pessoas se abandonam, vão embora largando malas de dúvidas porta afora. O mundo sempre esteve em chamas… Eu sabia, sentia o calor, mas eram as chamas dos infernos diários que assumimos o risco de enfrentar. Não se trata de reprisar, choramingar, fazer drama, querer colo ou cama. Não, escrever faz bem. A gente escreve e descobre nas palavras retalhos de outras histórias e se acomoda dentro da mesmice da qual é difícil fugir, escapar, mas não é impossível. Essa é a alternativa do difícil. Sofrer por amor é para os fortes.

EM ALGUM LUGAR DO MUNDO

por A. Capibaribe Neto

 

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Milhões de coisas estão acontecendo em todo o mundo. Algumas são notícias. Outras, são inventadas para atender aos interesses de uns ou para prejudicar outros. Em algum lugar do mundo, existe um tolo pensando que é inteligente e um inteligente se fazendo de tolo para melhor passar. 

 

Existem pesquisas sobre quem já ganhou e na outra ponta, quem já perdeu, mas festeja andando de motocicleta. Existe uma Simone que não canta, mas conta em contos que um por cento pode se transformar como contam, em outros contos ou cantigas que pães foram  multiplicados mas já faltam à mesa dos pobres.

 

 Em algum lugar do mundo, existe um louco querendo explodir o mundo para depois semear o trigo na terra encharcada de sangue de inimigos e compatriotas. Em algum lugar do mundo, tem gente aplaudindo um Pabbbblo com “bês” a mais porque é chique, mas esse Pablo é cafona e é feio.

 

 Existe uma corte que é de morte, mas tem sorte porque come camarão, faz beicinho, bate o pezinho, e distribui horas - e não são extras, para fulano fazer isso, beltrano fazer aquilo é ai de quem não fizer. 

Em algum lugar do mundo, comunistas se banqueteiam e pregam ramadã todo dia para o gado que nem muçulmano é. 

Em algum lugar do mundo, um papa começou a desmoronar porque suas pernas estão mais fracas que as colunas de sua imensa casinha sagrada de onde ele faz pedidos que nunca são atendidos, abençoa multidões, beija criancinhas e começou a ficar senil. 

 

Em algum lugar do mundo, milionários ficam mais ricos e começam a gastar dinheiro por diversão, enquanto outros, nesses mesmo lugares, bajulam seus padrinhos e, esquálidos e mal nutridos, se banqueteiam com o pão que o diabo amassou recheados com mortadela. Do lado de fora, uns gritam “Fora Fulano”, “Fulano Livre”, mas mesmo livre  esse fulano não tem coragem de sair às ruas.

 

 Em algum lugar do mundo, os intransigentes ficam cada vez mais radicais e intolerantes. Em algum lugar desse mesmo mundo, uma corte inteira fica nua por conta de uma “pulseira” de pé que um falastrão disse que não usa e parece que não vai usar mesmo. Um João de Deus escolhe onde que vai pagar a pena, não morre porque não saberá como ressuscitar e acredita que não terá contas a prestar com o verdadeiro arquiteto desse mundo que não deu certo. 

 

Em muitos lugares do mundo, a gasolina sobe, o dólar faz bacanal todo dia, o Putin faz beicinho, manda soltar mais bombas, faz finta que vai destruir o mundo. Em algum lugar do mundo, uma rainha acordou com dor de barriga e não deu nem tempo de chegar ao banheiro do castelo; o Fortaleza deixou de ganhar, “influencers” influenciam pessoas a comprarem o que elas dizem para ganhar o que elas não precisam comprar. Em algum lugar do mundo, o Trump continua Trump, o Biden aparenta não saber mais quem ele é e quando fala parece que está rindo, mesmo falando de desgraça.

 

 Em algum lugar do mundo, eu vejo pela minha janela, que o número de carros diante da casa de farra da Senador Virgílio Távora está diminuindo, porque em algum lugar do mundo a mesmice começou a enjoar, a encher o saco. Em algum lugar do mundo começa a faltar inspiração para falar de amor, de estrelas que de há muito foram esquecidas.

Apenas uma vaga lembrança

por A. Capibaribe Neto

 

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Ainda tenho bem nítido na memória... 

 

 "Vê se pode chegar mais cedo..." Lembro que fui quase indiferente ao responder "ok". Havia saído depois do café, de cara amarrada pelo desentendimento, noite anterior, que se prolongou até os argumentos perderem a força; nem lembro a razão. Virei para um lado e resmunguei um "boa noite" entre os dentes. Abracei-me ao travesseiro e inventei um sono que custou a chegar, mesmo cobrindo os olhos com o lençol. 

 

Almocei sozinho em um restaurante. Lembrei que havia escrito, certa vez, que nada era mais triste que uma pessoa sentado a uma mesa almoçando ou bebendo sozinho. Eu era isso. Eu fui isso. Não há como sorrir e o único lugar para fixar o olhar é o prato ainda vazio, a taça ou um ponto imaginário qualquer sobre a toalha à procura de um pensamento, uma lembrança, uma desculpa, sei lá.


Quando cheguei, abri a porta sem fazer barulho... estava tudo escuro, mas uma luz suave vinha do quarto e trazia o som de uma música que sempre escutávamos bebericando uma taça de vinho insinuante: um adagio in G Minor, de Tomaso Albinoni.

 

 Meu coração serenou, devo ter sorrido com os  pensamentos bons. Ela estava sentada sobre a cama, passando um pente nos cabelos ainda molhados. Encostei-me na moldura da porta e fiquei ali, passando páginas imaginárias dos primeiros momentos depois da conquista, da aproximação, das confissões coincidentes dos apaixonados. Lembrei da timidez que reprimiu, por pouco tempo, um monte de vontades audaciosas antes do bote do primeiro beijo. Beijos assim são catalizadores que fazem explodir os portões que se escancaram para tudo que vem no pacote. Dali para um abraço, para o mergulho no pescoço, os sussurros, no calor crescente, era só um atimo de tempo.

 

Depois, nunca virou rotina, era sempre bom. Os diminutivos vieram lentamente e viraram hábito; "meu amorzinho, dá um beijinho, um abracinho, quero fazer amorzinho, ai, que delicinha...!" Tudo muito bom demais! E naquela noite, a arenga da noite anterior saiu pela porta de trás e até pareceu com a emoção do primeiro encontro. Voltei até à sala, catei duas taças no bar, abri uma garrafa de vinho e voltei para o quarto. A luz do abajur dourava-lhe a nudez descoberta pela toalha cúmplice que caíra sobre a cama. Pigarreei... - "Oi, chegou? Faz tempo que está aí? Não
vi você chegar..." Achei a mentirinha uma graça. Apenas ri. Enchi as taças. Brindamos cinicamente; eu ainda vestido e ela sentada com a toalha a servir como um pedestal perfumado.

 

Tim-tim, um olhar de baixo para cima, olhos pidões e com os lábios molhados pelo primeiro gole, disse: "dá um beijinho...!" e me puxou. Depois desse momento, os anos correram apressados.

 As promessas de "para sempre" foram atropeladas por surpresas, desgastes de muitas mesmices, crises, sem falar na falta de paciência para as TPM's miseráveis que a transformavam em fera de olhar fulminante que me apontavam para o sofá onde dormi muitas vezes, com a paciência por um triz.

 

 Lembro, com todos os sons alterados, de uma vez que sai batendo a porta e fui dormir num hotel para não procurar onde um homem guarda a sua TPM e revidar. Quando descobri a magia do chocolate, já foi bem depois e não estávamos mais juntos. O começo ficou muito lá atrás; o meio da história se perdeu no amontoado de tempo que nos engoliu e o fim, chegou depois. Tempo demais já passou...

 

A coleção de anos perdeu a graça, a solidão passou a ser a melhor companhia para escutar as lamentações, conviver com os arrependimentos mais sinceros e as saudades sem jeito de cura. Os muitos "para sempre" cederam lugar às realidades da vida, cheia de surpresas. Aos poucos, aquela noite da última nudez foi perdendo a nitidez porque a fila andou e a vida seguiu. Ficou tudo guardado com o maior respeito em alguma imagens coloridas já desbotando e alguns bilhetinhos apaixonados com a letrinha cheia de diminutivos de beijinhos, abracinhos, e outras coisinhas.

 

Pois bem, no meio dessa semana, fazendo a derradeira mala com muitos capítulos da minha vida, encontrei a foto que fiz naquela noite. Peguei-me quase em transe, procurando nitidez para o rosto dela, restos de perfume com o qual ela costumava se vestir para me esperar; fechei os olhos para imaginar a maciez da morenice e ainda encontrei alguns retalhos dos arrepios com o cheiro de Amarige; ou era Trusssardi? Aquelas imagens nítidas, de formas bem recortadas em todos os côncavos e convexos, os pelinhos da nuca, o pecado arfante do decote generoso, o tempo perverso se encarregou de borrar. Melhor assim do que sofrer com lembranças sem sentido e saudades que perderam a razão de tirar o sono. Aquela noite de boas vindas de volta eram agora apenas uma vaga lembrança...

 A Desculpa do Cisco

por A. Capibaribe Neto

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“Diamonds and Rust” é a música que Joan Baez escreveu sobre seu relacionamento com Bob Dylan.  Baez não era um grande compositora; ela era uma grande cantora, mas “Diamonds and Rust” foi uma exceção. É um conto tão pessoal com detalhes únicos que ajudam a dar vida à história com observações universais que solidificam a música como aplicável a qualquer relacionamento. 

 

Dez anos após a separação, Joan recebe um telefonema de Dylan.  É aleatório: do nada.  Isso traz uma enxurrada de pensamentos e emoções.  O que ela quer dizer com "Diamonds and Rust"?  Bem, algumas de suas memórias dele envelheceram como diamantes, algumas como ferrugem.  Sua descrição do ataque de seus sentimentos e sua lembrança de seu relacionamento são ótimas composições. Eles decidem se encontrar depois de todos esses anos.  A cena é descrita em uma das melhores pontes de todos os tempos: a princípio é tão mágica quanto os filmes.  Sua descrição é poética.  Todas as memórias amorosas passam por ela.

 

 Quem se dedica a catar palavras, arrumando-as com carinho, dando-lhes sentido, buscando as que venham da alma, do fundo do coração, transformando-as numa poesia, num canto, num conto; fantasiando, criando, inventando o que poderia ter sido e lamentando o que não foi, vira desafogo do peito, acaba com o engasgo, o soluço, é quase uma confissão ou isso mesmo, uma confissão de culpa pela bobagem que interrompeu a melodia do amor. 

 

A canção Diamonds and Rust é comprida e Joan se confessa, diz do jeito de ser de Bob Dylan, não esconde seu débito no desenlace e lá no fim, como que passa uma régua para fechar uma conta, Joan Baez encerra dizendo “eu já paguei por tudo…”. Toda culpa é ou deve ser dividida por dois; basta pedir meio perdão e esperar que a outra metade seja sensível e se chegue para acertar o saldo.

 

 É preciso se aprofundar na hermenêutica das declarações de amor para descobrir o significado nas nuances das palavras; Diamonds and Rust - Diamantes e Ferrugem significam exatamente isso: Diamantes são para sempre como deviam ser as promessas que muitos fazem nos “para sempre tua/teu”; que nada! Na maioria das vezes, essas palavras enferrujam e viram areia. O vento leva com facilidade e um simples grão pode chegar aos olhos, arrancar uma lágrima e fica a desculpa do choro como “foi um cisco…”. Cisco que nada!

 Tanto sofrimento por nada

por A. Capibaribe Neto

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Tenho aproveitado algumas noites insones, por conta da moda dos ruídos desrespeitosos que varam madrugadas impunes. Jovens que chamam a atenção de seus pares ou de mocinhas sem noção, com as descargas modificadas, potencializando o som que fabricantes tanto investiram para serem silenciosas. Os rapazes afoitos, fazendo de suas motocicletas um cartão de visita de suas masculinidades comprometidas, são uma versão mais pobre dos que podem fazer de seus carrões rebaixados, com escapamento também adulterados e arrancadas exibicionistas diante de bares e casas noturnas, tipo para mostrar “olha eu aqui!”. Ninguém diz nada, ninguém faz nada, as blitzes não se ligam ou ligam para esse desrespeito até diante de hospitais. 

 

No Rio, uma “autoridade de respeito”: a chefia do tráfico, foi enfática: proibiu esses incômodos, incluindo no pacote a exibição de motoqueiros que empinam suas máquinas pelas ruas. A farra ali acabou, porque ordem de traficante sabe se fazer respeitar. Infelizmente é assim. 

 

Esse tipo de conduta da juventude de periferia, que hoje se confunde com a juventude das Ferrari e Lamborghini e gosta de fazer barulho para se exibir tem a cumplicidade dos pais, convenhamos. Não temos a pretensão da caretice ou de limitar o direito de ninguém a se expressar. Idiotas e imbecis também têm direito, mas o direito de um acaba no direito do outro; o direito ao silêncio ou ao mínimo de decibéis desnecessários diante de suas casas onde dormem crianças, pessoas que trabalham no dia seguinte bem cedo, pessoas idosas com sono frágil e aqueles com suas comorbidades e mazelas da moda. Tempos estranhos!

 

As saias curtas (curto demais, não sou hipócrita), principalmente aquelas na altura do cinto, os biquinis incríveis que respeitam as novas leis (“minha bunda, meu corpo, meu biquini” - só não pode olhar, porque aí, é assédio; já perderam a graça, assim como a exibição das barrigas trincadas, os tanquinhos dos rapazes que escrevem “nadaver”, com a maior naturalidade. 

 

Sejamos honestos; as mocinhas (grande parte, não se ofendam as exceções), já fizeram de tudo para animar a rapaziada: muitas alardearam que não usam mais calcinha, aboliram o sutiã, aumentaram o decote, mas nada, o que excita os jovens de hoje, é o barulho. Muito barulho. Nada chama mais a atenção do que as arrancadas, as empinadas das motos, as camisetas coladas na pele e as conversas sobre física quântica que entabulam nos grupinhos só de “alfas”, pois bem! Inveja? Não, por caridade. O desrespeito merece respeito e ai de quem desrespeitar! 

 

O Brasil está sem tesão. Leia-se: sem ânimo para nada. Não existe mais homem, não existe mais mulher, existe o que se escolher ser quando for conveniente. Não existe mais esquerda, não existe mais direita. Agora, é o centrão, o umbigo, em torno do qual o Brasil gira na visão de muitos. Já não conheço o Lula, não conhecia o Bolsonaro. Tinha uma Playboy com a Thammy na página central, linda! Hoje, a Thammy não é mais a Thammy, mas continua sendo a Thammy e é pai. Qual o problema? Nenhum. Pode. Tanto pode que tem barba, tem direitos assegurados e é boa gente.

 

Estou fazendo um curso no Nepal para encarar com naturalidade o Pablo Vittar, não a produção que esconde o que ele não liga esconder. Meu problema é com a voz dele. Tem a Anitta, deixando rastros mundo afora com o que tem de mais valorizado, incluindo aí uma dolorosa tatuagem.  Hoje é muito normal, aceite-se. Meu saldo de futuro, não escondo, está ficando cada dia mais minguado. Quer ver? Ela cobra em dólar.

 

Enfim, eu pretendia ser eterno, para ver o que ainda tem por vir, fiz um curso, tomei remédios, mas não passei na prova, o processo continua sem dó. Queria deixar rastros para serem seguidos... Aloprada pretensão! Vai ficar nada! No máximo, fotografias desbotadas, textos ultrapassados, nem lápide. Escolhi retornar ao pó. Está escrito, tem valor legal. Jesus deve estar muito triste, decepcionado e quiçá arrependido, por ter padecido tanto na cruz por tudo isso que nunca imaginou.

 Fotografias na Festa da Chuva

por A. Capibaribe Neto

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Já conheço o que significa o aviso do vento que, do nada, entra pela janela. Olho pra fora e o céu está entre cinza claro e chumbo. “Vai chover pesado…!” – digo aos meu botões. Fico esperando.

 

As previsões do tempo são muito críveis nesses tempos de tecnologia. Muito difícil falhar. E fico-me ali, atrás da vidraça olhando a cortina d’água que chia sobre a cobertura de alumínio da loja de pneus. Logo, a chuva mostra as gotas grossas que faz o asfalto virar riacho na avenida lá embaixo e as luzes dos faróis dos carros brincam de branco quando veem e vão embora no vermelho que se contorce atrás dos rastros espumantes das rodas.

 

Sinto vontade de sair pra rua, viver a emoção do cenário que tem se repetido dia após dia.  Venço a dúvida, visto um moletom, um casaco, pego um chapéu e a câmara fotográfica, desço à garagem e vou pra chuva. Sair debaixo de uma chuva forte assim para fotografar pode parecer loucura mesmo, mas é uma aventura gostosa, principalmente quando se está disposto a se molhar.

 

Segui pela avenida larga e fui até à Praça da Imprensa. O asfalto molhado, parecia um espelho d’água enrugado pelos pingos brincalhões que se exibiam para para as minha lentes. Estava molhado da cabeça aos pés. Os poucos circunstantes não entenderam a minha loucura fotografando debaixo de chuva. Nem liguei, eram as minhas imagens que importavam e me faziam feliz com as luzes da praça se exibindo sobre as folhas das árvores, em um balé sincronizado.

 

Abriguei-me na banca de revistas, em frente ao Mercadinho Japonês para limpar as lentes e foi ali que numa fração de segundo fiz a fotografia que me remeteu a uma lembrança, quando apertei o disparador para guardar a imagem da mulher, já curvada sobre o peso dos muitos anos que carregava sozinha.

 

No curto espaço de um tempo em que me virei para enxugar a lente, ela  sumiu como por encanto, mas pareceu-me deixar no ar a voz cuidadosa da minha mãe dizendo para o menino que fui um dia; “sai dessa chuva, menino…!” E foi o que fiz.

por A. Capibaribe Neto

Um olhar de atrevida inveja

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Eu pensei, imaginei, achei, verbos nesses pretéritos perfeitos, remetem a dúvidas que, quando dissipadas, levam a uma certa confissão de culpa silenciosa, mesmo quando conjugados em conjunto diante do que quer que seja. Pois bem...

 

Ambientes públicos são palcos, cenários ou passarelas por onde atuam, se apresentam e/ou desfilam pessoas as mais variadas. São destaques, chamam a atenção aquelas que se impõem pela apresentação dentro do figurino certo, beleza, elegância, postura e todo um contexto onde elas se inserem na aura perfumada de suas fragrâncias preferidas. Às vezes, é preciso explicar direitinho para fazer sentido.

 

A noite já havia começado e mal dera tempo de assimilar o ambiente novo. As primeiras taças já haviam sido sorvidas, quando ela chegou. Sempre existe uma “ela” que se destaca. Chegou, olhou em volta e ficou-se ali, parada no meio do salão até o garçom abordá-la perguntando o óbvio. Com a resposta, também óbvia, ele a conduziu a uma mesa, etc. e tal. Chamou a atenção, depois de todas as atenções, que ela em si chamou.

 

Fez-se estranhar o fato de que a mesa escolhida só tinha uma cadeira. Ora, a moça era especialmente linda, mas estava só. Chamá-la só de bonita seria sovinice com adjetivos superlativos. Vestido curto, na moda, curto como manda a moda em evidência, bem ali, no meio das coxas alvas encimando as pernas bem torneadas, que acabavam dentro de um par de sapatos de salto alto, feito pedestal para o destaque de todo o resto. A partir da cintura, contida em um cinto fino. Acima dele, como uma fronteira, para cima, um busto sem exagero, debruçado na janela de um decote onde o conteúdo rosado respirava sem pressa, num arfar contagiante. Colo impecável, sem joias ou bijuterias. Não carecia. Boca, lábios, nariz, olhos, cílios, sobrancelhas, tudo absolutamente perfeito.

 

Sentou-se, cruzou as pernas com elegância e permaneceu ali, bebendo um copo d’água. As primeiras impressões foram as de que estaria esperando uma companhia. Não recebeu chamada, não fez ligações nem consultou o aparelho chato. Não demonstrou ansiedade, nervosismo, nada. De volta à nossa vida, em volta da mesa, nós, mortais boquiabertos, retomamos a conversa sobre o novo vinho escolhido, admirando a cor rubi contra a luz. O buquê remetia a frutas com pitada de flores, madeira, sei lá. Ao fazê-lo passear sobre as papilas agora exigentes, permitia uma agradável sensação sem afetação. Não se tratava de um vinho exibicionista, mas agradava, inclusive pelo custo benefício. Bebericar algumas taças uma vez por semana fazia bem ao espirito, a alma e fazia-nos gargalhar sem alarde, sim, porque seletas companhias sempre descontraídas e divertidas, são o recreio noturno para as preocupações em meio às preocupações e a certeza do resto das poucas margens de tempo que sobravam para o grupo.

 

Aqui e ali, eu olhava com a devida discrição para a mesa da moça que continuava elegantemente solitária, mas mais linda ainda. Cheguei a comentar que nada é mais triste que alguém sentado a uma mesa de restaurante sozinho, mas a moça linda, era, até ali, uma incógnita na moldura de uma talvez espera. Notei que já se havia passado quase uma hora principalmente porque notei que o relógio já consumira quase uma hora e ela permanecia elegantemente diante de um copo com água. Era imperioso, dentro da minha expectativa, que ela estivesse esperando alguém. Ninguém entra em um restaurante como aquele, tão deslumbrantemente linda e elegante, para pedir um copo d´água. Quase deixando a curiosidade sobre a moça lindíssima de lado, mas solitária, ao pedirmos a conta, eis que senão quando, chega um descortês que a fizera esperar. Ninguém, em sã consciência, deixaria uma mulher tão lindissimamente bonita à espera, mesmo  por apenas absurdos minutos. Não imagino o que lhe tenha dito antes de arrancar dela o mais lindo dos sorrisos. Depois, beijou-a com discrição, afagou-lhe o rosto e ficaram os dois olhando um para o outro.

 

Levantamo-nos e seguimos em direção à saída. Ao passar pelo dois, olhei-a de relance e ela talvez não tenha notado a aura de inveja atrevida que me envolvia.

Fugas Impossíveis

por A. Capibaribe Neto

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Acredito não ser dificuldade apenas minha, pois já escutei coisa parecida numa conversa descontraída; a dificuldade de afastar um pensamento ou uma lembrança. 

 

De repente, no meio do nada, caminhando pela rua, num restaurante, num bar, onde for, um rosto que aquietou-se no passado ou que fez lembrar o verdadeiro, desabotoa o peito e abre a caixa onde escondemos o que restou de histórias que deixamos de fazer parte delas. Ou saímos por conveniência ou fomos deletados delas. Pode ser coisa repetitiva, mas a vida é cheia de replays, mesmo que em outros contextos. 

 

Somos a soma dos nossos sonhos, expectativas, erros, acertos e, o pior: detidos os arrependimentos. E falando neles, em alguns até conseguimos colocar um remendo e seguir em frente. “Vida que segue, porque a fila anda”. Precisa ser assim mesmo porque o tempo, feito a maré, não espera por ninguém, não tem jeito.

 

 Ficar roendo a corda ou amofinado –  sinônimo de amargurado, tristonho, não resolve ou muito menos cura. Aí, vem o acaso. O rosto da festa de um dia aparece sem precisão, sem convite e explode em cores vivas, em cheiros, em lugares que nem existem mais ou em um edredom que esteve guardado, num lençol  cúmplice. Você fecha os olhos, sacode a cabeça tenta apagar aquela verdadeira “cabeça d’água” descendo com violência paz abaixo. Se você está só no flagrante, ainda disfarça o engasgo, o soluço o ar apatetado, o bater no peito, a lividez instantânea do rosto, mas se uma nova realidade está ali, segurando a sua mão numa caminhada despretensiosa, é impossível esconder a mão que ficou gelada de repente.

 

 Viver é uma aventura cheia de surpresas, desde o primeiro momento, passando pelas primeiras paixões e emoções dos primeiros beijos, abraços e pelo resto dos scripts que o destino nos impõe representar. Nada é para sempre, mas é fácil acreditar, principalmente quando se é humano de primeira viagem.

 

 Já escrevi muitas vezes sobre as promessas de “para sempre tua” ou “teu para sempre”; muito filme já visto, reprise e não adianta reclamar. Se acabou, já era. A fila anda, digo outra vez e reforço,tanto numa direção como na outra. As filas são muitas e as opções, as mais variadas. O que incomoda são os contextos. Em toda separação tem o que não queria sair e o que não queria mais ficar. Cada cabeça é uma sentença e uma escolha. E aí, como estava dizendo, aquilo que já aconteceu e não pode mais deixar de ter sido e sumiu deixando mágoas ou malas de tristezas, foi adormecendo e aquietou-se, mas sem aviso, acorda tudo, feito uma topada ridícula e você fica refém do susto que vai custar a passar. Não se tem para onde fugir, não tem escapatória, são as chamadas fugas impossíveis, aquelas que nos são impostas pelas lembranças que fazem uma falta danada.

De repente, booooooommmmm!
por A. Capibaribe Neto

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Ainda em plena reverberação da onda de indignação com as falas malcheirosas do deputado Arthur do Val, o tal do “Mamãe, Falei…M…”, em plena guerra do Putin contra o resto do mundo através da Ucrânia, assistimos impávidos, ao vídeo exibido pelo presidente da Ucrânia para o Senado americano.

 

Os aplausos consistentes, as reações lacrimosas de alguns presentes ficaram de certo modo apenas nessa solidariedade. Poucas providências à altura das agressões foram tomadas. 

 

É bem verdade que, mesmo sendo um grupo forte (OTAN), partir para uns cascudos no dono da Rússia seria transformar a emenda muito pior que o soneto, como a zona de exclusão do espaço aéreo sobre a zona do conflito. Essa providência valeria para ingresso num cenário de medição de forças cataclísmicas. Seria o avião do país agressor e intransigente decolar para bombardear o resto do mundo e quando retornar não encontrar mais nenhum campo de pouso porque não encontraria mais o próprio país. Absurdo, para dizer o mínimo, imperdoável e inimaginável. 

 

O pior, nesse cenário difícil de conceber são as torcidas, especificamente as tupiniquins, as nossas. Escolhas, preferências, diversidade de gostos escolhas são direitos inalienáveis, não restam dúvidas, mas torcer pela vitória do criminoso, é meio muito. 

 

Nesse contexto, fica impossível passear pelos campo de aparente paz e tranquilidade as margens do lado de cá do Atlântico escrever sobre amenidades até mesmo as consequências de amores desfeitos e rituais de quem rói as cordas de uma separação difícil de digerir.

 

 Pessoas que podiam desfrutar de bons vinhos, champanhes ungidas, caviar, patê de foie gras e outros que tais, independentemente do preço da gasolina, do botijão de gás ou outras insignificâncias, voando em primeira classe, estão de castigo. Pode-se até aceitar sem muito choro, a perda de uma mala da Louis Vuitton ou Prada, mas ninguém temida de reserva para arriscar. 

 

Confesso que estava querendo repetir a incoerência das minhas duas viagens ao Afeganistão sozinho, sem o respaldo de nenhum jornal, mas quando vi as notícias sobre a morte de repórteres no cenário dessa guerra estúpida, a aforteza pediu licença e sossegou o facho, principalmente diante do radicalismo, intransigência brutal que prefere torcer pelo “criminoso de guerra”, segundo o “mocinho” Biden. Não, hoje não é dia de ser romântico ou engraçado,hoje é dia de medo. Muito medo. De repente, booommmmm!

Pronto, mamãe, falei... BESTEIRA!
por A. Capibaribe Neto

 

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Para: Elza Moledo de Souza

Prezada Senhora,

Ainda bem que, desde 2013, a senhora apartou-se do seu Manoel e os motivos não são da conta de ninguém. Mas, como não existem ex-mães, a senhora continuou sendo a mulher que trouxe ao mundo três filhos, dentre eles, Arthur.

Imagino a sua alegria ao amamentar o primogênito,  trocar-lhe as fraldas, velar cada noite nas menores febres e vê-lo crescer até ouvi-lo dizer “mamãe…!”. Com o passar do tempo, o menino começou a construir mais frases e até deve ter falado muitas coisas engraçadas, até que um dia…

 

É aqui, dona Elza, justo na semana quando se comemorou o Dia da Mulher, que, ao meu sentir, deve ser todo dia. Aquela que nasce mulher, será sempre mulher, embora devam-se-lhe assegurar todos os direitos de assimilar e assumir mudanças na sua essência e mesmo até de mudar seu desenho para o que mais lhe convenha, a partir de como se vê, como se sente e como quer ser tratada: com respeito e dignidade.

 

Retomado o rumo dessas mal traçadas linhas; além do Dia das Mães, que será comemorado mais à frente, a festa foi para a mulher, especificamente para ela: o Dia da Mulher!

 

Diz-se que os pais devem criar os filhos para o mundo e o mundo é uma imensa paleta de cores, cardápio de sabores e elenco de destinos. Seu filho Arthur, por exemplo, escolheu visitar a Ucrânia e foi visitá-la logo agora, no meio de uma guerra sem sentido (nenhuma guerra faz sentido, diga-se) e viu de perto a desgraceiras da destruição, da tristeza de milhares de pessoas abandonando seus lares, sob frio e debaixo de chuva e neve, fugindo de uma invasão bárbara, do barulho de sirenes avisando a chegada de bombas covardes, o matraquear de metralhas, explosão de mísseis.

 

Arthur esteve nesse cenário e lá, viu de perto crianças carregando seus medos abraçadas a ursinhos de pelúcia; viu idosos caminhando com dificuldade, arrastando suas comorbidades, viu muita tristeza, sofrimento estampado no rosto de todos, sem distinção. Arthur viu voluntários ajudando esses visitantes impostos a outras fronteiras pela necessidade de sobreviver e proteger seus entes queridos. Arthur viu gestos de tocante solidariedade de poloneses e voluntários solidários. No meio desses retirantes, viu mulheres jovens e bonitas, igualmente vítimas do terror e que também deixaram para trás seus namorados, noivos, maridos no palco da guerra pessoal de um déspota: Vladimir Vladimirovitch Putin! 

 

Dona Elza, Arthur, seu filho, viu tudo isso e depois voltou. Voltou e comentou o que viu numa síntese absurda e revoltante que chocou até mesmo seus “parças”, com essa frase machista: “as mulheres ucranianas são fáceis porque são pobres”.

 

Falou o Arthur Moledo do Vale, deputado estadual, conhecido por “MAMÃE FALEI… a coisa mais absurda que demonstra a falta de carater e humanidade. Foi condená-las ao campo de concentração da falta de vergonha, de caráter, pudor e um mínimo de humanidade.

 

Nenhuma mulher merece dar à luz a um ser humano e depois vê-lo transformado nessa escuridão de valores.

 

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Novo Círculo de Promessas

por A. Capibaribe Neto

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No auge das grandes paixões, quando tudo tem as cores que ficam mais bonitas, segundo as batidas de cada um dos corações cúmplices, é muito bom dizer, sem medir consequências, sem censura, correndo os perigos das queimações dos desejos intermináveis, as loucuras dentro das alcovas, permanentes ou circunstantes, aquilo que ditam os segundos, os minutos e as horas desses encontros: “eu te amo”; essa frase é forte, larga, profunda e assume-se, nesse momento, as responsabilidades desse ímpeto. Todos e tudo tem tudo para parecer verdadeiro, mas nem sempre é.

 

Remete-se a uma pretensão de eterno, mas nunca é. Aceita-se até como duradouro e muitos são, principalmente os mais antigos, quando as coisas e as relações eram mais simples. As exceções de alguns envolvimentos mais firmes transformavam cada dia desses presentes numa visão e esperança felicidade contínua. Descartar a convivência de uma vida inteira, cheia de histórias vividas ou imaginadas, dá um trabalho enorme e quando se pensa que tudo se transformou em fotos rasgadas ao meio, bilhetes e cartas apaixonadas em cinzas, encontrar, de repente, no fundo de uma gaveta que se esvazia, o retalho de um capítulo de um livro esgotado pelo desinteresse, pela importância que foi se perdendo aos poucos: um pedaço de papel com uma declaração, uma promessa.

 

Aí, numa fração de segundo, tudo volta no tempo e é possível ver o momento exato que deu origem à mensagem. Por um instante, perguntas silenciosas são feitas e jogadas no espaço generoso das suposições. E “se”? Pouca valia. O futuro chegou antes, veio depressa demais, a corda foi esticando para depois ser roída sem jeito. As promessas e esperanças foram crucificadas, as decepções escancaradas, as cobranças jogadas na cara sem piedade. 

 

Depois, quase sempre, a vergonha das culpas assumidas, fazem fechar a cara e a porta para a humildade.  A vida, infelizmente, para esses casos, é dinâmica e sem paciência, as emoções cínicas, volúveis, intempestivas, circunstantes, mas igualmente e infelizmente, passageiras. 

 

E aí? Nada de tudo aquilo era tão eterno assim. Agora, nesse novo presente magoado, ferido, aquelas mesmas declarações apaixonadas fazem as malas, mudam de endereço e ensaiam, com pitadas de despeito, novas paixões, um novo círculo de promessas de para sempre “teu/tua” com arremedos de eternidade.

 

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O CAMINHO DE VOLTA

por A. Capibaribe Neto

Ao longo da minha vida, desafiei muitas distâncias, fronteiras e lugares, não para exibicionismo ou para provar ou provocar simpatia. Escolhi lugares diferentes porque o comum nunca me atraiu. 

 

Escolhi Akureyri, por exemplo, que é uma cidade da Islândia com aproximadamente 17 mil habitantes e localiza-se ao norte do país, na margem do fiorde Eyjafjörður, na província de Norðurland eystra. É a quarta maior cidade do país, depois de Hafnarfjörður, Kópavogur e Reykjavík. Akureyri, fica às margens do Mar da Groenlândia e que, durante o inverno, época que fui, para o simples ato de atravessar uma avenida, deve-se usar um carro, tamanho é o frio potencializado pelos ventos polares. 

 

Lembro que me aventurei a caminhar pela avenida que margeia as águas gélidas da Marina e dos olhares curiosos para esse homem maluco a caminhar sem as devidas proteções com roupas adequadas, fotografando o lugar. 

 

Ora, quase nunca me preocupei com esses detalhes por onde andei. Meus olhos sempre se voltaram para a beleza desses lugares para onde dificilmente voltaria, mesmo em outras estações do ano mais simpáticas. Quem ouviu falar ou se programou para visitar Pyhä, um resort que fica acima do Círculo Polar Ártico, na Finlândia?

 

 Pois eu fui, num trem noturno de Helsinque até lá, sozinho e foi de lá que vi as cortinas de luz dançando no céu gelado de janeiro: as fantásticas luzes dançantes da Aurora Boreal! Quem já se atreveu a subir uma duna dourada, bordada pelos ventos mornos de um final de tarde no deserto do Saara e deixar rastros de uma aventura solitário, no Marrocos? Eu fui até lá, sozinho. No sopé dessa duna, ficou meu saudoso amigo Hélio Passos. Que visão, a de uma tempestade de areia percorrendo o horizonte distante do alto dessa mesma duna! 

 

Quem, já se sentou perto das águas modestas de um oásis, nesse mesmo deserto e viu uma noite fria, de céu estrelado ser a paisagem para o melhor som do silêncio? 

 

Escolhi esses caminhos e de lá meu espírito retornou feliz e depois, refez sua mochila e escolheu outros caminhos, outras paragens. Quando senti que havia feito minha última fotografia nesses lugares fiz o caminho de volta para casa. Nunca esses destinos e muitos outros mais, despertaram receio ou medo do que enfrentaria nesses lugares exóticos.

 Minha preferência era por descobrir o tamanho dos desafios ao invés do comodismo do arrependimento por não ter ido. Encontrei uma placa à entrada de uma cidade aqui perto: “se você quer brigar, procure outro lugar”; fiz meia volta e comecei meu caminho de volta… Certos lugares não são impossíveis, apenas muito difíceis. 

 

Duas pessoas olham através da mesma janela: uma pode estar contemplando as estrelas, a outra, o campo. Li
Sinônimo de intenções · 1 metas, propósitos, intuitos, intentos, desígnios, finalidades, objetivos, sonhos, escopos, miras, fitos, alvos, objetos, tenções ...

 

Propósito: 1 ideia, plano, fito, fim, finalidade, objetivo, pensamento, programa, projeto, propósito. Desejo: 2 vontade, desejo, querer, desígnio, disposição, intento, intuito, tenção.

 

Interpretação é um substantivo feminino que caracteriza a ação ou efeito que estabelece uma relação de percepção da mensagem que se quer transmitir, seja ela simultânea ou consecutiva, entre duas pessoas ou entidades. ... A palavra interpretação pode ser substituída por sinônimos que variam conforme a intenção do seu uso.

 

 

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O APESTATO DAS ATITUDES

por A. Capibaribe Neto

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Existem portas que só abrem pelo lado de dentro. Também como essas portas, deveriam ser as pessoas. As mudanças dessas, tirante as lições aprendidas e assimiladas é que deveriam embasar suas atitudes e comportamentos, a fim de que houvesse mais coerência e justiça nos seus julgares. Costumo dizer, e a maioria das pessoas se espanta, que ninguém faz o outro feliz. 

 

Que história é essa? “Fulano/a ME faz feliz” — como? Felicidade é um estado de espírito e o espírito de que se encontra alegre, satisfeito, é uma coisa pessoal. A fome, por exemplo, você sente, vem de dentro pra fora. Não sentimos fome com o estômago; quem cuida dessa sensação desconfortável é o apestato, o que os fisiologistas dizem ser como um termostato que regula uma fornalha, ou o apetite da mesma. Pois esse atestado é que diz: você está com fome! Ter o que comer ou poder comer bem é outra coisa. Ninguém faz você sentir fome. Aliás, existe a fome do desejo, uma fome hoje cada dia mais restrita e cheia de mimimis, sim, estamos falando dessa coisa pobre e deselegante do homem troglodita que, sem a menor classe, diz “eu comi” essa ou aquela, principalmente por que quem, na verdade, que come é a outra parte (aqui, valendo-me dos últimos refúgios sem censura).

 

 Retomando; ninguém faz o outro feliz, o correto, convenhamos, seria “sinto-me feliz na companhia de fulano/a”, sim porque o arrepio ou as vontades veem de dentro, embora fulanos e fulanos às vezes ou com alguma contumácia finjam despudoradamente essas vontades e principalmente o revirar dos olhos ou os gemidos — esses, por sinal, são os mais votados para o convencimento ou ufanismo da parte contrária. 

 

Assim, todos os sentimentos originam-se dentro cada um, nós, os indivíduos. Dentro de nós tecemos teias, armadilhas, safadezas, construímos mentiras, inventamos desculpas, arquitetamos safadezas e por favor, não achem ruim ou reclamem, é assim mesmo.

 

Quando o roteiro das nossas vontades, desejos e sonhos estão no ponto é que abrimos essa porta e expressamos o bom, o melhor, o ruim ou péssimo com as nossas atitudes. É tudo de dentro pra fora. Conter-se é a última barreira que pode refrear uma insensatez, com desferir um tapa, um golpe, acionar um gatilho, contar uma mentira deslavada ou demonstrar coragem e falar a verdade, sem medo das consequências ou efeitos colaterais. 

 

O abrir dessa porta determina o que vai sair de você, como a confissão espontânea de dizer ele, ela, isso ou aquilo me dá uma sensação enorme de felicidade. Um Rolex, um Piaget, Calatrava, Prada, Luís Vuiton, sanduíche de mortadela, trinta dinheiros, tudo isso pode levar uma pessoa a se sentir feliz.

 

 Sentir-se! Repetindo, tudo de dentro pra fora. Quando existe a pretensão do cidadão/cidadã achar que faz uma pessoa feliz, basta ele/ela darem as costas e a verdadeira felicidade aparece. Insistindo: é uma especie de atestado moral que detona certas vontades de comer, inclusive finos pratos ou uma buchada.

Um amor por toda a eternidade

por A. Capibaribe Neto

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Chamava-se Maria. Era o que se chamava de encarnação da bondade, pureza, beleza e leveza no ser, no estar, no ficar, que não podia muito, porque o mundo tInha-lhe olho grande por gente que não dava bola pra muita gente, justo por ser diferente, saber fazer suas escolhas. E que bom e que sortudo que fui o escolhido, mesmo sabendo que só podia prendê-la no espaço pequeno do meu abraço sempre por pouco tempo. Eu adorava Maria, não nego e ainda me pego saudoso do tempo dela e tanto é o respeito que lhe tenho que sempre a carregava no peito como a melhor lembrança.

 

Hoje, a saudade dela não é mais de curtir na janela nem de chorar no campo grande da felicidade, agora ausente e que não existe mais. Tudo na vida — a gente sabia e até discutia, no bom sentido, tem um começo, um meio e um fim. Tivemos tudo isso.

 

Do começo, confesso, não lembro como foi; o meio, esse durou muito, não sei quanto, não contei, mas senti cada momento que sempre parecia-nos uma eternidade, embora quando menos esperássemos, já era hora de ir embora, sem demora, porque cada um de nós tinha a sua história e nos encontramos na coincidência de arrependimentos gêmeos, que não tinham mais jeito e foi o jeito pagar pra ver até onde ia o risco por aquela vontade louca de escrever a nossa história com tudo que era bom pra valer a pena viver e com as tintas do coração. A gente ria do medo de cada um e mais ainda se arriscava porque era intenso.

 

Tínhamos já uma coleção de ontens e a cada presente onde nos ausentávamos das fugas das nossas realidades para nos encontrarmos e escrever, cada encontro um conto de um presente de ouro. 

Teve o capítulo onde tomamos banho de Lua, vestidos de nada, enquanto ela deixava no ar um  rastro dos perfumes que usava, L’Insolente, Amarige, outros que nem sei, porque não comprei, foi ela que escolheu para me agradar e deixar grudado no meu corpo quando fosse embora. 

 

Uma vez espargiu um deles num cartão e nele escreveu: “para que te lembres sempre de que fui tua, tantas vezes nua, à luz da Lua, nas festas só nossas e das estrelas, onde morríamos de prazer e renascíamos em muitos beijos, de desejos e de tudo de bom, ao som das ondas quebrando lá na beira da praia".

 

Lembro da vez assim mesmo, irresponsáveis e afoitos, quando aproveitamos o som de um bolero que vinha de longe e dançamos na beira dessa praia, com a espuma das ondas beijando nossos pés.

 

Maria tinha medo que o mundo soubesse que ela ainda podia amar e estava amando correspondida, sendo feliz. “Que se dane o mundo, Maria…! O mundo nem ao menos chorou contigo, de verdade, pelo tamanho da tua dor, na perda do teu primeiro amor…!” — “Amor, meu amor, é o amor com que te amo, então é esse o meu primeiro amor…” E me fazia sentir feliz e como não ser? A gente descobre e se descobre quando nem vontade tinha mais de espiar lá fora, não via beleza nas coisas bonitas de qualquer lugar. Não tinha nenhuma saudade junta para sentir, por conta de tanto tempo procurando todo o tempo que deitamos fora. 

 

Foi nesse tempo que encontrei Maria. “E amanhã, meu amor?” – uma vez me perguntou… “ Amanhã, Maria, não chegou ainda, nem é de madrugada, ainda temos muita noite para abraçar e sentir o teu coração colado no meu, unidos pelo teu cheiro, pelo nosso suor. Na verdade, gente nunca sabe quando nasce um amor e seguramente não deveria esquecer quando ele acabasse. Mas não foi assim; um dia, Maria foi embora e não disse se voltava. E nunca mais voltou.

 

Era assim que estava escrito e foi assim que nos deixamos, como um livro que fechamos com carinho, depois que lemos  e gostamos muito, desejando que ele nunca chegasse ao fim. Foi em Maria que conheci um anjo, senti a sua essência na minha vida e mesmo depois que ela foi embora, ainda chego a sentir, como  agora, nessa hora que ela ainda está comigo, vez por outra, com um manto perfumado sobre essas lembranças, a sussurrar meu nome e me chamar “meu amado, sinto saudades de você, por toda a eternidade…”

A Sinfonia das Interpretações

por A. Capibaribe Neto

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Composição musical para orquestra, em forma de sonata, dividida em três ou quatro partes (alegro, andante, scherzo ou minueto e final ou rondó). Toada harmoniosa; harmonia ou melodia: uma sinfonia de cigarras. Concerto de instrumentos: sinfonia clássica. Parte ou trecho musical que antecede uma ópera.

 

Para os gregos antigos, a consonância (harmonia perfeita) só seria alcançada por intervalos de oitava, quinta e quarta juntas. No século XV, designação de qualquer composição para um conjunto de instrumentos. Fico com a última acepção para usar no meu intento. 

 

Somos, desafortunadamente, um povo pobre de cultura, escasso, de pouca monta, de história, na sua maioria, com histórico familiar nos enxotados de Portugal pela má conduta, degredados, ladrões, assassinos, meretrizes, negros que sobreviveram nos galeões que cruzavam o Atlântico para a escravidão na terra dos índios. Alguns, raras exceções, nobres e de sangue azul, ávidos de abarrotarem seus cofres europeus com o ouro que grassava praticamente à flor da terra. Tudo tão recente, quase ontem; no máximo, semana passada, quando muito. 

 

As raizes dos degredados não apenas se aprofundaram, mas se espalharam. A prova está aí, chegaram ao planalto e de lá não pretendem arredar o pé.

 

 Outros, refestelaram-se na orla, sucursais da grande matriz onde imperam continências circunstanciais e o agito de bandeiras que já tiveram suas torcidas de desfaçatez igualmente oportunistas. Salvadores da Pátria de plantão periódico, sem ao menos mudar a tática e técnica do surrupio, afora as caras envelhecidas pelo passar do anos. Nem ao menos chegaram a lobos guarás. Velhas raposas, velhas, com os mesmos hábitos. Quem são os bons? Deixa eu ver…

 

Tá difícil. E os ruins? Ah, aqui falta espaço, vai ofender a muita gente, incomodar os que perderam padrinhos, caviar Beluga, Romanée Conti, lagostas ungidas, camarões de palmo de cauda e serviçais contritos, os Pull Bags, em tradução debochada de inglês moleque (pull de puxar e bag de saco). 

 

Música clássica? Raríssimos, até ministros mergulharam no pagode e as madames no “baixa o shortinho”… Ah, que coisa boa! Está lá no começo, no intróito dessas mal traçadas linhas; allegro,  bota alegria nisso; andante – palavra que se põe no princípio de um trecho de música para indicar que ele deve ser executado nem muito devagar nem muito depressa, ah, ah, ah!

 

 Cumpre-se à risca à medida que se apresentam os interesses e desinteresse oportuno da choldra; scherzo, que caracteriza por um ritmo acelerado e vivo e pela repetição; ora, ora! 

Pra que serve o carnaval! Covid? Que Covid, que nada! Rondó, na sonata e na sinfonia clássicas, peça brilhante que serve de movimento final, caracterizada pela repetição de uma frase musical (refrão) entre os couplets.

 

 Gente, o passado sempre foi o melhor presente: repetição? É o que se vê. Menos o lugar de esconder dólares. Já não se compõe mais sinfonias como antigamente: Wolfgang Amadeus Mozart, Sinfonia Nº 29; Ludwig van Beethoven (1770 - 1827) - Sinfonia Nº 5; Hector Berlioz (1803 -1869) Sinfonia Fantástica; Robert Schumann (1810 - 1856) - Sinfonia Nº 2; Johannes Bramhs (1833 - 1897) - Sinfonia Nº 1… 

 

Hoje é COVID-19, Ômicron (autor desconhecido; H1N1, H1N3, INFLUENZA; GRIPEZINHA… e a turma quer mais é cair na gandaia.

 Crise? A turma continua fazendo molecagem de madrugada depois da pizadeira do AUSTIN, num scherzo que não tem mais fim.

Mil Lágrimas Diferentes

por A. Capibaribe Neto

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O título já é um indicativo de que coisa boa não é. Pessoas normais choram; em público, sozinhas, na companhia de amigos, de parentes, em comemorações de aniversário, de nascimento, na solidariedade pela dor da morte; choram de saudade, na partida, na volta que acaba com essa saudade, na expectativa, na dúvida, na notícia boa, na ruim… Existem lágrimas para todos os motivos, mas sempre tem o mesmo gosto salgado, não importa a cor do olho, da pele. 

 

Existem lágrimas que rolam até os lábios que tremem de raiva incontida, com sede de vingança, de desapontamento pela traição, pela ingratidão, injustiça. Muitos já choraram essas e outras lágrimas, todas mexendo com a alma, com a emoção recôndita, com aquela pública, com razão, sem razão. 

 

Lágrimas com a história de um filme, sobre a página de um livro, uma carta, sobre um teclado ou uma tela luminosa. Lágrimas fartas, choradas sobre lenços, lençóis, travesseiros ou nas conchas de mãos aflitas, em desespero. 

 

Podia estar tergiversando sobre outras lágrimas mais fáceis como as de pequenos fingimentos, falsidades cotidianas, lágrimas de carpideiras sumidas por falta de clientes; lágrimas de viúvas alegres, outras nem tanto, só aliviadas ou por obrigação para dar satisfação por uma perda que perdeu o sentido de valer a pena de estar junto.

 

Olhando assim, todas juntas e misturadas, são muitas, são tantas e tão confusas que precisam entender seus rituais, até quando são julgadas se foram poucas ou exageradas através de gritos de desespero ou inventadas, para justificar uma herança, um direito posto ou cobrado, devido, transitado em julgado para o gáudio de bem desfrutar. 

 

Lágrimas da consciência pesada, da aliviada. Muitas, tantas; as explicadas, as sem explicação, as que suscitam dúvidas, as de mentirinha, de crocodilo ou de cobra. E cobras choram? Ah, se choram! As que falam, sussurram, cochicham, fuxicam, se divertem silvando ou balançando seus chocalhos, rabos finos.

 

Lágrimas afogadas em copos baratos, em taças de cristal, misturadas com bom vinho ou vinho barato, onde se afogam traições e muitas histórias de asas arrastadas.

 

Lágrimas de sofrimento, já disse; aquelas de alívio pelos segredos sepultadas juntos, para sempre. Lágrimas, são tantas, dariam para encher um lago grande, talvez um oceano ou apenas um jarro ou uma jarra.

 

A lágrima é a alma se confessando, reagindo, seja ao que for ou as suas razões. Um dia, faz muito, vi meu avô, bem velhinho, como devem ser os avós, já respirando pouco, alma fazendo as malas, em sua calma digna ante a iminência da última partida e eu, ali, sem entender ainda do ritual da passagem, ao lado de meu pai, vi um lágrima, só uma, escorrer pelo canto de seu olho. “Olha, pai, vovô está chorando!” E meu pai afagou minha cabeça ainda ingênua e disse em voz sussurrada: “seu avô agora está em paz…!” 

 

Lembro que não chorei porque não entendi aquela lágrima até chorar muitas outras, como algumas das quais falei, mas as piores delas foram algumas, poucas, é verdade, as lágrimas de fúria, de ódio contido, pela força da ingratidão, o peso de mesmo sofrendo injustiça, buscar forças e coragem de ser bom.

A última carta para uma amiga

por A. Capibaribe Neto

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A inspiração veio do título de um filme do Netflix. A Última Carta de Amor. Lembro que escrevi uma crônica com os velhos sintomas do romantismo que vem perdendo a graça do sofrimento de uma boa saudade ou mesmo as dores e cicatrizes daquelas sem cura. Os tempos são outros; tempos estranhos! O ritual da conquista está em coma.

 

Os gestos de um cavalheiro podem ganhar zomba dos circunstantes modernos ou o tom de mofa da turba ignara que abusa de “nadahaver” nas mensagens ou apócopes que não sabem explicar e muito menos das síncopes vulgares. Mocinhas de boa família reduziram os limites para aceitação de um grosseiro chamá-la com o toque de uma buzina estridente ou o acelerar de seu carrão cheio de silicones mecânicos. E elas aceitam com um sorriso até. Tempos estranhos! 

 

Um amigo me disse que tinha vontade de descer, puxar o aborígene pelas metade da camisa aberta, dar-lhe um tapa nos ouvidos já moucos, pelas músicas altas que impõe a quarteirões inteiros: “abaixa o shortinho…”, “mostra o peitinho” – está lá, no Instagram, com mocinhas lindas, com as suas bundas de geleia, como catálogos repetitivos. Instagram, é o nome do circo das orgias e do mau gosto que expõe crianças. Duvidam que exagero? Dê uma espiada!

 

Não sou pudico, beato ou cheio de frescura, mas sou do tempo em que definiam-se os sexos logo nas ultrassonografias e os enxovais eram azuis ou rosas. Mudou tudo, tempos estranhos. Todo mundo tem direito aos seus espaços, muito justo. Pessoas precisam ser respeitadas. 


PESSOAS, SERES HUMANOS, independente do que tem entre as pernas. RESPEITO deveria ser a bandeira, sem a necessidade de fazer uso de praticamente todo o alfabeto para designar as preferências modernas dos sexos modernos. 

 

Como se não bastasse, vem devagar a imposição da mudança gramatical do gênero. “Do you Speak ISTE?” Pois bem, a reboque, vem a falta de bons modos, educação, cavalheirismo.

 

Devia ser obrigatória a exibição de filme A Última Carta de Amor, mas careceria explicar, num pequeno introito, o que significa amor, transcendendo as abas das acepções dos dicionários, que estão lá, no Michaelis, por exemplo, em número de 15. É preciso entendê-las e respeitá-las, mas quem haverá de? Aí, conversando com essa amiga, perguntei a ela quais eram seus sonhos… “Tenho ódio a sonhos…!”

 

Prezada amiga, ontem sonhei com você e escutei ao fundo, a música Lady D’Arbanville, de Cat Stevens, composta para uma mulher, sua amada, morta. Chamava pelo seu nome, dizia o quanto lhe amava, como era linda, mas você não respirava mais. Oh, minha amiga de qualquer lugar, que pena que você não escuta minhas canções de amizade nem vai usar o vestido vermelho que você usou dançando um bolero comigo sob as luzes das estrelas. Esta é a minha última carta com todo carinho da minha amizade que agora jaz sem eco…

CAFAJESTES DEPOIS DA FESTA

por A. Capibaribe Neto

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As orgias comportamentais que se seguem ao término das atividades dentro do ambiente controlado do AUSTIN, após as quatro horas da manhã, no estacionamento da Farmácia Extra Farma, podem estar preparando, de forma crescente, a cada episódio, uma tragédia com maiores consequências.

 

Os rapazes e moças que chegam, cedo da noite, em seus carrões comportados, são educados, elegantes e exageram na beleza de seus físicos, notadamente as mocinhas de vestidos sumários e saias curtíssimas — quem não gosta? 

Lá dentro, depois de um processo de fermentação ou pasteurização em suas personalidades, voltam à avenida e, como se fossem poucas as horas curtidas naquele espaço reservado, dão vazão a alguns instintos selvagens e moleques do lado de fora. 

 

Não falam mais, gritam! Se insultam, tem um que se destaca, que grita feito um índio sioux, montado num cavalo imaginário trazido de casa. 

 

Hoje, no episódio de 14 de janeiro, acordei com um insulto muito comum dentro da turba ignara,  turba que dessa vez, expandiu seus mais desprezíveis instintos. Um sonoro “seu filho da p…!” foi direcionado por um a outro filho igual. As mocinhas se agitaram nas torcidas pelos valentões. A temperatura subiu e fiquei só na expectativa do estampido de um tiro ou o som de tapas, mesas voando ou carros arrancando feito armas no asfalto.

 

Quando os ânimos se acalmaram e o índio deixou de gritar ou fugiu no seu jumento de periferia, escutei a voz educada e elegante de uma mocinha sóbria dizer: “deixe de ser cafajeste!” 

 

Como fui premiado com essa gripe da moda, apesar de ter sido vacinado, sem mais sono, fui procurar por “cafajeste” no Google. 

A mocinha sabia a razão de estar usando o substantivo para qualificar alguém dentro naquela orgia comportamental. 

O cafajeste é uma pessoa desprezível, mau caráter, sem valor, pessoa de maus modos, vulgar, indivíduo de ínfima ou ruim condição, vagabundo, valentão, homem de ínfima condição, indivíduo sem préstimo, traidor conjugal.

 

Em Portugal, é aquele que não é estudante e que, em gíria escolar de Coimbra, se chama futrica. Cafajeste tem 9 caracteres, 4 vogais e 5 consoantes; é um substantivo masculino pejorativo, indivíduo de baixa condição social; pessoa a quem não se empresta importância. A forma correta de escrita da palavra é cafajeste, com j. A palavra cafageste, com g, está errada. O substantivo masculino cafajeste, usado com sentido depreciativo, indica principalmente uma pessoa sem caráter e de má índole, sendo sinônimo de canalha, patife, calhorda e cachorro, entre outros. Não existe feminino de cafajeste.

 

Para o dicionário informal, cafajeste é uma pessoa sem vergonha, pilantra, que gosta de se aproveitar das pessoas bobas. Segundo o dicionário Michaelis on-line, cafajeste é um sujeito indelicado ou sem finura; rude, grosseirão, cujos modos, trajes e aparência denotam seu mau gosto típico, arruaceiro; desordeiro.

 

 A mocinha disse muito bem: CAFAJESTE! Aliás, vamos premiar como cafajestes os baderneiros que não respeitam as dezenas de famílias dos condomínios elegantes em frente, com seus gritos selvagens, seus “vai tomar não-sei-onde”, se bem que bem sabemos. Em inglês, não existe uma boa tradução para cafajeste, afora “scoundrel” que significa “canalha,” quando se inverte para o português. Em alemão, é schurke, mas invertendo, vem como vilão. Em chinês, é égún, que significa babaca. Ora, babaca, por sua vez,  é traduzido como béndán e este, significa idiota.

“MORITURI TE SALUTANTE”

por A. Capibaribe Neto

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Voltemos no tempo, coisa pouca, levando-se em conta que “tempo” é coisa vaga e, enfatize-se, e lá estava Marco Túlio Cícero, um advogado, político, escritor, orador e filósofo da gens Túlia da República Romana, eleito cônsul em 63 a.C. Era filho de Cícero, o Velho, com Élvia e pai de Cícero, o Jovem, cônsul em 30 a.C., e de Túlia, muito aborrecido com Lucius Sergius Catilina, um militar e senador da Roma Antiga, célebre por ter tentado derrubar a República Romana, e em particular o poder oligárquico.

 

Lucius Sergius, em nome de quem arrolamos todos os políticos que posam de honestos, mas com indisfarçáveis interesses escusos; nesse momento, Março Tulio tascou, em alto e bom som, à guisa de introito da sua fala (AS CATILINARIAS): “Quo usque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? Quam diu etiam furor iste tuus eludet?  

Quem ad finem sese effrenata iactabit audacia? Nihilne te nocturnum praesidium Palatii, nihil urbis vigiliae,nihil timor populi, nihil concursus bonorum omnium, nihil hic munitissimus habendi senatus locus, nihil horum ora vultusque moverunt?”

 

Como vós, à exceção dos amigos eruditos, não falais latim, permitimo-nos uma cancha: “Até quando, senhores desavergonhados desta casa, abusareis de nossa paciência? Por quanto tempo essa loucura zombará de vós e a desfaçatez explícita não vos cora a cara? O que presenciamos será avesso à ousadia desenfreada, sem que haja um guarda noturno de coragem a defender o palácio do povo? Noites inteiras sem dormir com medo das pessoas! Não houve consenso pelos cidadãos de bem e esse lugar não está fortalecido pelo Senado que merecíamos. O Senado de verdade não moveu a boca em nome dos necessitados, dos miseráveis. Até quando, homens sem consciência?”

 

Não havia como Marco Tulio ao menos imaginar a falta que faria um discurso duro dessa lavra, inquisidor, quase dois mil e cem anos, somados os antes e depois de Cristo. Antes, mas sem nenhuma ligação com esse passado e o presente confuso que vivemos, mesmo sem ter sido às margens folclóricas do Ipiranga, Caius Julius César, pouco antes de Marco Túlio, 100 anos antes de Cristo, já havia ousado, ameaçando "atravessar o Rubicão", que passou a significar a tomada de uma decisão que se traduziria numa perigosa empreitada. 

 

Ali, Julio Cesar, sem gritar, falou: “ALEA JACTA EST!” Se ousássemos atualizar para o que se descortina diante de nesse presente de trevas, seria como alguém — só não sabemos quem — dissesse, mesmo sem nenhuma convicção: “A SORTE ESTÁ LANÇADA” e tomara que as urnas não nos traiam quando chegar a hora. 

 

Depois do Day After, apuradas as vontades eletrônicas das pessoas esquálidas e assustadas, essas poderão dizer, quase num sussurro, pela falta forças da pouca esperança: “SALVE, PRESIDENTE (seja você quem for) MORITURI TE SALUTANT”. Salve, Vossa Excelência, seja você quem for, OS QUE VÃO MORRER TE SAÚDAM…!

POR NOSSA CULPA, MÁXIMA CULPA

por A. Capibaribe Neto

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Já é Ano Novo. Muita gente está cansada por conta da expectativa frustrada. As festas tiveram pouca graça, o glamour ficou devendo. Não, não, por favor, não interpretem mal. Teve e ainda tem a pandemia e agora, com uma pitada das N qualquer coisa das gripes modernas.

 

Estou de ressaca de vacinas; as três desse cretino da Covid, que não convenceu e mais essa a nova influenza A (H1N1), mais conhecida como gripe suína, que se propagou na primavera de 2009, é uma gripe sem precedentes e provocada por um novo tipo de vírus, ou seja a população não tem nenhuma imunidade contra ela. E eu, mesmo depois de vacinado, fui comer carne de porco no Out Back. Voltei pra casa e dou de cara que Israel já fala numa quarta dose; mais reforço para essa covid teimosa, cheia de fricotes e codinomes.

 

Ômicron — que é o nome da décima quinta letra do alfabeto grego (ο, Ο), correspondente ao O do alfabeto latino. Ninguém aguenta mais o entra-e-saúde tantos vírus. Continuamos de máscaras, inseguros, com medo e ameaçados.

 

“Não se pode baixar a guarda…” eles dizem e esses eles são muitos, falam muitas línguas. As mazelas humanas se vulgarizaram e se misturaram, apesar das fronteiras que abrem e fecham. Viajar deixou de ser uma alegria crescente e passou a ser um pesadelo constante. Eu precisaria ser muito cínico e fazer de conta que nada aconteceu no ano passado e não tem nem 24 horas que já é amanhã na Austrália, na Ásia, lá onde o Sol nasce mais cedo e tudo continua o mesmo. Queria mesmo poder abraçar, beijar, beijar muito, beber todas, principalmente bons vinhos e bom sakê.

 

Nem amigos podem confraternizar, ficarem ébrios, irresponsáveis, mesmo só na passagem de um dia que ligo se fundiu com o que chegou apressado,  capenga. É fácil dizer Feliz Ano Novo, mas puxa, convenhamos, com que cara? Não se trata de ser pessimista, desmancha prazeres, não. Com todo esse passado que já carrego nas costas e pelo corpo inteiro, nem consigo rir. Não consigo nada. Não é que tenha perdido a esperança, tenha ficado sem graça, não é isso, por favor.

Aos que estão, como eu, sobreviventes, que sejamos mais tolerantes e menos, muito menos radicais, azedos, cheios de razão e menos culpados. Levantem as mãos, digam “presente!” — estamos vivos nesse mundo que agoniza, por nossa culpa, nossa máxima culpa.

A MOÇA DO PERFUME GOSTOSO

por A. Capibaribe Neto

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Depois de quase dezesseis horas do trecho São Paulo–Dubai, em um voo que parecia não acabar mais, a longa espera de oito horas até o novo embarque até Saigon. Já era esperado; a Terra é enorme e cheia de distâncias, mas era isso mesmo. 

 

Chamo minhas viagens de fugas; não de culpas ou de dores de amores; fugas da mesmice ou do peso de arrastar as malas de um enorme passado que fui acumulando sem me dar conta. Já pensei em desistir de escrever sobre amores, paixões, passou logo. Às vezes, no meio da noite ou cuidando de madrugadas cumpridas, valho-me de um bloco de anotações e escrevo frases que pulam da cabeça ou retalhos de diálogos em filmes ou de letras de músicas que parecem ter sido escritas para mim e servem de inspiração para esse vício de valer-me de rectos onde me encontro e me perco.

 

Finalmente, a chamada para o embarque com destino a Saigon. Existem dois lugares que dou preferência na cabine: corredor, porque levanto para esticar as pernas sem incomodar a ninguém ou janela, por conta das paisagens acima das nuvens, de dia ou de noite.

 

 Dessa vez, peguei a janela. Embarquei entre os primeiros chamados e me acomodei. Torci para a poltrona do meio ficasse desocupada. Já estava animado, quando uma moça veio devagar, conferindo sua poltrona e era ali o seu lugar. Sentou-se quieta, ficou calada e não fez contato visual. 

 

Não sou de puxar conversa, então estaríamos de bom convívio por quase dez horas, mas quando o piloto deu manche de potência total para o enorme A-380 arrancasse feliz para levantar do chão aqueles milhares de toneladas, a moça retesou-se na poltrona e apertou meu braço com força. Assim que a sensação da gravidade puxando para baixo estabilizou o avião na subida, ela aliviou meu braço, olhou-me encabulada e disse, quase num sussurro: “sorry, sorry!” — “it’s ok…”, foi tudo o que respondi. 

 

Ela estava visivelmente incomodada na poltrona do meio, entre mim e uma senhora de porte avantajado, no corredor. Depois de quase duas horas de voo, ela retirou um iPad na mochila, ligou-o e em seguida, vi, pelo canto dos olhos, diversas imagens encherem a tela, mas virei-me para o vazio escuro do céu lá fora e fiquei-me lá. Pouco depois, percebi que ela estava chorando. Esperei um pouco, toquei no braço dela e arrisquei: “are you ok?” Ela aquiesceu com a cabeça, tirou um lencinho perfumado da bolsa, enxugou os olhos, o nariz e me olhou nos olhos pela primeira vez. 

 

Apesar da expressão triste, tinha um rosto bonito, olhos castanhos claros e boca bem desenhada. “I’m sorry for your arm…”; — no problem, it’s ok” — em seguida, foi a minha vez: “where are you from?” Também era brasileira, descendente de italianos e morava numa cidade do interior do Paraná. Estava viajando sozinha, depois de uma separação doída e apostou o que tinha numa experiência de emprego, em Kuala Lumpur, na Malásia.

 

 Escutei a história sem fazer perguntas, sem curiosidade. Depois de servido o jantar, recolhidas as bandejas e as duas garrafinhas de vinho que ela bebeu, apagaram-se as luzes, ela reclinou a poltrona, suspirou fundo e fechou os olhos. Não demorou muito, o efeito do vinho fê-la pender para o meu lado. Consciente, semi-consciente ou não, aninhou-se no meu ombro e o perfume da cabeleira sedosa misturou-se com a respiração com o aroma marcante do vinho tinto e antes de adormecer, perguntou baixinho: “posso ficar aqui?” Quase não me mexi para não tirá-la daquele quase abraço.

 

Nem vi o resto do voo vencer aquela lonjura toda até Saigon, capital do Vietnam. Seu nome? Não perguntei e não disse o meu. 

 

Não tenho ideia de como fiquei nas lembranças dela, mas ela ainda ficou comigo na minha roupa até o hotel, como a moça do perfume gostoso.

Para uma colega de Fotografia 

por A. Capibaribe Neto

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Amor — é um substantivo masculino, tem como primeira acepção um sentimento que leva uma pessoa a desejar o que se lhe afigura belo, digno, grandioso; grande afeição que une uma pessoa à outra ou a uma coisa, e que, quando de natureza seletiva e eletiva, é frequentemente acompanhada pela amizade e por afetos positivos, como a solicitude, a ternura, o zelo; é também um sentimento ardoroso ou passional de uma pessoa por outra, que se manifesta em forma de atração física e não implica, necessariamente o empenho pessoal recíproco; que tem por base o desejo sexual; pode definir uma aventura, um caso, um namoro, um ato sexual, um sentimento efêmero, inconsequente, um capricho, tendência ou instinto que resulta em atração física e natural, apego a coisas ou objetos inanimados e ideias que proporcionem prazer; entusiasmo e paixão — mas PAIXÃO, apesar de ser definida no mesmo dicionário como substantivo feminino, traz, como acepções; predileção, amor tão intenso que ofuscam a razão; vício incontrolável, dominador — O “amor doentio”, capaz de perseguir, sufocar, chegar a extremos, ser manchete policial pela sua forma violenta de expressar o inconcebível, o inaceitável: a posse! 

 

É definida também como disposição favorável ou contrária à alguma coisa, que cega e impede a razão, como o fanatismo: “certas religiões desenvolvem em seus seguidores uma enorme paixão” e hoje, se vê nas defesas radicais das escolhas políticas, que não aceitam as escolhas diferentes da sua. 

A paixão pode definir o absurdo, radicalismo, mas aí, essas definições não devem estar na mesma ágora onde se pretende filosofar sobre o amor.

 

O introito que enseja o tema — AMOR & PAIXÃO — pode ser extenso, prolixo, mas faz sentido para o cronista, useiro em buscar seu latíbulo, aceito como morada dos deuses, para tergiversar campeiro, sem dar explicações aos curiosos, mas que não entendem entrelinhas. 

 

As imagens que ilustram este texto são de autoria de uma mulher-exemplo de amor e sadia paixão. Amor, pelas escolhas que fez na vida e paixão pela forma como escolhe suas paisagens e as armazena nos pensamentos, nas memórias eletrônicas de sua fiel câmera e as compartilha, evidenciando sua sensibilidade e inspiração através delas. 

Vejo-a, com alguma frequência, esbanjando sorrisos de felicidade, aos lado dos filhos, testemunhando nasceres e pores de sol, lusco-fuscos únicos, florestas, paisagens do mundo, relegadas pelas escolhas apenas perfumadas dos que jamais provaram do atrevimento de desbravar ou seguir bons rastros mundo afora.

 

 Amante da vida, dos sorrisos dos filhos, dos lugares que não carecem de louças Noritake ou talheres Christofle Malmaison 130, porque as montanhas, os campos nevados, os arredores das pirâmides, perdem a importância para as escolhas de seus olhos pelos melhores ângulos, melhores luzes. 

 

Essa fotógrafa pouco sabe da minha admiração e respeito por ela. Acompanho-a em silêncio, sem me manifestar, muito menos dizendo apenas “Linda!”, para suas fotografias ou dela mesma, quando se confunde com a beleza do lugar. Já vi-a, em registro “en passant”, dizendo “sim” para o companheiro de sorte que teve a dita de encontrar sua melhor escolha.

 

 Que homem, ter encontrado e seguir fiel ao lado de uma mulher cujo sorriso transcende aqueles de selfies sem emoção, que o chama de “meu amor” que lhe segura a mão com a força de uma paixão sem hora para acabar! Você, minha elegante, sensível e com extremado bom gosto, sem afetação, e, para mim, a síntese que bem exprime o que seja AMOR pelo melhor da vida e PAIXÃO pelo melhor da serenidade desse mundo por aí. 

 

Sou seu fã, minha senhora rica de tudo, descobridora da felicidade nos lugares únicos onde deixa seus rastros e o ar da sua graça! Para A., com respeito e admiração, seu colega de lentes, de objetivas e dessas escolhas, sem Prada, Gucci, YSL, por perto.

O MEA CULPA DA FORÇA DO HABITO

por A. Capibaribe Neto

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Quando um machucado físico restringiu mais ainda o espaço já pequeno pelas imposições desse longo contexto de pandemia que se repete e que parece não ter fim, voltei para as molduras minhas das janelas, madrugada adentro. As últimas madrugadas tem sido silenciosas, mas desses retângulos cúmplices, posso contemplar estrelas e luas, flores simples que plantei na varanda e uma, essa especial, a Flor do Deserto,  que ainda não me deu o ar da sua graça.

 

 Nesses passeios silenciosos por essas molduras, vejo,  aqui e ali, luzes que se acendem e depois se apagam ou outras, que varam a noite. Não lembro de ter visto ninguém picado pelo mosquito chato da insônia que também estivesse debruçado nessa vigília. Por vezes, assisti o Sol se espreguiçando devagar para assumir madrugadas plenas. Sem se dar conta, você se torna impaciente com a chatice desse nada acontecer, mas foi assim que lembrei de uma música, parte da trilha sonora do seriado “The Black List” e que mexeu com a sensibilidade do solitário e fui catá-la no Spotify: para “Force of Habit”, de Charlie Cunningham. Este texto foi inspirado em passagens da tradução da letra dela. 

 

Certas lembranças tem o dom de te puxar pra baixo e você é quase enterrado vivo. Não espere respostas para confortar suas dores ou suprir abraços para proteger do frio da alma, acalentar saudades teimosas e outras mazelas de passados impossíveis de consertar. Queiramos ou não, tornamo-nos força de hábitos acumulados, mas se ainda estamos aqui existe responsabilidade compulsória no resto do permanecer e aceitar as surpresas do momento seguinte. Aprendi que animais feridos lambem as suas feridas para curá-las e é o que tenho feito com as minhas, fazendo de paragens distantes, pelos caminhos onde deixei rastros desacompanhados, desde o deserto às neves calmas no extremo norte, perto do Polo Norte, meus curativos sem esperar por ninguém. 

 

Durante os voos compridos de muitas travessias sobre mares e montanhas que me levaram a esses destinos, passei-os com a cabeça encostada nas pequenas janelas transparentes, mas com visão privilegiadas das estrelas que nunca não mudam de lugar, por serem fiéis e comportadas, cada uma nos seus lugares no céu. 

 

Mesmo com muita imaginação, não vemos ninguém lá fora, além de fantasmas de lembranças borradas dos “para sempre” não cumpridos. Alimentar essas lembranças é perda de tempo, mas a teimosia faz parte, mesmo com aquelas no fim das escolhas erradas que não levaram a lugar nenhum. É a força do hábito que volta a insistir em outros perfumes, novos rostos, peles diferentes, os côncavos e os convexos sobre os quais a luxúria se esbalda, além outros pecados capitais. A letra da música sugere uma biografia sua não autorizada. Leva tempo até você perceber que essas situações se repetem com frequência pela força do hábito. 

 

Depois de cada “para sempre” desfeito, deixamos tomar assento passageiro outra promessa: “nunca mais…!”, esse de validade mais curta. “ Quem sabe dessa vez?”. Que nada! Aí, não resta nada além de baixar a cabeça e depois voltar a ter ímpetos de acreditar em outro “para sempre”,  pela força do hábito. Depois, advém a falsa demonstração de surpresa diante de promessas iguais ou parecidas, fazendo acreditar que “agora” será pra valer, por pura força do hábito, tão previsível! 

No fim, sinto-me apenas como testemunha desacreditada, por simples força do hábito…

ADEUS ÀS “MULHERES BONITAS”

por A. Capibaribe Neto

O absurdo das intolerâncias radicais chegam a assustar. Essa chegou agora, de fonte fidedigna, através de uma postagem do eminente professor Paulo Elpídio, na — digamos -  agora confusa do Facebook, como bem mostra réplica eletrônica. Como se não bastasse o desfraldar nervosinho de outras bandeiras oportunas, eis mais uma com nova  litiga sobre costumes. À intragável flâmula gramatical, some-se essa de condenar um elogio que por séculos fez bem ao ego feminino: elogiar a beleza de uma mulher, chamando-a de bonita!

A que ponto chegamos? Ainda bem que nos tempos áureos, pude me esbaldar com as evidências fotográficas de mulheres bonitas, muito bonitas e lindas, além de simpáticas, elegantes, charmosas, sensuais…

 

Tudo junto e misturado ou mesmo em pequenas doses, pode virar “crime”, passivo de atentado ou discriminação e consequente punição. Pude, repito, festejar a beleza de muitas dessas criaturas belíssimas e enaltecê-las em espaços assim, desde o TC Dimensão, da Tribuna do Ceará, passeando pelas colunas de Sônia Pinheiro, com as Dez Mais Elegantes, DN Gente e Zoeira, no Diário do Nordeste, escrevendo como bem me aprouvesse, falando de seus rostos beirando à beleza de Afrodite ou comparando-as a ícones vivos desse privilégio da criação do Grande Arquiteto do Universo. 

 

Chegamos ao fim, com o limite da fronteira da idiotice que criminaliza — vejam só, a beleza da mulher como a conhecemos. A ser pra valer essa bobices inominável, despeço-me da beleza de vocês, mulheres bonitas, mulheres queridas não apenas por esse dom, mas pelas qualidades da simpatia e do caráter que muitas delas encerravam, para a alegria dos olhos de quantos a admiravam nos salões, nas passarelas, nas ruas, avenidas ou vielas mais modestas, merecedoras de um virar de pescoço ou um fiu-fiu já banido.

 

Adeus, lindas, maravilhosas, bonitas, vocês serão eternas na nossa imaginação livre, nas fantasias mais ousadas. Vocês fizeram história e mesmo que quando nos impuserem penas severas, se as adjetivarmos assim nos vossos passares graciosos, haveremos de dizer em alto e bom som dentro do peito: vocês são mais que bonitas, são lindas!

DE VOLTA ÀS ESTRELAS

por A. Capibaribe Neto

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Recentemente, lembro que acordei, no meio da noite, com uma frase que me fez pegar um caderninho que trouxe do Japão e anotá-la: “a morte não permite despedidas”. Este desagradável assunto, de tanto fazer parte de um cotidiano continuado, perdeu a força dos primeiros impactos absurdos de tantas tristezas que se abateram sobre nós, mortais.

 

Assimilamos as partidas bruscas, a utilização vergonhosa dessa tragédia  pelas gangues  de vendilhões de esperanças, que pouco se lixavam ou fingiam que se importam com as dores alheias, tudo com a desculpa  de um vírus impensável. À morte ou mudança de plano nas existências terrenas de milhares e depois milhões, impôs-se-lhe um ritual perverso: sem despedidas, sem adeuses, sem choro presente, sem vela. 

 

As pessoas não gostam desse assunto, mas convenhamos, o ser humano é o único animal que tem certeza da sua finitude e faz planos como se fosse eterno. A bem da verdade, ninguém tem a menor noção do que seja essa passagem, além do processo natural que a ciência explica. Já passei por muitos perigos imediatos e de quase certeza de que havia chegado a minha hora de fazer a prestação de contas de como usei o livre arbítrio. Senti a adrenalina desses momentos e lembrei dos perigos pelos quais passei por cinta da ingenuidade irresponsável da criança que fui e não me  apercebi...

 

Poucos são os que tiveram a experiência de terem sido trazidos de volta à vida, depois de uma dessas peças que o coração prega e pára, sem aviso. Alguns falam de luzes brancas ou de um filme que mostra toda a vida. Aqueles poucos que  passaram por essa experiência, assumem  novos comportamentos, atitudes e dão mais valor a essa, digamos, segunda chance. 

 

Passei por um procedimento cirúrgico que me impôs uma sedação profunda através de químicos anestésicos. Quando acordei do sono imposto, lembrei que o desfalecer foi lento, calmo, sereno até o alheamento completo. Se tivesse continuado a dormir indefinidamente a partir desse processo, acho que estaria de bom tamanho para mim. Não vi luzes, não vi rostos, não havia uma porta ou uma caverna, apenas um nada absoluto sem dor, sem nenhuma emoção, foi como um trailer desse filme sem replay. 

 

Nascemos no infinito incomensurável, dentro do qual as estrelas brincam no campo das distâncias medidas em anos-luz, onde acredito seja onde estão as nossas primevas origens.

 

Viemos do pó que elas produzem quando se esfregam. Quem gosta de procurar respostas no compadre Google, para perguntas intrigantes e procurar sobre origens e “os sons do universo, da terra, do sol, de todas as estrelas e mundos”,  se deleitará com as suas melodias,  captadas dos confins das distâncias.

 

Somos feitos do pó das estrelas, não esqueçamos; está no Livro Sagrado. Nossa viagem, desde a origem mais remota até o presente de cada um foi muito longa. Vamos voltar ao lugar de onde viemos e todos nós, sem exceção, haveremos de nos encontrar na eternidade, para uma imensa confraternização, entre estrelas pulsantes, ao som de mundos inimagináveis e à luz de sóis fantásticos. A morte é apenas um detalhe que anestesia o nosso espírito.

Convite para um chá com um anjo 

por A. Capibaribe Neto

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A luz era incandescente e daí, mal podia vê-lo, mas sabia-o ali, sentia suas mãos no meu rosto. Anjos são assim e poucos privilegiados podem vê-los, senti-los e escutar o som de suas vozes aqui na terra. Encontrá-los não é fácil, mesmo os que são da guarda, aqueles que protegem sem se mostrar.

 

Pois bem, encontrei o meu, não que precisasse da sua proteção contra um perigo real e imediato, mas sem saber, para fazer confissões, desabafar, dizer coisas, contar histórias engraçadas, falar do meu tempo já pouco, das minhas vontades, dos meus desejos, decisões, da paisagem que quero, que me espera e ao encontro dela eu já quero ir. “Vai, agora, não! Fica mais um pouco, pra que a pressa? Conta mais histórias, manda pra mim, escreve, deixa uma carta, um bilhete, vamos tomar um chá, pra que tão cedo?” 

 

Já escutei, depois de ter sobrevivido a muitos perigos nessa vida, que tenho um anjo da guarda forte. Pelo que passei, vai ver que tenho mesmo e nem me dei conta ou não quis acreditar. Não lembro de ter tido medo, me apavorar ou medo pior, o medo de morrer; faz parte. Vai ver o anjo nem me deixou vê-lo ou se deixou ver, protegeu-me no anonimato, na surdina, com o manto de suas asas ou seu avental branco. Dizem que anjo a gente não escolhe, eles aparecem e protegem, depois somem e só voltam a aparecer onde a gente fica mais frágil, mais vulnerável.

 

 Certa vez, faz tempo, numa noite de lua cheia, o romântico fugiu de um bulício circunstante e foi buscar refúgio para acalentar as mazelas das tristezas que para elas deu espaço.

 

Existem momentos, no meio do nada, onde lembranças insistentes se juntam e se agitam no peito e os olhos se apertam e traem. As desculpas de que foi um cisco ou que os olhos estão ardendo muitas vezes não colam e aí, o jeito é buscar um canto, um sombra e esperar que a alma se aquiete. Nessa noite, nesse lugar, até a Lua no alto o protegeu com uma nuvem comprida, passando sem pressa,  para deixá-lo quieto e não exposto. 

 

De repente, caminhando sobre o cascalho que havia no lugar, passos denunciaram uma aproximação. Chegou bem perto, diante dele, puxou-lhe uma mão, colocou uma papel dentro, fechou-a e foi embora… 

 

Depois, quando o silêncio voltou a ser sentido e a lua curiosa quis saber de tudo, ele abriu a mão e desdobrou o papel: “chorei muito por um par de sapatos até que encontrei um homem que não tinha pés…” E aí, foi quando passei a me lamentar menos. Anjos escrevem, mandam recados, dizem coisas que confortam, como o anjo do céu, o da luz forte: “pra que ir embora? Ainda tem tanto tempo dentro do tempo que te cabe nessa vida! Vai, não, fica mais um pouco, seja um anjo para teu anjo Maria…” E se calou. As palavras lhe faltaram, queria sumir, desaparecer, criar asas e também voar. 

Anjos ensinam a voar ou também fazem confidências de suas dores terrenas. Anjos também podem ser de carne e osso. Sei disso, vi um, estava ali, com uma luz forte a lhe contornar o corpo como uma aura e depois de cuidar das minhas confissões, disse com um sorriso que acalmou e uma voz suave como uma brisa de fim de tarde: “vai embora, não… Vem depois tomar um chá comigo…!”

 

Anjos existem e às vezes, quando a gente está perdendo a graça e a vontade de caminhar para o depois de bem longe, eles surgem e fazem um convite para um chá aqui na terra mesmo.

Para M. que me deixou de boca aberta enquanto fazia milagres para eu sorrir de novo.

O ÚLTIMO CHORO DA SOFRÊNCIA

por A. Capibaribe Neto

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Todo conto, todo canto de toda cantiga – e aqui faço um ponto ou três pontos – pois são quase todos, falam de tristezas por que contam dos sofreres das despedidas, das idas e poucas vindas de quase nenhuma refelicidade, como se felicidade fizesse caminho de volta por inteiro.

 

Pode ir ver, pode olhar, constatar; o vaso que se quebrou pelo descuido da queda ou foi quebrado num rompante, como se vaso com flores ou sem elas tivessem culpa da raiva, do ódio, ainda que passageiros. Todo canto, todo canto, cada verso ou prosa, ditado, frase solta, o que seja; veja bem, quase todos, ou sem exceção, lamentam por despedidas – aquelas impostas, decididas, pelas descobertas das traições; sempre traição, enganação que sempre se descobre ou descobrem, nos descuidos das mentiras, nos fuxicos, quase todas, são choradas, confessadas, escritas e guardadas, quase para sempre, sem conserto, porque os apertos não param de machucar, sempre que lembrados.

Contar ou cantar o sofrer é morrer em pedaços cada vez de toda vez que canta chorando pela dor que nunca se vai.

 

Quem sabe chorar e chora profundo faz chorar, arrasta choro de quem sofreu e sofre por igual porque essas dores, essas sofrências são parecidas ou iguais nesses adeuses, nessas despedidas… “Quem fica, também fica chorando”– está na letra dessa cantiga que nunca para de chorar de dor:
“Adeus, adeus, adeus, cinco letras que choram, Num soluço de dor… Adeus, adeus, adeus! É como o fim de uma estrada, Cortando a encruzilhada, Ponto final de um romance de amor, Quem parte, tem os olhos rasos d'água, Ao sentir a grande mágoa, por se despedir de alguém, Quem fica, também fica chorando, Com o lenço acenando, Querendo partir também…” E por que se vai? Por que se despede? Por que diz adeus? Em cada canto, onde choram essas saudades, essas dores, essas sofrências, tem uma história contando e sendo cantada por quem sabe e sofreu também.

 

Mesmo sem conhecer ou jamais ter visto ou ouvido falar, a moça loira de vestido xadrez, pouco antes de entrar no avião, chamou a minha atenção. Seu vestido, em preto e branco, como as verdades devem ser postas, lembrava a bandeira de chegada para o grande vencedor nas corridas nas pistas. Que ironia, moça! Alguém lá em cima, resolveu usar essa bandeira apenas para dar partida numa ida que nunca iria chegar…

 

Sabia de tudo, tinha todo poder e estava ali como sempre e em todo lugar e usando do seu imensurável “livre arbítrio”, aproveitando-se do crédito universal e inquestionável de que “sabe o que faz” e licença para “escrever certo por linhas tortas”, errou na gramática, na conjugação do verbo morrer e matou a moça do cabelo louro, calou a sua voz e ao invés de calar a sofrência do mundo, calou a voz bonita da moça bonita que chorava junto de quem chorava e não sabia acalentar a sua dor. Ontem, ainda hoje e por algum tempo, a própria sofrência dos contos de seus cantos vão chorar baixinho pelo final dessa corrida onde a bandeira quadriculada serviu como manto para cobrir seu corpo na despedida derradeira. Para a moça bonita, dos cabelos louros, de voz forte com que contava tantos contos em suas cantigas de sofrência. Para Marília Mendonça, que parou de sofrer a sofrência alheia.

INTERPRETAÇÕES EQUIVOCADAS

por A. Capibaribe Neto

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Vamos começar pela vida: não somos nós que fazemos planos para a vida. É a vida, sim, que planeja TODA a nossa vida desde a criação dos tempos, muito antes de virmos ao mundo. Pode até parecer meio bobo, mas tudo o que aconteceu ou acontece, já estava planejado e escrito…


Somos a soma das nossas atitudes, das boas coisas que fizemos daquelas ruins e nessa operação tem pouca importância o saldo, porque o resultado está no peso das lembranças que nos acode, cobrando arrependimentos ou arrancando sorrisos pelos nacos de tempo onde nos sentimos felizes. Já filosofei certa feita, sobre essa sensação da dita felicidade.

 

 Ninguém faz o outro feliz; nós é que sentimos a felicidade dentro do peito e ela se espalha na alma, no espírito e resplandece na aura. É um coisa de dentro pra fora, uma sensação boa.

 

 O mais correto, quando expressada com relação a alguém, seria dizer “eu me sinto feliz com a presença de fulana ou fulano” — ou para atender às novas cobranças ou imposições, fulane. Isso vale para tristeza, para o aborrecimento. Esses e muitos outros mais se evidenciam com a nossa permissão, a nossa aquiescência. O Takotsubo, por exemplo, que é uma onda de tristeza eletromagnética anormal, é que faz já dentro de nós, com que o coração se esvazie e se contorça até parecer um cesto de pesca sem nada dentro. Aqui cabe uma reflexão, pois essa onda vem de fora, mas a sensação desse vazio é que depende de cada um daqueles que se propõem a exteriorizar seus pensamentos. Algumas vezes, assumindo raivas justificadas, acordamos no meio da noite ou madrugada e nos vemos dentro de um redemoinho e de pesadelos que fazem acordar o conjunto de eventos sem forças para pedir desculpas, perdão ou reconhecer um erro. 

 

É assim que vamos levando a vida e aceitando consequências ou deixando tudo o que vem a seguir como um castigo na prestação de contas que sempre nos é apresentada ao fim e ao cabo da existência. Presumimos indiferença ou fazemos pouco caso dessas contas, querendo aparentar humildade na aceitação dos números. São interpretações equivocadas para dentro das quais fugimos para encontrar alguma sombra que nos conforte pelos atos ou atitudes que cometemos em desafavor de outras pessoas.

O TAL DO LIVRE ARBÍTRIO 

por A. Capibaribe Neto

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Com o passar dos anos com que somos aquinhoados, uma coisa começa a ficar preocupante: temos cada vez mais passado que futuro. Pode até ser filosofia de pouco preço, mas encerra uma verdade. Nos áureos – entenda-se como sinônimo, pela 9ª acepção para época de acontecimentos felizes, nesse caso, da infância, adolescência e juventude, os sonhos podiam se distanciar das dificuldades de qualquer presente experimentado. Havia um futuro aguardando ou pressupostamente assegurado. Ledo engano!

 

De repente, como na série “Missa da Meia Noite”, em um dos últimos momentos, o que se pretende explicar sobre o que acontece quando morremos. Assunto que ninguém gosta de encarar. Vemos, hodiernamente, com alguma frequência, exibição de pessoas que já passam de um século, com especial lucidez e mobilidade desassistida, mas viram notícia, são expostos como uma atração desse excerto da ordem natural da existência humana. Enfim, essas pessoas, principalmente elas, têm uma coleção fabulosa de passados; entenda-se o plural como forra de assumir um monte de histórias dentro desse contexto de vida única.

 

Quantas lembranças! Quantas histórias! Quantas acepções inquestionáveis para relatos “no tempo de…!” Mas e futuro? Mais um dia? Uma semana, mês? Mesmo para os septuagenários, são tristes essas notícias das partidas de amigos ou parentes. Desculpem a abordagem preliminar. O foco é o que fizemos da vida, o que está na escrita impossível de falsificar, da contabilidade com que nos apresentaremos diante do Grande Arquiteto do Universo, para responder às suas divinas interpelações. Não para o castigo nos infernos ou as festas monótonas entre anjos e querubins pululando de nuvem em nuvem. O Deus, como para Baruch de Espinoza e Einstein, não castiga. Escuta.

 

Afinal de contas, para que Ele concedeu o tal “Livre Arbítrio”? E aí, vai reclamar ou condenar o que deu de mão beijada e abençoada? Peço humilde perdão aos radicais ortodoxos intransigentes, mas não consigo ver em Deus essa cobrança ou essas sentenças rigorosas de padecer num lugar de desconfortável calor exorbitantes, mas com nuances de orgia.

 

Retomando… O futuro acumulado e constante da escrita compulsória da nossa vida, não aceita rasuras. Ninguém engana a quem tudo sabe. Essa escrita, essa contabilidade, onde são lançados os débitos e os créditos, está diante do espelho, quando a pessoa se olha, olho no olho depois de um mal feito, uma abençoada sem-vergonhice, uma mentira deslavada, ou uma confissão de mea culpa, está no plano de conta sem muitos códigos.

 

Fica tudo escrito, preto no branco e o saldo… bem o saldo não serve de nada, seja positivo ou negativo. Imagino o criador olhando para a escrita de cada um, ora sorrindo, ora balançando a cabeça, desapontado e sem jogar na cara de nenhum filho, porque cada um sabe onde abusou do tal livre arbítrio.

A ETERNIDADE DE HOJE

por A. Capibaribe Neto

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Onde estão as “lindas mulheres” do tempo de Uma Linda mulher? A Julia (Vivian Ward) Roberts - Vivian Ward - 1990), deve permanecer como na estreia do filme guardada com o Richard Gere que se conquistou para conquista-la.

 

Richard e Júlia devem ser vistos e curtidos naquela história, naquele tempo, naqueles frames divertidos, como os friends de Friends, reprisados incontáveis vezes sem perder a graça. Rachel, Ross, Monica, Ross, Phoebe, Joey; cada um recebendo, 2,4 milhões de dólares da HBO para uma tomada de cena que durou duas horas, só para reunir o elenco depois da modesta estreia em 1994 e depois, de despedir-se do público em 2004, permanecendo até hoje, 25 anos passados e de certa forma atualizado na preferência de muito público mundo afora. Nas telas onde continuam vivas e curtidas, essas personagem permanecem lindas e alheias ao mesmo tempo que foi passando sem privilégios para seu público, que envelheceu em três implacáveis décadas.

 

Quantas “ Lindas Mulheres”, mesmo sem a profissão de Vivian, que fez Edward render-se aos seus encantos, não foram vítimas da passagem do tempo? “É isso mesmo!” – ora exclamareis para minimizar essa vã filosofia. Fui passear nas “postagens” curtas do Instagram, onde mulheres lindas, elegantes, cheias de charme, são misturadas, digamos assim, sem discriminação ou censura, às mocinhas que evidenciam seus talentos em repetidas, explícitas e insinuantes danças de bundas (não sejamos clínicos para torcer o nariz para o termo) que não deixam nada para a imaginação do que insinuam. “Meu corpo, minhas regras” e nem venham com censura porque a lei é rigorosa, pelo menos com a liberdade do rebolar.

 

A “Linda Mulher” e os “Friends”, usados aqui só para ilustrar essa eternidade para poucos, foram e continuam sendo únicos e impossíveis de imitar. Os rostos lindos e maravilhosos, “polidos” e “lustrados” com filtros mágicos de aplicativos oportunos, fazem a festa, tem  e merecem seus respectivos públicos. O remexer insinuante e o rebolar que remete a uma prática sexual de livre escolha dos parceiros que se exibem sem pudor, haverá de fazer a festa de um público cada vez maior e fiel. Milhares e até milhões de seguidores são o termômetro desse sucesso e preferência.

 

No vasto elenco, que vai da elegância e classe de poucas influencers às mocinhas, muito mais lindas que a Vívian (Julia Roberts) e charmosas que a Rachel (Jennifer Aniston) – diga-se de passagem, que vem e vão naquela plataforma, a “eternidade” para ficar marcada nas lembranças, é muito volátil. Os rebolados das insinuações explícitas tem prazo de validade, é cansativo e exige renovação quase diária. As roupas coladas que mostram até o micro relevo de uma mancha de pele, contornos, volumes, divisões na superfície de algumas geografias, são divertidas - não sejamos falsos.

 

Os nudes do “privado” podem chegar ao exagero de um pedido do tipo “manda uma foto do teu umbigo”… pelo lado de dentro, mas nada disso tem a força saudosista de uma Julia(Vívian) Roberts ou a graça e a beleza de uma Jennifer (Rachel) Aniston; a eternidade delas ainda vai durar muito.

Um para sempre com novo dono

por A. Capibaribe Neto

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Foi antes da pandemia, a Etna ainda estava funcionando; diante do caixa, fechando a conta, a moça, acompanhada de um homem, pareceu-lhe familiar. A memória é sempre cheia de armadilhas e prega peças ou brinca de adivinhação, só para testar o que já passou com o passar dos anos, principalmente, quando existe uma grande coleção de lembranças misturadas. 

 

Quando olhou pela segunda vez, ela lhe fez um aceno tímido e ele retribui com um sorriso sem graça. “Quem é?” – perguntou-se rapidamente e voltou às compras que foi fazer. Como a imagem do rosto dela teimava em procurar foco, nitidez em meio a tantos rostos que fotografara, ao chegar em casa foi procurar nos arquivos e, dentro de uma gaveta, aqueles rastros da curiosidade que o incomodavam.

 

Era do tipo que guardava pedacinhos de papel, lencinhos deixados como lembrança e, dentro de um envelope de plástico, perfumes que compuseram suas histórias: L’Insolente, Trussardi, Amarige… Bilhetes carinhosos, cartões, deixados sobre travesseiros carinhosamente amarfanhados e isoladas notas de fios de cabelos soltos pela molecagem da fome de beijos. Especiais foram fios de cabelos dourados e castanhos – cada um de sua época, colados com durex em cartões coloridos também dormiam, respeitosamente, entre fotografias que não o deixavam esquecer que houvera um passado cheio de capítulos da sua história.

 

Aqui e ali, sentia ímpetos de tocar fogo em tudo, mas desistia e assumia carregar o peso das saudades proibidas e lembranças que perderam o sentido de continuar.

 

Quem já viveu anos demais da conta e pouco se permite continuar sonhando. Nunca, “carpe diem” se fizera tão imperioso. Cada “amanhã” era uma pretensão de luxo; “no próximo ano”, então, a ilusão de permanecer imortal. Enquanto se sentia vivo e pulsando, se sentia imortal, embora já estivesse dispensado de escolher entre um soldado de pouco trato um homem acima de deus, com letra minúscula, para o comando do país. “Que país?” – questionava-se em silêncio. 

 

De repente, uma dedicatória nas costas de uma fotografia: “para sempre tua…”, o fez lembrar, como num flash, de quem era a letra de boa caligrafia e a marca da boca que tanto havia beijado…! Virou a foto e lá estava a mulher na fila do caixa. O corte dos cabelos, uma tintura escura que mascarou o castanho perfumado, os óculos de grau, o corpo com novas formas, quase foi o bastante para esquecer e deixar pra lá. Ali estava ela… ressurgindo ao quase vivo, cores mais vivas ainda! Ah, não! Onde ficou aquele “para sempre” que lhe prometera e não cumprira? Não era para estar durando até ali, na boca daquele caixa? Ele um dia fora aquele que atendeu ao chamado “meu amorzinho”, de tantos outros diminutivos que nunca suscitaram subserviência, mas, isso sim, uma forma de cativar, prender, agrilhoar sem que tivesse percebido. O para sempre tinha prazo de validade e um dia, venceu.

 

 Ficou ali, olhando a fotografia, viu um monte de vida passar diante dos olhos. Não lembrou como tudo começara, mas seguramente não esquecera do dia em que o “para sempre” acabou. Definitivamente! Voltou-se para a imagem do instante  na fila do caixa. Tentou imaginar como teria sido  logo depois que ela saíra da loja com o companheiro. Onde estaria? Em algum lugar, seguramente, estaria usando outros diminutivos ou os mesmos, requentados,  para um novo “meu amorzinho” com outros jeitos de se encantar no seu tempo de acreditar naquele “para sempre” que um dia fora dele.

O Infarto nas redes eletrônicas

por A. Capibaribe Neto

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As fotografias e mensagens usadas como vitrina são sempre as melhores e se não estiverem boas, com alguns toques mágicos ficam do agrado e convencem. Facebook, WhatsApp, Instagram, Messenger, só para mencionar os mais conhecidos, mas além desses, outros da mesma linha carecem de identificação.

Afinal de contas, é imperioso saber com quem se fala; ou pelo menos acreditar que a pessoa do outro lado da comunicação é e irá se tornando aquela que se acomodará na imaginação nas festas das fantasias.

 

Dos rostos bem cuidados, sorrisos ao ponto, elegância ou descontração e até mesmo o abuso do direito do “meu corpo, minhas regras”, só não se pode mostrar as areolas ou avançar nas explicitudes das intimidades. Questão de gosto, de classe, pudor, cuidado, quando a exibição é pública ou restrita. No “privado”, os limites não têm limites: é uma questão de respeito, caráter, confiança, tudo muito subjetivo. O campo é vasto e as carências dentro das restrições impostas no contexto cansativo atual se comprimem e aí, os nudes viraram a pedida. 

 

Existe uma distância muito grande entre a arte da nudez e a nudez de mau gosto, se bem que o nu –  com todas as vênias – feminino, detém a graça dos côncavos, convexos, dos bordos de defesa ou ataque; questão de inegociável preferência do lado de cá e os ângulos exagerados de selfies desfocadas. Do momento de uma ingênua “solicitação de amizade”, como se essa já estivesse pronta para um delivery e um envolvimento instantâneo, é só o tempo de digitar uma mensagem e “clic”, enviar! 

 

Entre a conveniência do virtual e  a trabalheira para consolidar o presencial, existem as distâncias e o preço da gasolina. E aí, se não der certo e uma outra “solicitação de amizade” mais atraente não se intrometer, a facilidade cruel do “bloquear” virou banalidade, frieza, deselegância, mas e daí?

 

Existe uma tabela de preço para as consequências de dados expostos e de uma confiança rápida demais, principalmente quando, de repente, “anota aí meu novo telefone…”, “pai, tá ocupado?” e a pessoa, na maior inocência, vai na onda e faz uma transferência que vai de pouca coisa a muito. E assim, das primeiras fotos do perfil ao exagero das postagens até do palito de dentes, passando pelos nudes, tráfego de imagens e informações ou confianças apressadas movidas a carências, a tempestade perfeita das desilusões está presente. 

 

O infarto das redes sociais e comércio eletrônico veio num clique, o mesmo que manda uma solicitação de amizades de prateleira, o envio de uma mensagem carregada de preconceitos, insultos, agressões, preferências, radicalismos, intolerâncias. De repente, tudo parou, por pouco mais de sete horas. O enorme paciente comunitário está em franca recuperação e fez surgir o Telegram e o Signal.

Sete horas para uma reflexão, uma faxina nas redes e a descoberta de alternativas na UTI eletrônica.

O ARFAR DA MULHER PERFEITA

por A. Capibaribe Neto

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Linda, linda, não era. Bonitinha seria pouco e passável, segundo o dicionário, seria mais ou menos, conforme o desejo ou vontade, sem muitos defeitos, mas também sofrível, o que não era o caso. Cuidava-se, era simpática, tinha um sorriso que contagiava sem afetação.

 

Quando se arrumava para sair, deslumbrava; principalmente se usava vestido justo com decote generoso. Generoso porque podia, porque os seios rosados permitiam e bem se acomodavam. Disso ele tinha ciúmes, principalmente quando ela suspirava fundo. Hipnotizavam! Quando ela queria fazer-lhe raiva ou provocar os circunstantes, aí é que suspirava. Um espetáculo, aquele subir e descer lento, sincronizado, harmonioso, com leves pitadas de sensualidade orquestrada.

 

Quando à mesa grande, de muitos lugares e farta de de bons vinho,  os amigos do maridão, digamos assim,  quase não se continham com olhares beirando o indiscreto explícito, ele apertava o braço dela – sem violência e quase num sussurro implorava: “para de respirar assim, amorzinho…!”

 

Vez por outra ela suspirava e deixava escapar uma pontinha de sorriso malicioso com o canto da boca. A idade? Ninguém queria saber, decotes bonitos, generosos, não tem idade, principalmente quando a idade parece pouca. Tinha a idade certa. Transitava bem no imaginário dos… vamos dizer, amigos do maridão. As amigas tinham inveja dela? Se tinham, não demonstravam, não passavam recibo.

 

Tinha um sonho: um BMW!  Um dia, durante um jantar onde as máscaras foram dispensadas, dentre os convidados, coincidentemente, um fulano que abriu uma concessionária da marca. Coincidentemente, ele ficou sabendo daquele sonho e falou dos novos modelos, prometeu descontos incríveis. Coincidentemente, ela arfou de alegria nervosa. Coincidentemente o maridão viu. Coincidentemente adiantou-se e comprou um para ela.

 

E agora, feliz da vida, parece uma paisagem ambulante, desfilando pelos points, com um decote ainda maior, arfando sem parar, de felicidade.

Uma Cascata Dourada Sumindo Devagar

por A. Capibaribe Neto

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A beleza especial do rosto retangular, realçada pela cabeleira farta, remetia à visão de uma cascata dourada, que me trouxe à lembrança querida o amor interrompido. Foi coisa do destino virtual, mesmo.

 

Num lampejo de inspiração, projetei no rosto desconhecido o rosto que dormia comigo e eu acordava mais cedo para contemplá-lo, embevecido, o último ressonar e o arfar perfumado do colo sobre o qual adormeci. Foram os cabelos que me encantaram. Transformei a imagem do rosto num desenho, através de um desses aplicativos que substituem as paletas e os pincéis.

 

Não sou de me oferecer para ser amigo de estranhos por conta da minha timidez natural. Levar um fora, ser rejeitado faz parte desse espaço interneteano, mas não deixa de ser constrangedor e o receio de um bloqueio me incomoda. Afoitei-me e me enxeri, mandando para a dona do rosto o resultado da minha obra. A receptividade foi quase nenhuma, beirou a indiferença, mas sem os matizes da indelicadeza.

 

Para minha surpresa, a dona do rosto me entreabriu a porta da simpatia e logo estávamos trocando mensagens, curiosidades de invasão de privacidade, até dizer que o meu arroubo de artista devera-se à sua cabeleira cacheada. Trocamos experiências de vida até a confissão de que a minha busca, dentro do quadrilátero luminoso era por uma boa amizade. Algumas experiências coincidentes e outras, com mágoas parecidas, nos aproximaram.

 

Um dia, depois de muitos dias passados, ousei: “vou até aí, cumprimentar-lhe pessoalmente…”. A incredulidade natural dela aguçou a vontade de cumprir o que havia afirmado. Quando voltamos a nos falar, eu estava no aeroporto, prestes a embarcar. Do aeroporto, fui direto a um hotel. Levei na bagagem uma despretensiosa garrafa de vinho e duas taças de cristal. Não sonhei ou fantasiei com muito ou alimentei expectativas atrevidas. Um olhar no olho, um aperto de mão, um beijo no rosto e um abraço simples estariam de bom tamanho.

 

Por mais alto que seja o nível, a inconteste lisura e firmeza de caráter, as bagagens de comportamento e elevado crédito dos envolvidos, não implicam na compactuaçao diplomática das diferenças, crenças e visões dos que se encontram pela primeira vez, pelo contrário, ao invés da harmonia, pode descambar para arestas incontornáveis. E foi assim, assim mesmo. O bom vinho não foi bom cúmplice de momentos que poderiam ter sido. Afora o olho no olho, um discreto aperto de mãos, mais nada. Afloraram mágoas, histórias tristes e coleções de injustiças contra quem experimentou a coragem de ser bom.

 

Quase na mesma pisada, voltamos ao aeroporto e ao voo seguinte. Na despedida, um abraço acanhado, olhares que não se encontraram e uma certeza: não se pode acreditar que os sonhos e as fantasias afloradas nos encontros nas telas luminosas não asseguram a consolidação das intenções. O voo de volta foi curto, mas a noite lá fora, acima das asas que cortavam o céu escuro, parecia não acabar.

 

De volta à tela, vi os cabelos se transformarem numa cascata congelada e agora eram uma moldura vazia para um rosto que aos poucos foi sumindo silenciosamente.

Maria las palabras de amor

por A. Capibaribe Neto

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Antes que se agucem as curiosidades circunstantes com perguntas sobre “de qual Maria?" ; vou logo adiantar: Maria, a minha! Aliás, dando um spoiler, Maria nem existiu de carne e osso. Assim, como não se materializou, e não morreu, não teve velório, funeral, não foi enterrada. Existiu.

Eu criei Maria para não deixar morrer o amor, a paixão, as boas lembranças de abraços e beijos. Maria personificou todas as histórias dos amores que não sobreviveram às diferenças e desgastes pelas mesmices das rotinas. Sem ofensas e sem presunção, um escritor tem os poderes de um deus, pois ele cria, inventa, vai de uma estrela a outra num piscar de olhos; muda montanhas de lugar, inventa paraísos, ressuscita quem bem entender, com o milagre da imaginação. Maria foi concebida, gerada e veio à luz no vazio de um arrependimento que, como sempre, chega atrasado. E aí, a Maria que inventei para me fazer companhia nas saudades doídas, nos hiatos onde uma solidão pesada não foi um farol, uma boia que me resgatou das ondas revoltas dos adeuses.

Quem, dentre vós, não sofreu com uma separação que não queria? Ah, tá, mas pode ter, do outro lado, o que se alegrou com o desfecho que motivou a separação ou o conformado, nas imposições legais ante o inevitável. Cada um de nós tem as suas histórias, seus segredos, conveniências e razões. Assim, Maria veio em meu socorro e me permitiu poder escrever sobre os retalhos de momentos que, infelizmente, não foram suficientes para manter a liga da relação. Somos exigentes com os nossos direitos e razões e nem nos damos conta de que na outra metade de uma convivência também existem expectativas com exigências inegociáveis. Essas separações físicas e emocionais são consensuais ou aquelas litigiosas, que não negociam nem a divisão dos pacotes de biscoitos sem glúten. Mesmo nessas, não se pode renegar a importância dos beijos ardentes, dos abraços sem fim, olhos brilhando no escuro e dos gemidos…! Ah, os gemidos! “Meu amor, minha vida, meu tudo…”

E as promessas de “para sempre, tua!” Pois bem, Maria é a melhor fotografia inspiradora para exprimir a grandeza de todos os momentos de um romântico incorrigível. Já passou-se muito tempo desde o som deselegante e raivoso da uma porta que fechei atras de mim. Essa porta foi a linha imaginária entre achar que tinha razão e uma necessidade inadiável de escolher outro caminho.

No calor das vozes amargas, acres, corrosivas, soltas no ar, as disputas cheias de argumentos, invocando razões inúteis resultou no silêncio que imperou depois. Quando voltei, já era madrugada. Abri educadamente a mesma porta e acendi a luz para uma realidade: a do vazio. Ainda havia no ar um rastro de Amarige que ela vestia quando me recebia de braços abertos toda noite. Tudo estava no lugar, menos nossas fotografias em molduras carinhosas e uma foto grande dela que ficava na entrada. Um engasgo no peito foi uma estocada forte quando entrei no quarto o silêncio estava mais forte, preenchendo a ausência pesada. Quando vi os armarios dela vazios, sentei na beirada da cama e os olhos arderam. Sobre um travesseiro, um envelope cor de rosa igual aos que ela usava para os bilhetinhos apaixonados que me escrevia. Havia uma folha resumindo a sua saída: ESPEREI POR UM ABRAÇO PARA SOBREVIVER…”


A partir daquele dia, foi Maria que se fez presente com a sua inarredável companhia, para não deixar sumirem “las palabras de amor”.